Lê-se çah-dah-meh

SADAME-san sai dos seus aposentos com um ar solene e resignado, envergando um kimono branco, puro como a neve que cai lá fora. É para lá que se dirige, acompanhado por dois guardas de ar cisudo e taciturno – ou pelo menos é o que os seus olhos frios parecem revelar através dos seus kabutos. Antes de chegar à saída, ele é parado e atirado uma dúzia de metros diante de uma figura sombria sentada nas sombras, em posição de seiza, que acaricia um gato igualmente sombrio, sombriamente satisfeito pelo festim de festinhas, também ele sombrio. A sua boca abre-se, e de lá sai uma voz pesada, firme, e quase cavernosa.

SADAME-san, devo dizer que estou desapontado consigo. Trago-o para minha casa quando o encontrei esfomeado e ao frio na eShop da aldeia. Alimento-o, visto-o, coloco-lhe um telhado por cima da cabeça e quatro paredes à sua volta. Você mostra promessa e eu, provavelmente de forma precipitada admito, integro-o a si e ao seu grupo no seio do meu clã Chikin. Como um de nós. Durante as primeiras horas gostei do seu gameplay, mas afinal não passava nada de uma ilusão.”

SADAME 1

A sua cabeça gesticula na direcção de um homem de barba bastante magro que estava ao pé de si, as suas hakamas quase a caírem-lhe pela cintura, e este retira um pergaminho de dentro do seu enorme happi (grande demais para a sua magreza) e desenrola-o lateralmente, deixando o seu rolo esquerdo desenrolar até ao chão, onde se continua a desenrolar até se perder nas sombras da divisão escura. Ele começa a ler:

Ishi-Sengoku-Den SADAME-san, o seu pequeno grupo de mercenários foi-nos útil no começo, mas durante pouco tempo. A sua utilização de ki para fazer ataques especiais e karma para fazer feitiços era interessante, mas os inimigos que enfrentavam não foram muito impressionantes. Quando enfrentaram o primeiro demónio, a ninja e a rogue derrotaram-no simplesmente ficando no mesmo sítio a atirar shurikens e flechas. “Com inimigos destes, assim também a avó do meu daimyo conseguia!” – diziam alguns membros do nosso clã. Mas queria-me referir a eles todos:

  • O samurai que o acompanhava era um líder eficiente, mas só sabia fazer uma combo de forma eficaz. Todas as outras não tinham o mesmo efeito, o que essencialmente não nos dava razão alguma para usar nenhuma outra. A utilização do seu ki para fins defensivos tornavam-no num tanque humano e era o melhor que tinha em si, mas a ineficácia dos seus ataques especiais não nos davam razão para os utilizar – eram lentos, de casting time longo e davam menos dano que os seus ataques normais.
  • A ninja era a mais rápida e versátil do grupo. Ela despachava monstros a curta, média e longa distância de forma simples. Também era capaz de fazer todos os feitiços e habilidades a um custo de 20 ki, o que a ajudava usar feitiços que normalmente seriam de custo elevado para uns de forma casual. Não percebemos porque é que precisaríamos de outra pessoa.
  • A rogue era a segunda mais rápida, mas mais focada em ataques à distância. Alguns confrontos com ela eram quase batota, mesmo contra demónios e outros líderes do exército inimigo, porque podia ficar onde estava simplesmente a atirar-lhes flechas. Os monstros eram tão lentos que morriam antes de chegar até ela.
  • O monge era demasiado lento e a única coisa que sabia fazer era dar encontrões em toda a gente. Era um homem rude e pouco sofisticado. Os seus ataques eram de curto alcance e pouco dano davam, e mesmo conseguindo imbuir-lhes poderes elementais não o ajudava. Percebo que quisessem ter um homem santo convosco no seio da batalha, mas este nem Buda o ajudava.

SADAME 2

 

O homem que estava em seiza nas sombras levanta o braço, mandando-o parar, e levanta-se lentamente – o gato que estava a afagar salta do seu colo e corre lá para fora, de onde sopra um vento frio – e gesticula com o seu braço na direcção da porta deslizante semi-aberta de onde saiu o felino. A sua boca enrugada abre-se e de lá volta a sair a mesma voz cavernosa de há pouco, ecoando pelos corredores.

SADAME-san, você trouxe desonra à sua família. Os seus apelativos gráficos a fazerem lembrar os tempos áureos e nostálgicos do 16-bit na SNES e Megadrive, bem como o interessante sistema de desenvolvimento de personagens neste Action RPG não o livraram de um gameplay pobre e repetitivo, sempre, sempre, sempre a repetir o mesmo ataque, a mesma combo. No inicio, SADAME-san, você cativou-me. Cheguei mesmo a dizer que gostava de si e até afirmei a outros membros do clã que tinha orgulho de o jogar. Mas depressa descobri que você é, última e simplesmente, um jogo inócuo e aborrecido. Saia da minha frente e não volte a esta casa – a não ser que tenha uma sequela, aí estamos bastante dispostos a experimentá-la.”

Os dois guardas que o acompanhavam pegam em SADAME-san, cada um pelo seu braço, e levam-no lá para fora. Uma corrente de ar frio invade a casa enquanto a porta deslizante se fecha. Segundos depois ouve-se um grito vindo lá de fora: “MEH-N!!!”

KawanakajimaBattle

 

Nota final do autor: Eu queria gostar deste jogo. A sério que queria. Quando o comecei a jogar foi divertido durante as primeiras horas – depois foi sendo cada vez mais difícil passar cada nível. Era visualmente apelativo aos meus gostos de gamer nascido nos anos 80, mas repetitivo. Tinha música decente, mas um AI um pouco retardado. Tinha personagens com habilidades diferentes, mas estes eram desequilibrados – o monge era particularmente frustrante de jogar e não melhorava com o tempo. Os personagens tinham histórias paralelas e interligadas, mas a narrativa era difícil de seguir e pode até ser desinteressante para quem não perceba muito sobre a história feudal do Japão. Se as palavras Kawanakajima, Takeda Shingen ou Uesugi Kenshin não vos dizem nada, então vão andar a apanhar bonés ao longo da história – nada contra a continuação da localização de jogos embebidos em cultura oriental contudo, antes pelo contrário: o risco que a Rising Star correu ao trazer este jogo para terras ocidentais é de se lhes tirar o chapéu e digno de respeito – Espero ver este tipo de enriquecimento cultural continuar a acontecer. O jogo em si tentou avançar ideias interessantes, com um sistema de loot e equipamento diferente, um sistema de leveling inovador (em que progredimos numa grelha pentagonal, focando-nos em diferentes características de combate) e o jogo entre a utilização de ki e de karma, mas pecava na sua fundação e pelo que devia fazer melhor: os controlos e a acção. No fundo, ele não é um jogo bom. Não é um jogo mau. É um jogo meh.