Caçada Semanal #107

Já alguma vez pararam para ler as verdadeiras maravilhas que são os manuais de instruções em português comprados nas chamadas “lojas dos chineses”? Já perceberam a verdadeira poesia que existe nestas palavras traduzidas com recurso ao Google Translate? Isto é Arte meus amigos.

“Disparos de gémeos do pau” é a nomenclatura que este tipo de traduções poderiam dar a twin-stick shooters, mas é mesmo sobre eles que vamos falar esta semana.

São 3 exemplos de abordagens distintas ao género que demonstram – uns exemplos mais que outros – que é possível experimentar coisas diferentes sem ter de reinventar a roda, ou neste caso, os analógicos.

Vostok Inc

Vostok Inc é um buraco negro. E como qualquer buraco negro, e citando o Arjen Lucassen pela voz do Bruce Dickinson, “nothing escapes not even light”. O que quer dizer que quanto menos damos por isso, lá foram horas à vida sem percebermos bem como, apenas com a consciência que o tempo acelera quanto mais próximos estamos de um buraco negro.

O estúdio Nosebleed Interactive decidiu pegar no equivalente de videojogos de um buraco negro, que são os clicker games e adicionar-lhe algo aparentemente impossível de colar: um twin stick shooter.

O conceito é simples: andamos com uma pequena nave a destruir outras naves inimigas e asteróides para apanhar algo que se assemelha a pipocas douradas, que são a moeda de jogo, e que reinvestimos em edifícios aplicados em diversos planetas que vão progressivamente gerando mais pipocas, no mais óbvio idle game que podíamos sentir.

Visto que Vostok Inc representa o nossos sistema solar (e não só) de forma bidimensional, e aí temos de seguir a trajectória heliocêntrica dos planetas para aterrarmos, recolhermos o dinheiro que o planeta gerou e construímos novos edifícios para gerar dinheiro passivo.

É simples de explicar e jogar, e as sequências de twin-stick shooter são divertidas o suficiente para nos deixar agarrados mais tempo do que devíamos. Um twin-stick shooter com idle game. O que é que falta inventar?

https://www.youtube.com/watch?v=ghXeDxSszYQ

Tragedy of Prince Rupert

Sem conhecer grande coisa da história do Príncipe Rupert do Reno, foi quase pavloviano ler o nome deste jogo e pensar na música dos meus adorados And Also the Trees.

https://www.youtube.com/watch?v=axKqeCzlCYo

E é a tralteá-la que escrevo a restante descrição de Tragedy of Prince Rupert, um pequeno shooter acabado de lançar no Steam.

Sem nada mecânico que distinga este pequeno arena shooter bidimensional de qualquer outro, é a decisão artística do estúdio Spytihněv de aproximar visualmente esta aventura do Príncipe Rupert e do balão real Montgolfiére de um tipo de ilustração especifica que nos coloca o jogo na memória. Historicamente Montgolfiére é um engenho cujo fundamento de desenvolvimento partiu de algumas ideias do nosso Bartolomeu de Gosmão, e que junta dois elementos históricos aparentemente não coincidentes, como é a vida do Príncipe e o balão.

O visual faz em muito lembrar as gravuras de Séc. XVIII, e não apenas pela decisão monocromática, mas também pela inclusão de alguns elementos da imagética desse período enquanto assets do próprio jogo.

Extremamente difícil, Tragedy of Prince Rupert tem-me permitido playthroughs de menos de um minuto tal é o nível de quase bullet hell renascentista que aqui ocorre. Ou talvez a tragédia não seja de Rupert, mas da minha inaptidão em jogar a este jogo.

https://www.youtube.com/watch?v=FL940BO48xA

Castle of No Escape 2

O mais simples dos 3 jogos e aquele que não é verdadeiramente um twin stick shooter, mas devia. Apesar de fazer lembrar a abordagem genial de Binding of Isaac, Castle of No Escape 2 bebe mais de Zelda de 8 bits, nos quais temos de nos virar na direcção em que queremos atacar.

Simplicidade poderia ser o nome do meio deste jogo, que foi lançado a preço promocional de 2,5€ e no qual temos de percorrer um cubo (com 6 faces obviamente) em que cada face tem 6×6 salas quadrangulares para percorrer enquanto procuramos as armas que permitam destruir o vilão final.

São 216 salas aleatoriamente geradas num estilo perfeitamente contíguo à linguagem da NES, num jogo difícil ao estilo da época. Castle of No Escape 2 poderia ser um jogo lançado em cartucho para a velhinha consola da Nintendo, e certamente mereceria que isso acontecesse.