Um Chicken Nugget sobre Merchants of Kaidan
Quando pensamos no mote para uma história, a vingança é daquelas explicações seguras, utilizada à exaustão, e que há falta de melhor funciona como porta de entrada para qualquer narrativa. Desde a Bride do Tarantino e a sua senda sanguinária para matar o Bill (que na vida real esqueceu-se da palavra-de-segurança e por isso foi ensinar Kung Fu a S. Pedro) até a Frank Castle da Marvel Comics, que na sua demanda cega contra o crime deve ter morto mais gente do que uma dúzia de capos da máfia juntos. Portanto regra número um do storytelling: quando tivermos um bloqueio de escrita e não soubermos o que colocar como origem/motivação do nosso personagem, basta-nos pensar na boa em velha vendeta. “Olho por olho” já dizia o outro…
Em Merchants of Kaidan somos um jovem de 21 anos que viu o seu pai, um dos mercadores mais prósperos da região, a ser assassinado e toda propriedade da família a ser confiscada pela aristocracia local. Vítima de uma trama que tinha como objectivo enfraquecer a sua família (ao ponto de causar a morte ao seu pai), vemo-nos obrigados a perseguir o caminho da vingança da melhor forma que sabemos. Assassinato? Tortura? Pancadaria ao mais alto nível? Não. A vender e a comprar bens entre diversas regiões do mapa.
Merchants of Kaidan é um bom jogo em torno do mercantilismo com alguns elementos de RPG que exala jogo de tabuleiro por todos os pixels. É que quase que diria que na génese deste jogo está um game document para algo que poderia seguir qualquer dos caminhos: ou desenvolver-se na forma de um videojogo ou de um boardgame.
Como jogo de negociação apresenta mecânicas comuns: o nosso objectivo é tentar maximizar o nosso lucro ao levar bens em falta a regiões e cobrando de forma inflacionada na sua venda, e comprar outros bens em zona com “excesso” de produção ao preço da chuva, na expectativa de conseguir exponenciar a margem de lucro. As peculiaridades mais curiosas e que fazem deste Merchants of Kaidan um grande jogo do género é a possibilidade de irmos para as tabernas de cada cidade pagar rodadas a estranhos na esperança de ouvir rumores sobre tesouros perdidos, ou de oportunidades de negócio. E ao descobrirmos a informação de algum tesouro, fazemos uso dos mercenários (que também contratamos nas ditas tabernas) para fazer dungeon crawling off screen das masmorras “apontadas” como recheadas de ouro.
É claro que a questão do off screen relembra muito alguns aspectos mais aleatórios dos jogos de tabuleiro, e assemelham-se a tirar uma carta de evento que define o nosso sucesso ou insucesso. É que podemos ter um azar na simples acção de atravessar uma ponte, em que as nossas carroças podem danificar-se ou um dos nossos cavalos morrerem, ou simplesmente sermos atacados por salteadores. E quase todos estes aspectos são transcendentes ao jogador, limitando-se a sua acção a conviver (ou superar) as vicissitudes que o jogo (vulgo tabuleiro) lhes apresenta.
Merchants of Kaidan é um óptimo jogo de negociação, com uma mística de fantasia medieval e que de certeza seria um belíssimo jogo de tabuleiro. Para além de possuir diversas ramificações da história principal, o valor de rejogabilidade que o jogo nos traz com as suas dezenas de side quests, valoriza na perfeição os 14,99€ que custa no Steam. Apesar de já possuirmos o jogo há alguns meses (ainda na sua fase Early Access) decidimos esperar pelo seu lançamento para melhor o avaliar. Se neste momento este MoK é um grande jogo do género deixa-nos em mãos uma imensa vontade de tê-lo também, em formato competitivo, em jogo de tabuleiro. É pedir muito?
Merchants of Kaidan é um exclusivo PC.