Tenho de confessar que este texto foi difícil de escrever. Por várias razões.
Poucos jogos me marcaram tanto como o Deus Ex.
Se quiserem uma comparação ao nível de impacto ou de interesse com outras obras de arte diria que o Deus Ex está a par do filme ‘O Padrinho’, da série de televisão ‘The Wire’ ou do disco ‘The Downward Spiral’.
Enfim, acho que dá para perceberem que, para mim, foi um fim-do-mundo em cuecas.

Por volta do ano 2000 a única coisa que se jogava a sério no meu PC era um tal de Half-Life (HL).
Tinha completado a missão de singleplayer e estava completamente embrenhado no seu modo de multiplayer. Os convites de amigos para jogarmos um Deathmatch em LAN ou mesmo na Internet choviam na caixa de email e no Messenger.
O vício era tal que me lembro de existirem vários servidores portugueses cheios. O dia todo!
Havia sempre quem comentasse que não tinha conseguido se ligar a um servidor pois assim que alguém abandonava uma sessão havia logo quem lhe tomava o lugar.
Os jogos em rede baseados em HL (Counter-Strike (CS), Deathmatch (DM) e Team Fortress(TF) eram um sucesso estrondoso pelo mundo inteiro e muitos de nós acreditavam que o ‘single player’ tinha falecido para sempre.

 

Why U not pretty like Half-Life?

 

É nesta altura que um amigo me chamou a atenção para um novo título com nome enigmático e pretensões a ser o seguidor de System Shock (1 e 2) e Thief: The Dark Project.
Os primeiros eram duas obras-primas subvalorizadas que definiram muito daquilo que considero verdadeiramente importante nos videojogos – a narrativa. O segundo foi um dos percursores de uma forma inovadora de confronto em jogos de acção que se baseava mais em actos furtivos, isolados e previamente planeados do que a tradicional ‘rambada’ (O ataque frontal, semi-suicida que caracterizava os maiores sucessos do género até então, Doom, Quake, Duke Nukem, etc..)

O projecto de Deus Ex era ambicioso – Juntar um first-person-shooter a um role-playing-game tradicional, com todo o seu sistema de classes e recompensas habituais, mas desta vez num universo Cyber Punk. Uma descolagem do formato Swords & Sorcery que na altura parecia dificilmente apelativa para os amantes dos já referidos rpg’s.
À partida estava bastante incrédulo quanto à possibilidade de êxito desta premissa. Os jogadores são criaturas de hábitos e convicções e uma vez que adoptam um é difícil largarem-no. Para mim era impensável que um jogo essencialmente centrado na experiência solitária pudesse ser tão cativante quanto as minhas sessões de 8 horas, consecutivas, em DM ou TF. Tal era o cromo…

Mas as dúvidas rapidamente foram suplantadas pela total imersão neste universo.
Não era um jogo bonito. Nem para os padrões da altura. Mas era um jogo incrivelmente bem pensado e com a dose certa de ingredientes essenciais para a criação de um clássico: Universo complexo e cativante, personagens ambíguas, tomada de decisões que afectava verdadeiramente o decorrer do arco narrativo e os vários finais possíveis, uma banda sonora fantástica e muito, muito estilo.

Mas porquê escrever tudo isto? Porquê agora, perguntam-me?

 

E não é que é mesmo verdade?

 

Porque estou à beira de iniciar mais um encontro com aquela que será a terceira encarnação deste jogo.
Deus Ex: Human Revolution.
Sim, eu sei que já saiu há algum tempo (Agosto deste ano, se não estou em erro) mas devido a alguns contratempos só agora arranjei disponibilidade para me dedicar a ele.

Também sei que Invisible Wars foi, para todos, uma decepção.
E estas coisas não se escrevem de ânimo leve…

Mas a antecipação é enorme porque, de facto, foi esta a série que restaurou o respeito que eu tinha pela experiência em single player.
Ainda hoje, basta que alguém o mencione para ter vontade imediata de o instalar outra vez.
Imaginem o misto de satisfação e dúvida que tive quando vi as primeiros notícias de que Human Revolution iria tentar manter-se mais fiel ao espírito da primeira aventura (e ainda por cima em formato de prequela) mas, por outro lado, que pelo caminho ficava a colaboração do seu mentor original, Warren Spector.

É ainda neste estado que me despeço.
Posso voltar em breve. Mas também posso lá ficar durante uns tempos, a matar saudades.

E se isso não é aquilo que todos nós mais ansiamos sempre que começamos a explorar um jogo novo… então não sei o que é.