Caçada semanal #111

A arte de contar histórias é algo que se perdeu,  seja por quem escreve como por quem lê, para não falar dos clássicos contadores de histórias que relatavam factos e mitos misturados num só e deliciavam os ouvidos de todos à volta de uma lareira…

A arte de escrever sobre algo com perícia, seja esse algo real ou não, cada vez mais caiu em desuso, a tecnologia actual é um meio mais rápido e cómodo para os adultos de hoje, para quem é mais fácil meter os filhos em frente a uma TV ou Tablet em vez de tirar alguns momentos do dia para se sentar e ler um livro com eles. Não culpo nem crítico quem o faz, sei o quanto custa ter que recorrer a alternativas tendo conta as obrigações da sociedade e da vida, mas não posso dizer que me agrade… esta é apenas mais uma arte que tenho pena que vá morrendo.

O primeiro jogo de hoje é focado precisamente nessa arte de contar uma história. Uma criança assustada por uma tempestade encontra conforto na história de encantar de Pankapu, história que nós vivemos em jogo e BD narrada pelo pai.

Um platformer de acção episódico com um estilo altamente colorido a um nível de livros infantis mas sem alienar um jogador mais velho. Posso dizer que é capaz de agradar a jogadores dos 8 aos 98.

Tanto na acção como no aspecto de plataformas e resolução de puzzles é desafiante q.b. com uma curva de aprendizagem suave até ao seu nível de dificuldade máximo, não é um Mega Man mas também não é fácil, faz-me lembrar em muito os antigos jogos de Ducktales, Darkwing Duck e Chip & Dale, é claramente apontado para uma camada mais jovem num revivalismo dos anos 90 mas também para os mais velhos que viveram esses anos e que gostam de partilhar jogos com filhos, primos, sobrinhos e netos.

Pela quantia de €11.99 têm um platformer sólido e interessante com uma história dupla, um ambiente bem construído e um encanto especial que é difícil apontar. Já disponível na sua totalidade tanto em consolas como em PC

De histórias de encantar passamos para história alternativa em Vive le Roi.

Joseph-Ignace Guillotin sugeriu algures na história que para evitar o acto desumano e muitas vezes ineficaz de execução por enforcamento ou decapitação por machado que usassem uma máquina que veio a chamar-se a guilhotina, considerado bárbaro hoje mas tendo em conta a alternativa era bastante humanitário na sua altura de maior sucesso como a revolução francesa.

É precisamente nessa época que se passa este Vive le Roi, onde estamos constantemente a enfrentar novos puzzles para salvar o rei da guilhotina. O visual de contraste inspirado claramente em jogos como Limbo é dos seus melhores aspectos. Infelizmente é um puzzler que tenta ser mais do que é, um jogo que estaria mais confortável numa plataforma móvel que num PC.

A ideia de salvar o Rei de França no meio da revolução e criar um mundo alternativo é interessante e podia ser bem aplicado, mas infelizmente não temos consequência dos nossos actos, ao salvá-lo do primeiro puzzle, temos que o fazer uma segunda vez, e uma terceira, algo que acaba por se tornar frustrante e deixamos o gajo morrer de vez.

Vive la revolucion!

Custa a módica quantia de €3.99 mas há melhores opções por esse valor, infelizmente vejo-me forçado a condená-lo ao mesmo destino que Robespierre, Marie Antoinette e Louis XVI…

O que fazemos na nossa vida repercute nela e depois dela, é o que alguns chamam Karma, é por isso que Karma Incarnation 1 é uma história que fecha perfeitamente o enquadramento destes dois jogos porque tem tanto de um como do outro.

Antes da palavra ser falada e ser depois escrita a única maneira de contar uma história era através de imagens, é precisamente desse modo que jogamos, Karma Incarnation 1. Um jogo aparentemente estranho mas muito intuitivo. Mesmo sem uma única palavra ser ouvida ou lida, percebemos a história, o propósito do personagem e o que temos que fazer, neste puzzle game com uma arte fabulosa.

A maneira eficaz como os pensamentos e até sentimentos são transmitidos ao jogador, como os enigmas são desafiantes e até ver a solução sem usar palavras é feito com mestria. Pode parecer simples, mas as coisas simples são as mais difíceis de fazer porque são onde é mais complicado esconder os erros.

Karma Incarnation 1 não é ausente de erros mas os poucos que vi são inolvidáveis dentro de tanto de bom que tem. Custa €2.99 e por esse valor considero-o das melhores compras no Steam em termos de custo e qualidade.

Tanto Pankapu como Karma Incarnation 1 mostram algo que eu gosto de ver na produção indie, as razões pelas quais eu ainda tenho alguma esperança em alguns contadores de histórias do mundo digital, porque são estes que sabem que não se faz um bom jogo fazendo tudo em grande, um bom jogo é feito de forma inteligente.