Aprecio zombies. Não entendam isto como um “aprecio zombies na medida em que gosto daquilo em que Walking Dead se tornou, que é assim a modos que uma espécie de corolário sobre a Selecção Natural misturada com a Lei de Murphy num formato que parece próprio para uma apresentação por parte da Teresa Guilherme”. Aprecio zombies. Daqueles que são muitos. Daqueles que se tornam numa massa amorfa como em Day by Day Armageddon, 28 Days Later ou em World War Z (e o livro é tãaaao melhor que o filme). Zombies daqueles que, sem serem uma espécie de mutação à la Resident Evil, são um retrocesso animalesco aos primórdios vorazes da alimentação. COMER! B-b-b-b-brainzzzzz! Ou músculo, vá, que a larica aperta e não distingue músculo mental do outro, mais convencional.

Mas, voltando à (carne de) vaca fria… gosto de zombies. E gosto de jogos difíceis – basta ver o número de horas que passo a jogar a assistir a partidas de Dota 2. They are Billions prometia coisas boas com o seu nome. They are Billions cumpre!

Imaginem uma espécie de Age of Empires. Tentem imaginá-lo sem uma dose cavalar de deliciosa nostalgia. Revejam nas vossas mentes aqueles Town Centers. Aquelas casas. Aquelas Barracks. Os muros e torres de defesa da nossa cidade… fechem os olhos e inspirem… expirem… relaxem ao som dos pássaros e dos OYOYOH dos sacerdotes… estão lá nessa zona? Inspirem… relaxem…. expirem…. Estão a visualizar aquela paz quando jogavam Age of Empires com amigos e era ponto assente que durante uma hora ninguém atacava ninguém? Estão na vossa zona Age of Empires? Age of Empires 2? Ok, então sejam arrancados do vosso momento zen com um balde de água gelada com cubos de gelo a deixar nódoas negras. Gritem. Há zombies por todo lado! HÁ ZOMBIES POR TODO LADO! DEZ, VINTE, CEM, MIL, MILHARES, MILHÕES DE ZOMBIES!!! E não dá para tudo, não dá para construir, expandir, defender e reparar contra tantos, são muitos, muitos, são demais!

A pergunta que todos colocam: Onde está o Wally?

They are Billions é assim. Num mapa aleatório, começamos com um centro da nossa base, 5 unidades de defesa e uma missão: sobreviver umas largas dezenas de dias. E, para isso, há que tratar dos nossos. Casas para se abrigarem, comida para meter no bucho, madeira, pedra e metal para construir e melhorar as nossas instalações e recrutar e equipar mais soldados que nos permitam lentamente, pela calada, ir desbastando as hordas de zombies que rodeiam o nosso pequeno oásis de humanidade. Eles estão sempre lá. Parados, dormentes. Vão-se aproximando, aqui e ali, em pequenos números. Mas por vezes, oh, por vezes vêm verdadeiras hordas deles, agarrando, esgravatando, mordendo, destruindo tudo à sua frente… E só precisa de passar um. Basta um. Não é que ele traga todos os males do mundo consigo, mas quando ele ataca, quando ele quebra as defesas de um edifício, todos os humanos que lá estavam sofrem. Era um. São 6. São 18. São 20 outra vez e estão dentro dos nossos muros e lá se vai a minha cidade com canteiros perfeitos, algures entre o Age of Empires e o Caesar 3, com laivos de Cities Skylines. Os zombies não querem saber de canteiros, de muros, de casas organizadinhas para apanhar o sol pela manhã. Só pensam em carne. Em morte.

They are Billions faz isto. E faz isto muito bem. Eu gosto de jogos difíceis e They are Billions é difícil. Mas They are Billions é sádico também. Não avisa. Não poupa. O jogo propõe-nos arrancar no modo Challenging. 100% de dificuldade. Sobreviver 80 dias, num terreno com muitos zombies. “Se o jogo recomenda, eu alinho!”. Erro. Erro grande. Erro ENORME. Imaginem uma toalha de bidet. They are Billions força-nos a tentar fazer dela um cobertor. Não chegamos sequer ao proverbial “cobrir a cabeça mas destapar os pés”. A manta não cobre sequer o tronco. Há que adaptar constantemente para sobreviver, há que ter reservas que nos permitam enfrentar uma vaga de zombies em debandada, há que explorar para angariar recursos para sobreviver. Há que consolidar a defesa de cada um dos pontos vulneráveis da nossa base e, depois disso, há que arranjar maneira de dizer aos zombies que aquela zona é segura. Porque, o que volta e meia acontece, é que eles, mal informados do facto de que, para nós, uma zona é segura, eles entram por ali adentro e não há forma de os parar. Pois.

Há seguro para isto?

They are Billions é assim. Inclemente. Um maestro do acaso, na sinfonia do “Não, não-não, Não! NÃAAAAAAAAAAAO!” que se sucede tentativa atrás de tentativa, quando, subrepticiamente um zombie perdido como quem deambula pela parte de meias e gravatas de um centro comercial a pensar em gelados, se infiltra por um recôndito da nossa base e cava a nossa derrota enquanto estamos a olhar para o sector Norte onde uma horda de zombies era anunciada como perigo iminente. O zombie é silencioso. A nossa exasperação não. Para piorar as coisas, volta e meia o jogo “esquece-se” de nos avisar que temos edifícios a ser atacados. Sim, o mesmo jogo que insistentemente nos avisa, com aviso sonoro e vocal, sempre que construímos um edifício, volta e meia esquece-se de avisar que um dos nossos edifícios está prestes a colapsar e a libertar uma pickup cheia de zombies. Intencional ou não, a falha de comunicação junta-se à aleatoriedade da geração dos mapas (começar sem um dos recursos-chave por perto é agreste!), à falta de informação prévia em relação ao que cada edifício faz e precisa para ser feito e a tudo resto para aumentar ainda mais o nível de dificuldade deste jogo. O facto de não permitir acelerar o tempo também deve ser tido em conta, porque acaba por funcionar como um obstáculo à gestão dos recursos quando queremos angariá-los para uma obra maior.

Mais c’as mães!!!

They are Billions é difícil. Sim. Ao escrevê-lo e após um bom punhado de horas, confesso que ainda não terminei com sucesso nem o primeiro nível – baixei a dificuldade inicial para menos de 50% agora – mas adorei cada hora que passei com ele, a ver os meus pequenos concidadãos a defender hordas e hordas de zombies. Se gostam de jogos de RTS, de zombies e de turtling na base, They are Billions é um jogo simplesmente obrigatório.