Ainda há uns dias falávamos da postura autofágica da Square, na sua homenagem a si mesma com Lost Sphear. Mas não é a única a querer reviver os melhores momentos da histórias dos videojogos, e em específico, dos JRPGs. Os Final Fantasy são um marco para muitos jogadores, e as iterações da PS1, as primeiras em 3D, aquelas que definitivamente abriram o género para todo o mundo.

A influência emocional destes Final Fantasy, em especial o VII, é mais que evidente. Para muitos jogadores este foi um ponto de viragem importante no mercado. Hoje, muitas desses jogadores que se deixaram mergulhar no mundo de Midgard e Gaia são game developers e alguns deles querem produzir algo que se aproxime desse jogo tão marcante para si.

No ano passado tivemos o caso de um dos jogos que indiquei como um dos melhores JRPGs do ano, e que era, curiosamente, norueguês. Earthlock tinha exactamente o mesmo espírito do jogo do qual falamos neste artigo, a pegar na influência dos Final Fantasy da PS1 e a adaptá-lo para algo diferente.

LEGRAND LEGACY: Tale of the Fatebounds (doravante chamado apenas LEGRAND LEGACY) é um desses casos. Desenvolvido pelos Semisoft Studios, os criadores indie indonésios decidiram fazer mais do que levar-nos à geração de ouro dos JRPGs em 2.5D. LEGRAND LEGACY é violento, sangrento até, e abre de forma agressiva para conhecermos o nosso protagonista, Finn, um escravo numa arena de gladiadores cuja vida é comprada por um misterioso viajante.

O cliché do protagonista amnésico tem de vir ao de cima, e pelo potencial de combate de Finn e pelo interesse do seu senhor, percebemos que, a par do que os JRPGs nos habituaram, há decerto mais nele do que aparenta.

Ninguém vai adorar LEGRAND LEGACY pela sua história, ou mesmo pelo seu ritmo narrativo. O cliché do protagonista não é o único num objecto repleto de lugares-comuns, mas onde a jogabilidade e a experiência de JRPG se sobrepõe a uma escrita mediana, com uma construção de personagens que estão alguns furos acima do mundo onde habitam.

Não me lembro da última vez em que um jogo me deixou morrer no tutorial, mas isso aconteceu-me três vezes em LEGRAND LEGACY. Apesar de não trazer para a mesa grandes inovações mecânicas que não tenham sido já exploradas por outros JRPGs, o nível de dificuldade ultrapassa em muito o que o mercado contemporâneo nos habituou no passado recente.

Parte da dificuldade do combate centra-se na introdução de mecanismos de QTE dentro de cada ataque ou defesa, que nos obriga a conseguir acertar com um ponteiro numa pequena zona de um círculo para indicar que tivemos sucesso.  Parece algo simples, mas este mini-game em cada acção acaba por dificultar o que noutros jogos damos como garantido, que é a execução de uma acção com sucesso. Um ataque pode muitas vezes nem acertar, assim como podemos não conseguir defender-nos dos inimigos e acabar por perecer.

Com colocações de personagens em front row e back row permite-nos criar algumas estratégias e adaptações por combate, sendo que este é hiper-dependente de elementos, das suas forças e fraquezas.

LEGRAND LEGACY: Tale of the Fatebounds, apesar de possuir um orçamento bem mais baixo do que a Square teve para Lost Sphear, conseguiu cumprir o espírito de inspiração daquele período e desenvolver um jogo interessante. Continua a não suplantar o que de melhor se fez na última metade dos 1990s em termos de JRPGs, especialmente no seu ponto mais fraco, a história, mas é uma das melhores e mais sólidas abordagens indie aos JRPGs. E pelo menos custa apenas metade do que a Square está a pedir por Lost Sphere.