A Hora do Meh #19

Hoje vamos fazer um exercício digno d’A Hora do Meh. Alguém se lembra da expectativa que sentiu quando foi anunciado para 2000 o lançamento do filme Dungeons & Dragons? Com alguns sucessos recentes dos efeitos especiais (dos quais Matrix estava na proa) aquilo que acreditávamos que seria atingido com esta adaptação do famoso RPG era próximo da sublimação.

E o que é que Hollywood nos deu?

Algo digno dos excrementos de um dragão. Sim, deixamos aqui a dúvida que se os dragões existissem que tipo de produto os seus organismos criariam para expelir materiais indesejados. Possivelmente se os dragões existissem eles defecariam DVDs do filme Dungeons and Dragons.

Os 3 jogos que são alvo dest’A Hora do Meh não chegam a esse patamar. Mas por outro lado são tão medianos e amenos que não chegam a ter efeito nenhum em nós. Antes fossem terríveis, porque assim conseguiriam fazer-nos sentir qualquer coisa que fosse.

Yodanji

É sabido que temos um fraquinho por roguelikes. No meu caso isto é especialmente notório se pensarmos nas formas ocidentais de o fazer, com reminiscências de jogos da geração de 8 bits, desafiantes, e implacáveis. Alguns jogos japoneses, como Sorcery Saga: Curse of the Great Curry God fizeram-me conhecer a forma nipónica de abordar o género, com um cruzamento interessante com os dungeons crawlers.

Em Yodanji andamos de masmorra em masmorra a combater yokais, sendo que temos a oportunidade de os capturar e jogarmos com eles. Se neste momento as palavras Yo, Kai e Watch vos apareceu na cabeça, não estranhem. Mas para o fazer temos de andar a colectar scrolls e levar 3 até ao final da masmorra para o desbloquearmos, o que é tºao o mais justo do que a forma de captura no famoso jogo da LEVEL-5.

Há aqui boas ideias e até a abordagem ultra-retro ao estilo Commodore 64 acaba por funcionar num espírito ultra-minimalista. Mas o problema de Yodanji, com os seus controlos barrocos que embatem na ultra-simplicidade de todo o jogo acaba por trazer pouco mais que uma experiência leve e casual aos roguelikes, mesmo os de abordagem nipónica. E não chega a ser forte o suficiente para nos fazer o que muitos roguelikes conseguem: manter-nos agarrados durante horas infindáveis.

Lançado para Android, iOS, Steam e Switch, há pouco que este jogo consiga fazer para fazer esquecer a sua aura excessivamente casual do mercado mobile.

Jeremy Irons olha Yodanji nos olhos e atira uma bola de fogo à queima-roupa. Com todos os bónus do actor inglês, o jogo acaba por ser incinerado por inteiro.

Battlecursed

Há uma porta deixada escancarada por Legend of Grimrock, quando decidiu relembrar-nos, e bem, de como fazer um bom first person dungeon crawler. O problema de se terem esquecido de fechar essa mesma porta é que o vento acabou por deixar entrar tantos jogos do género que aquilo que era uma boa lembrança passou a ser um enjoo.

Battlecursed é um destes jogos, mas que nos vende algo de diferente, que é a possibilidade de não embarcarmos na aventura com um personagem solitário. Aqui é-nos dada a chance de criarmos uma front e back line de 4 personagens no total, os quais temos de alternar pensando nas suas forças e fragilidades. As habilidades  ataques são feitas através de cooldowns, o que significa que passamos mais tempo a fugir das muitas criaturas que nos querem fazer a folha do que a lutar.

Para além do jogo parecer excessivamente como o resultado de um tutorial de “faça o seu próprio explorador de masmorras genérico na primeira pessoa”, o desequilíbrio mecânico de todo o jogo torna-o aborrecido, e o entusiasmo de atravessar cada nível é rapidamente raptado pelo enfado. 

Thora Birch olha para Battlecursed com o mesmo olhar com que fita aquilo que um dia poderia ter sido a sua carreira. O desânimo tem um peso tão opressivo que Battlecursed sucumbe sob o peso da auto-desilusão da actriz norte-americana.

The Forbidden Arts

Havia algo que a priori me levava para o ambiente de Dragon Valor neste The Forbidden Arts, e que me deixou com uma vontade imensa de o experimentar. Mas se havia algo que esse clássico de PS1 tinha que este indie recém lançado pelo estúdio Stingbot Games não tem era a criatividade das ramificações narrativas e geracionais dos protagonistas, que nos motivava a seguir em frente até às boss fights. E o pior das comparações entre os dois títulos é que os vinte anos que os separam não são tecnicamente assim tão distinguíveis.

Se acusei Battlecursed de ser genérico, The Forbidden Arts sofre exactamente do mesmo problema, mas ainda leva em cima com os erros naturais de um action-platformer em 2.5D e em que os comandos estão tão desafinados que até julgamos que foram concorrer ao Festival da Canção.

Apesar do cenário ser bonito, todos os movimentos e acções são demasiado perros para sequer termos algum usufruto de fluidez, que nos chegue a divertir ao jogá-lo. O pouco de narrativa que vamos desenterrando deste jogo lançado em Early Access há poucas semanas não nos dá sequer vontade de passar muito tempo a tentar explorar as aventuras e desventuras do protagonista cliché que viu em sonhos que pode mudar o mundo.

Justin Whalin* olha para The Forbidden Arts sem saber nem quem ele próprio é nem quem o jogo é. Já ninguém se lembra dele, e Justin acaba por abraçar The Forbidden Arts, desaparecendo juntos da existência, sem que ninguém sinta grande falta.

* Sabem quem é Justin Whalin? Era o actor principal do filme Dungeons and Dragons.