Podíamos pegar em qualquer jogo da série Warriors, ou Musou, se preferirem no original, escrever um artigo padrão, deixar um espaço antes da palavra Warriors para inserir o franchise ao qual os jogos da Koei Tecmo e a Omega Force se uniram e tínhamos artigos prontos para todo e qualquer jogo lançado dentro deste ambiente. O que, ainda que não seja muito ético, não difere muito de análises traduzidas de outra língua.

Mas a verdade é que, apesar de em traços gerais os jogos de Warriors terem quase todos uma abordagem e um ambiente similar, e, citando alguém que não sei a identidade, “cada caso é um caso”.

Vejamos a situação do recém-lançado Fire Emblem Warriors. Fire Emblem é uma das séries mais acarinhadas da Nintendo, mais inteligentes na sua elaboração e na sua execução de iteração em iteração, e a construir progressivamente um universo coeso com apelo e que vai conquistando cada vez mais fãs.

Adaptar Fire Emblem ao espírito dos jogos Warriors não parecia, a priori, algo difícil. Os elementos necessários para esta transição/casamento já foram tantas vezes testados que a execução era garantida, mesmo que para isso se reduzisse a experiência ao mínimo denominador comum dos jogos musou.

Da nossa parte, a monotonia intrínseca aos jogos Warriors nunca foi um problema, e foi até um dos elementos de maior ligação à série. Jogar um jogo de Warriors é ceder à diversão videolúdica primordial: desligar o raciocínio e projectar todos os nossos recursos biológicos para os músculos dos dedos, enquanto que botões são esmagados e personagens fazem um grand jeté e alguns arabesques pelo ar, projectando multidões de inimigos para longe à medida que o contador de KO sobe para níveis, e citando Mel Brooks no HotShots 2, “mais sangrentos que o Rambo”.

A outra dificuldade que este estranho casamento (que aliás, já tinha tido para a Nintendo uma espécie de primeiras núpcias com Hyrule Warriors) era a de fazer a transição entre um jogo e uma série com as suas próprias idiossincrasias. Especialmente difícil no caso de Fire Emblem, um RPG táctico altamente cerebral e que na prática tem de sacrificar todo o seu cérebro para caber dentro das necessidades de se “tornar” um musou.

Fire Emblem Warriors soa e joga-se como qualquer outro jogo Warriors mas com ligeiras alterações trazidas pela Team Ninja e pela Omega Force como forma de minorar a diferença conceptual entre Fire Emblem e este spinoff. O hack ‘n slash e o button smashing existem mas com ligeiras alterações mecânicas que lhe conferem uma ligeira camada de “complexidade”: a migração dos sistemas de pedra-papel-tesoura de Fire Emblem, representados pelas armas empunhadas e o bónus ou prejuízo que cada atacante pode ter perante o defensor.

Esta pequena inclusão obriga-nos a ter de alternar e gerir os heróis presentes no terreno, movimentando-os pelo mapa para podermos tirar o maior proveito das suas vantagens. É claro que para isto ajuda o excelente sistema de atribuição de ordens de movimentação e ataque, permitindo, ao contrário de outros Warriors, micro-gerir todo o nosso elenco em acção sem termos de os controlar directamente. Ainda que, obviamente, o possamos fazer se assim quisermos.

O elenco, esse, para além dos dois protagonistas gémeos que são inéditos ao universo, é recheado por quase 30 personagens (sem contar com os adicionados em DLCs) que acompanham a história da longa série da Nintendo e que nos traz muitos personagens fan-favourite como como Marth e Crom.

Desenganemo-nos se esperamos a mesma complexidade narrativa tão própria da série Fire Emblem. Ainda que este Fire Emblem Warriors se esforce em criar uma linha de enredo simples, coesa e respeitosa para com a qualidade do universo original, dificilmente poderíamos esperar a complexidade e a construção e evolução de relacionamentos tão própria nos jogos originais, a surgir num hack ‘n slash como um Warriors.

A transição visual de muitos personagens que nos habituámos a conhecer em ilustrações estáticas ou em pequenas animações em sprite ganham aqui uma fabulosa transição tridimensional que foi fielmente reproduzida a partir do estilo único dos artistas da Intelligent Systems.

No entanto houve um segundo momento de “tradução” entre as mecânicas de Fire Emblem (o tactical RPG) e este hack ‘n slash, com a possibilidade de emparelharmos os nossos personagens, criando elos de ligação crescentes que despoletarão ataques únicos e especiais à medida que avançamos no jogo.

E é claro, a terceira e última “inovação” para um Warriors é a inclusão de um modo clássico que mimetiza o que conhecemos da série original: perder um personagem em batalha significa que ele ficou “inoperacional” e que só conseguirá voltar ao combate se o “ressuscitarmos” com um custo específico, o que nos irá obrigar a gerir muito bem as fragilidades e as barras de HP dos nossos personagens.

Fire Emblem Warriors é interessante, e é potencialmente exponenciado pela portabilidade tanto da Switch (a versão que jogámos a fundo) e a New 3DS. O tipo de jogo musou ajusta-se a tempos de jogo curtos, e facilmente conseguimos um tempo para começar e terminar uma missão e sentir todo o usufruto da adrenalina de um Warriors. Apesar das dificuldades que poderíamos encontrar ao transitar um jogo com o ritmo muito próprio como Fire Emblem para a linguagem de Warriors, a realidade é que esta união trouxe um sabor diferente a um prato que tão bem conhecemos e adoramos. E que não fez perder o seu paladar tão original.