Nota: por ter estado de férias na segunda-feira mentalmente assumi que a semana começou apenas na terça-feira, o que significa que agendei este Rapaz-Ventoinha para o dia errado, saindo assim na sexta ao invés de quinta.

Faz amanhã precisamente um ano que falámos sobre Yo-Kai Watch, o primeiro jogo da série e que nos arrebatou durante longas dezenas de horas.

Para um fã de Pokémon as comparações são inequívocas e impossíveis de não serem feitas numa aproximação apriorística. Diria até que em muitos aspectos esse foi um elemento não-assumido pela própria Level-5 e até pela Nintendo, que sabia que as vendas de uma série não canibalizariam a outra, e que só tinha a lucrar com ambas.

Lançado há quase 3 anos no Japão e a ver agora a luz do dia na Europa, Yo-Kai Watch 2 tem andado a correr a minha New 3DS XL com o mesmo fulgor que o seu antecessor. Minto, com fulgor ligeiramente diminuído, mas mais à frente explicá-lo-ei.

Das considerações que eu e o Bernardo fizemos sobre a série, a quase totalidade mantém-se nesta sequela. A qualidade de animação e character design contínua exímia, mas menos não seria de esperar da Level-5. O enredo continua divertido, com uma abordagem monster of the week em que cada quest nos põe a braços com um Yo-kai que anda a interferir na vida dos pobres cidadãos da nossa cidade. Ainda temos de palmilhar quilómetros virtuais entre o jogo, e continuamos com a sensação de que uma grande percentagem do tempo passado em Yo-Kai Watch 2 é a correr ou a transitar entre o espaço A e o espaço B. O combate continua divertido, naquela sensação pessoana de se entranhar depois de estranhar, mostrando um apelo maior do que a aparente simplicidade mecânica.

A minha diatribe que se vai seguir e que entre em linha de concordância com o título em nada implica a avaliação objectiva e subjectiva de Yo-kai Watch 2, que é indubitavelmente um tremendo jogo/série. É uma das minhas franquias favoritas dos últimos anos, e aquela que tenho a certeza que vou acompanhar com maior atenção no futuro.

Mas o meu problema com Yo-Kai Watch, e este 2 não é excepção à regra, é que este jogo é um repleto teasing para compulsivos coleccionadores como é o meu caso. A promessa de coleccionar centenas de criaturas distintas, tal como Pokémon, é uma agitada medalha dourada aos olhos de jogadores como eu. Mas a menos que alguém queira perder um ano inteiro da sua vida a tentá-lo, é prático de afirmar: a razoabilidade de completar a colecção de Yo-Kai Watch 2 é muito baixa.

Pokémon, com os seus 802 Pokémon disponíveis (quase todos) para serem “apanhados” é um bom exemplo do esforço versus recompensa, e sabemos exactamente o que fazer e o investimento de tempo que necessitamos para o conseguir. Existe alguma aleatoriedade e algum grind, mas existe também uma certeza de conseguir terminar o Pokédex, ainda que isso requeira muito trabalho.

Yo-Kai Watch está constantemente a flirtar connosco, a piscar-nos o olho de forma marota para nos deixar embeiçados, levantando-nos a libido na crença de conseguirmos coleccionar todas as suas criaturas. Mas depois de mais de 60 horas investidas no jogo original e muitas tantas em Yo-Kai Watch 2, apraz-me dizer: este jogo é só tease, e pouco prazer. O grau de aleatoriedade que existe em “apanhar” cada Yo-Kai roça a crueldade. Sabemos que existem alguns Yo-Kai que aumentam as chances de conseguirmos travar amizade com adversários, e que se lhes dermos a sua comida favorita essa probabilidade sobe ainda mais. Mas o resultado é tão incerto que as longas horas a andar às voltas a tentar encontrar um Yo-Kai específico podem facilmente transformar-se num duche frio ao sentirmos a chapada violenta da aleatoriedade a lembrar-nos que a possibilidade de “apanharmos” um Yo-Kai pós-combate depende essencialmente de uma série de rezas e mezinhas de Pai-de-Santo.

Quando soube da existência de duas versões distintas de Yo-Kai Watch 2, à la Red e Blue, de seus nomes Bony Spirits e Fleshy Souls, assumi que a dificuldade e aleatoriedade extremas em capturar criaturas fosse lentamente diminuída em detrimento da exigência de possuir as duas versões. Mas não. Saber se um Yo-Kai se quer juntar a nós após o derrotarmos continua a ser uma total surpresa. O que em muitas situações poderia ser algo interessante mas neste caso torna-se apenas um perfeito turn off a um coleccionista como eu.

Este Yo-Kai Watch 2 continua tudo o que de bom o primeiro conseguiu trazer, fazendo até algo que uma das minhas séries favoritas, e com o qual está constantemente a ser comparada raramente conseguiu fazer: manter o ritmo e a qualidade narrativas a par do patamar mecânico e visual que apresentam. Mas acredito piamente que o que falta, pelo menos a mim, para que Yo-Kai Watch 2 iguale o impacto que os recentes Pokémon Sun e Moon tiveram é tornarem o coleccionismo mais justo, mais recompensador pelo esforço e o tempo perdido, e com uma diminuição abrupta da randomização da captura dos Yo-Kai. Até lá vai ser uma excelente série exclusiva da Nintendo, e Yo-Kai Watch 2 um dos melhores jogos da 3DS. Mas que tem todos os ingredientes para poder ser um jogo ainda melhor, isso tem. Não fosse produzido pela Level-5.