A Revolução Industrial é sem sombra de dúvida um dos grandes passos dados pela Humanidade e o grande causador da evolução da sociedade moderna. Com todos os benefícios e malefícios que essa evolução teve, a Industrialização conduziu a um avanço galopante da tecnologia e do conhecimento. Mas o preço da evolução é bem conhecido.

Se a poluição e a destruição notória que fazemos do planeta foi maior neste últimos cem anos do que em toda a História, também houve (e haverá) um preço a pagar pela industrialização. A globalização, a massificação, o capitalismo, a evolução da mentalidade ocidental são filhos da industrialização, mas a desumanização, o desprendimento e a dessensibilização são alguns os seus enteados, e são apenas o revés do preço da eficácia e da sociedade de consumo do qual todos fazemos parte.

Factorio (4)

Dos diversos modelos económicos desenvolvidos aquando da industrialização, há dois subsequentes um ao outro que definiram de vez a eficácia da indústria e o papel dos operários na engrenagem de produção. O primeiro de todos foi o denominado Taylorismo, desenvolvido pelo engenheiro mecânico Frederick Taylor, que defendia que o operário não necessitava de conhecer todo o processo de produção, mas devia conhecer apenas a parte que lhe compete, necessitando este de se especializar nas suas tarefas. O segundo modelo foi um desenvolvimento do primeiro, e adveio de Henry Ford, cujo Fordismo foi uma espécie de implementação mais prática das ideias de Taylor. Para aumentar a eficácia dos preceitos tayloristas, Ford criou uma esteira rolante onde os diversos operários executavam as suas tarefas, passando ao próximo operário em sequência para que o passo seguinte fosse executado. A eficácia da indústria e das linhas de montagem tiveram resultados comprovados, mas com um terrível impacto na vida dos seus trabalhadores. Como alegoricamente representado no filme Modern Times, de 1936, de Charlie Chaplin.

A indústria e a tecnologia evoluíram muito desde os primeiros passos da Revolução Industrial. Hoje o automatismo impera, e uma fábrica consegue produzir milhares de vezes mais do que há seis décadas com cem vezes mais trabalhadores. O que é aterrador e surpreendente ao mesmo tempo. Mas as ferramentas e sistemas de automatização acabam por ter um certo fascínio intelectual se nos debruçarmos sobre elas. E é sob esse conceito que o curioso e surpreendente Factorio foi lançado.

Factorio (1)

Factorio, em Early Access no Steam mostra-nos os rigores da gestão industrial num espaço bidimensional virtualmente infinito. Começamos com pequenos sistemas de automatização para extrair matérias-primas. Corremos de um lado para o outro para alimentar a indústria transformadora com os recursos recolhidos pela indústria mineira. E enquanto perdemos tempo com esses passos percebemos que é possível optimizá-los e todas as acções por nós desenvolvidas serem resolvidas através de automatização, de braços hidráulicos e tapetes rolantes.

Ainda que alguns elementos adicionados (tais como termos de combater alguns inimigos que surgem em cena) sejam um sabor adicional ao tom do jogo, é o crescente e progressivo sistema complexo de automatização que funciona de forma quase hipnótica. O sistema automatizado que tínhamos entre a indústria mineira e a transformadora necessita então de um passo adicional, a de produção tecnológica desses recursos. E de súbito damos por nós a estender esta nossa exploração fabril para além do ecrã inicial. E a vermos a complexa rede que compõe o nosso sistema de automatização industrial a crescer num ciclo vicioso de crescimento, consumo e desenvolvimento.

Factorio (2)

Factorio vive de uma complexidade tremenda e um sentido de apuração que me faz estranhar o porquê de ainda se encontrar em Early Access. A possível monotonia que os ideais de automatização e eficácia fordistas defendiam são aqui perfeitamente aplicados mas com um volte-face: há um efeito de quase mesmerização enquanto jogamos Factorio, e as horas passam sem nos apercebermos, enquanto os corredores intermináveis de linhas de montagem crescem como se possuíssem vida própria.

Factorio é uma alegoria à sociedade moderna e a forma como a automatização tem substituído lentamente o nosso valor individual e a nossa identidade. Mas consegue sê-lo ao ser também um excelente jogo de gestão e possivelmente um dos mais criativos jogos de gestão e construção industriais que já joguei.