Como bom jornalista de opinião que sou, tentei ser o mais objectivo possível e confrontar a minha opinião de Dead In Bermuda com a de outra pessoa. Pedi a um amigo meu que jogasse ao meu lado, de modo a eu poder observá-lo. Esse amigo aceitou.

Fui a casa desse amigo. Instalei o jogo no computador dele, e pu-lo a correr. Poucos minutos depois, propus-lhe que tomasse LSD. Esse amigo aceitou.

Este jogo é incrível! Já viste as cores? Olha bem para as cores”.

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Comparei Dead In Bermuda com Gods Will Be Watching na minha antevisão, mas a verdade é que neste momento me faz lembrar muito mais This War Of Mine, pelos motivos errados. Os dois jogos aleatorizam certos elementos para serem menos repetitivos; os dois jogos centram-se em gerir recursos humanos, e têm uma forte componente de crafting; ambos me parecem uma versão twisted de The Sims; uma “casa” para mobilar, sim, mas um ambiente opressivo em que a morte está sempre presente, no qual se pode morrer à fome, e em que o maior inimigo é a depressão.

No entanto, um dos dois jogos resulta, para mim, e o outro não.

Adoro este jogo”.

Em Dead In Bermuda, ao contrário em de This War Of Mine, sinto que estou sempre a ver o mesmo, e que estou sempre a fazer o mesmo; que nada do que faço importa, apesar de ser importante; e em This War Of Mine, embora o jogo me queira derrotar, embora me queria passar a impressão que nada importa e que devo desistir, não consigo, e luto até ao fim; pelo contrário, sinto-me estimulado, como se cada esforço contasse para uma vitória final, mesmo o mais insignificante dos esforços é significante.

Uma personagem está a explorar a floresta e é mordida por um morcego esqueleto. “O que é que se está a passar? Viste aquilo?”.

Os passageiros de um avião que crashou numa ilha passam várias semanas a tentar sobreviver, e arranjar forma de escapar à mesma; pelo caminho vão encontrando itens, e personagens estranhas, que estão ligadas a uma profecia.

Viste aquilo?”.

Durante algum tempo pensei que o jogo fosse adoptar a perspectiva de um ou vários passageiros enlouquecidos; pensei que o objectivo fosse obrigar-nos a questionar a realidade, ou simplesmente a sanidade das personagens por quem torcemos. Acabei por perceber que estava enganado. Trata-se inteiramente de outra coisa, muito menos interessante.

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O mapa de jogo é aleatorizado, algumas conversas também, mas o enredo principal é sempre o mesmo, e só faz sentido numa determinada ordem. Fará mais sentido re-jogar Dead In Bermuda pelo simulador-de-pessoas do que pela narrativa à volta destas. Por outro lado, passa-se muito pouco tempo em espaço não-aleatorizado; três quartos do jogo ou mais são passados no acampamento, que muda muito pouco entre campanhas, e do início ao fim da campanha; a experiência é sempre a mesma, aquilo que difere é a velocidade com que o jogador constrói estruturas. Não há variação quase nenhuma; por exemplo, é impossível ganhar o jogo sem construir uma tenda; não há várias opções de tenda, só há aquela; aquela tenda vai ter que ser construída eventualmente, e isso é verdade para tudo o que é construído. A única coisa que varia é o ritmo de construção, dizia eu, mas mesmo esse só pode ser de um: as estruturas são desbloqueadas numa determinada ordem, é suposto serem construídas nessa ordem, se forem construídas demasiado cedo, o jogador perderá, se forem construídas demasiado tarde, o jogador também perderá; só dá para ganhar de uma forma. Se tudo isto vos parece irritante, chato, e pouco interessante, é porque estão corretos, que é mesmo. Chegar ao fim da campanha, mesmo que tudo corra bem à primeira, que não vai correr, é mentalmente cansativo pela repetição que envolve.

“Estás a gostar?”. “Acho que vou morrer [no jogo; ou não]. Mas estou a adorar”. Tomo notas.

Explorar a ilha. Conversar. Meter fogo na fogueira. Pescar. Explorar a ilha. Ler. Meter fogo na fogueira. Apanhar fruta. Uma área está explorada; ir lá apanhar um item; regressar. Explorar a ilha. Conversar. Meter fogo na fogueira. Pescar.

Estou a adorar imenso”. O meu amigo está pálido.

Regressando à comparação com Gods Will Be Watching, uma das coisas que funciona bem naquele caso que não funciona neste, é o facto do jogo estar dividido em vários cenários opressivos, mas muito distintos uns dos outros; neste caso, em Dead In Bermuda, o jogo todo é o mesmo cenário; e isso sente-se da pior forma.

Há mais que pode ser dito, no sentido de descrever o jogo, mas acho que não vale a pena. Em vez disso, vou voltar a focar-me no caso do meu amigo.

Sabes?”; ele ainda está a meio da trip; passou mais três horas a jogar.

“Diz”.

Quase três horas depois, teve uma epifania. “Este jogo é uma m****”.

“Como assim?”.

Eu estava todo lançado, todo pumped. Gosto do mood, ’tás a ver? Gosto do traço do desenho, das cores; e da música, que é super-relaxante. Mas o jogo, no fundo, é só números a subir e a descer. Não está a acontecer nada. Nunca”.

“Ok”.

É uma m****”.

E, tentando ser o mais objetivo possível, este é o veredicto que o jogo merece, (o LSD não engana): é tão mau, que é mau mesmo sob o efeito de estupefacientes.