Avisam-se os plebeus que este artigo contém algumas exposições sobre Trails of Cold Steel I. Alguns atrever-se-ão a chamar-lhes de SPOILERS.

93 horas e 53 minutos.

Este foi o tempo que durou a minha primeira e única playthrough de The Legend of Heroes: Trails of Cold Steel, o primeiro jogo desta série, em que explorei o mais que pude. Quando era um jovem estudante conseguia dedicar e terminar um jogo neste tempo em 1 ou 2 semanas, mas agora que sou um adulto trabalhador preciso de 1 ou 2 meses para cumprir semelhante feito. É muito tempo dedicado para termos o nosso jogo terminar num cliffhanger, principalmente quando a história começava a ficar interessante. Passo a explicar.

Trails of Cold Steel conta a história de Rean, um jovem recém-chegado à academia militar mais relaxada de sempre, e como este travou amizade com todos os seus colegas de turma. É um jogo que segue muitas das tropes que populam os trabalhos vindos do “País do Sol Nascente”: passa-se na escola, muitos dos seus personagens são estereótipos e clichés, o personagem principal tem um poder escondido que se revela quando ele se zanga mesmo muito e o permite ultrapassar desafios e derrotar adversários que não conseguiria de outra forma… Seria um jogo bastante “abaunilhado”, não fosse o seu setting interessante, passando-se numa nação governada por um império monárquico que está lentamente a dar cada vez mais poder ao povo, para grande dissabor da nobreza que se sente cada vez mais privada dos seus “direitos”. A academia militar em questão é também um caso raro, dado que é frequentada juntamente por nobres e plebeus, em que as turmas estão separadas por estrato social, mas que ainda assim permite as duas classes conviverem fora da sala de aula, nos seus clubes, competições e actividades extra-curriculares. A turma de Rean é a primeira em mais de 200 anos de história da academia que engloba jovens nobres e plebeus, mais um sinal da mudança dos tempos. A insatisfação da nobreza face à ascenção da relevância da plebe na escala social levam a uma guerra civil – os nobres revoltam-se contra a família real para recuperar o poder que estão a perder e reforçar a importância da linhagem. E no fim, subitamente, há mechas (mais uma trope).

Qual é a diferença entre Mechas e MMOs? MMOs não metem pausa.

Assim termina Trails of Cold Steel I: A guerra acabou de começar e a academia é invadida por exércitos da nobreza. Rean é levado a escapar à força por Valimar, um mecha lendário que ainda não consegue bem controlar, deixando os seus amigos e colegas de turma para trás para defender a academia. Acabou o tempo de paz e a despreocupação de quem parece ter todo o tempo do mundo para aprender e dedicar às coisas mundanas da vida. Assim começa Trails of Cold Steel IIum ano depois na vida real.

Foram quase 100 horas, meus amigos, dedicadas ao primeiro jogo! Para ele, assim de repente, me deixar a mim e a todos que o jogaram, pendurado! Eu considero-me uma pessoa já calejada relativamente a cliffhangers – afinal eu sobrevivi ao grande desastre de 2001 e que ainda hoje persiste (SIM ESTOU A FALAR DO SHENMUE II – QUE RAIO ERA AQUELA ESPADA A FLUTUAR NAQUELA GRUTA NO FIM?! – JOGUEI O RAIO DO JOGO AINDA NEM ESTAVA NA FACULDADE!! – QTEs PARA SALTAR POR CIMA DE RAÍZES DE ÁRVORES!?! – JÁ SOU UM ADULTO MAS AQUELA COISA AINDA ME ASSOMBRA!!! – GIVE ME BACK MY CHILDHOOD!!! – AAAAAARRRRGHHH!!!!)

“Don’t bother to buckle up – you may not want to survive this.”

*Ahem*

Para falar dos mechas acima, devo explicar que este mundo é uma fusão entre a fantasia medieval e um pseudo-steampunk, com uma grande confusão de tecnologias: existem comboios e artes mágicas equipáveis, carros são apenas acessíveis aos mais abastados e existem aviões muito pouco aerodinâmicos (mais parecem navios que flutuam no ar). Estes existem graças ao que chamam de tecnologia orbal – aliás toda a tecnologia e magia deste mundo gira à volta de orbes, artefactos de origem desconhecida, résteos de uma civilização de quem já ninguém se lembra e poucos se parecem preocupar em investigar mas que parecem haver aos molhos. Há ruínas por todo o lado, por amor de Aidios! (sim, este é o nome d’A única divindade religiosa neste mundo) Como são as orbes (que até serem explicadas não são mais que um MacGuffin) as grandes responsáveis pela existência inexplicável de magia, electricidade, motorização, comunicação por ondas rádio, mechas e água quente neste mundo, gostaria de baptizar este género de “orbalpunk”.

Isto foi a primeira coisa que apareceu quando pesquisei por “Orbal Punk” no Google. Parece-me adequado.

Em Trails of Cold Steel II pouca coisa mudou. O combate mantém-se por turnos, numa arena fechada onde o posicionamento tem um papel relevante e a preparação é fulcral nas boss fights. Os ataques normais e as crafts falham mais agora, tornando os itens que aumentam a accuracy mais preciosos. Por contraste o dodge também aumentou (com a configuração correcta é possível certos personagens chegarem a endgame com 100% a dodge, evitando todos os ataques físicos, mas não os mágicos) – esta mudança traz também consigo o aumento da importância da magia das orbal arts no combate, pouco usadas no primeiro jogo devido ao seu casting time, mas que não falham o seu alvo. É também introduzido o combate por turnos com mechas, onde os números envolvidos quase decaplicam e a táctica de combate muda, onde se tem de encontrar o ponto fraco do adversário de forma a poder duplicar o nosso dano e podemos ter estar sincronizados com um membro da party, que age à parte como um co-piloto e pode usar arts para curar, dar dano, buffs e debuffs. Numa fase mais avançada no jogo é possível vir a equipar orbes, bem como chamar e usar Valimar num combate normal durante um tempo limitado para um enorme aumento ao dano, muito útil e quase essencial em algumas boss fights.

De vez em quando gosto de por imagens que nada têm a ver com os artigos que escrevo. Mas só de vez em quando.

Os links e bonding events também voltaram. Existe um sistema que liga os diferentes personagens e o nível de proximidade entre si – combater lado a lado e participar em bonding events com eles permite aumentar essa proximidade, que tal como no jogo anterior tem consequências visíveis em combate e na história perto do fim do jogo (aliás, algumas coisas, das quais o final bonding event são transportadas para este jogo do anterior através da nossa save file). Em combate é possível fazerem combinações se desequilibrarem um oponente com um critical hit ou usando uma arma contra a qual eles têm fraqueza, usando o turno do mesmo personagem para dois ou todos os membros da party atacarem ao mesmo tempo (relembrando os últimos jogos da série Persona). Foi também adicionado o modo Overdrive, que pode ser activado num dos turnos para que dois personagens joguem imediatamente os 3 turnos seguintes independentemente da ordem, recuperando 30% de todas as suas barras (HP, EP e CP) e transformando todos os seus ataques em criticals durante esses turnos – também essencial para as boss fights mais exigentes.

Esquece a guerra. Vamos mas é para o Winchester jogar Blade e esperar que tudo isto passe.

O jogo de cartas dentro do jogo (parece que hoje em dia todos os RPGs têm de ter um – oh yes, I Gwent there) voltou, mudando o nome de Blade para Blade II. Igual ao primeiro, teve apenas a adição de duas novas cartas que mudam o jogo radicalmente – uma permite o descarte de uma carta aleatória da mão do adversário e a outra nada mais nada menos que duplica o nosso score, sem pedir licença nem nada (ter esta carta na nossa mão quase que nos garante a vitória, em contraste se o adversário a tem e nós não…) – Blade tornou-se mesmo mais aleatório e, para mim, menos divertido devido a isto. O mini-jogo de pesca também voltou, voltando a haver um reset de tudo o que tínhamos feito no primeiro (posso dizer que ao som dos Da Vinci que “já fui mestre pescador”) e tendo de voltar a fazer tudo de novo. Foi adicionado um mini-jogo de snowboarding que não tem nada de especial.

No geral o jogo é um pouco mais do mesmo – só que com mais mechas. Se jogaram o primeiro e gostaram da história e do combate, então posso dizer que vale a pena continuarem e não serão decepcionados. Para quem não gostou do primeiro não vai ser este que vos vai apaixonar pela série – aliás, se não jogaram o primeiro jogo de todo, não vale a pena pegarem neste, dado que ele só faz sentido se tiverem jogado o primeiro. Preparem-se simplesmente para muitas dezenas de horas de jogo e para a possibilidade de mais um cliffhanger no final… o qual não vou confirmar nem vou desmentir (mas já viram que vem aí o Trails of Cold Steel III para o final de 2017 no Japão, certo? CERTO?) Tenho dito.

The Legend of Heroes: Trails of Cold Steel II está disponível para PS3 e PS Vita. Foi jogada a versão PS Vita.