Caçada Semanal #150

São 150 edições. Isto se fossem as revistas de banda-desenhada que crescemos a amar dava uma capa toda especial, com os personagens principais a agarrar uns gigantescos dígitos que lembrassem toda a gente que aquela era uma edição especial. Mas esta centésima quinquagésima Caçada Semanal não é especial, ou aliás, é tão especial quanto qualquer outra, o que significa mais ou menos… nada.

O título também não é sinal de iliteracia, é apenas um trocadilho simpático com o facto de que cada vez encontramos óptimos exemplos de bons RPGs feitos por equipas pequenas, é um dos sinais de que este mercado está cada vez mais sensível às qualidades de produção de jogos do género.

São então 2 bons indie RPGs que provam que a palavra e o acrónimo são indissociáveis.

Azure Saga Pathfinder

Para nós, é-nos fácil pensarmos que grande parte do desenvolvimento independente provém do ocidente. Não fossem alguns estúdios asiáticos a virem comprovar-nos do contrário, e facilmente ficaríamos com uma visão eurocêntrica de que quase tudo o que tem relevância indie vem da Europa, ou dos nossos “semelhantes” do continente norte-americano.

É precisamente da Indonésia que nos chega uma das melhores propostas de JRPGs indie, na senda de jogos que fizeram sucesso na viragem do milénio. Azure Saga: Pathfinder é o somatório de uma série de ideias mecânicas da era áurea de sucesso dos JRPGs (e tactical JRPGs) do final da década de 1990. E felizmente para nós, o resultado desse somatório é altamente positivo.

A outra ideia amplamente corajosa do estúdio indonésio MassHive Media é a forma como nos mergulha num setting mais sci-fi, com laivos de fantasia, com um tom mais sério e menos ingénuo que muitos dos jogos aos quais presta homenagem mecânica e conceptual. A proximidade temática deste jogo com clássicos como Star Ocean ou Phantasy Star são alguns dos elementos que lhe permitem distanciar-se de tantos outros indie JRPGs que caem no cliché da fantasia medieval nipónica, sendo ensombrados por tantos bons jogos que fazem o trabalho de melhor forma. É curioso também identificar durante o combate qual o jogo no qual Azure Saga: Pathfinder se está a inspirar. Seja nos ataques combinados decalcados de Chrono Trigger ou na barra de fúria que se enche à semelhança dos Limit Breaks de Final Fantasy VII.

Apesar das ilustrações usadas em cutscenes serem excelentes, há algo de rígido nos sprites de Azure Saga: Pathfinder que nos lembra da pior forma uma certa linha estética de RPGs para mobile.

A custar 7,89€ no Steam, é uma das propostas mais interessantes que a loja recebeu no último mês em termos de JRPGs, com uma história interessante, pouco pueril, mas por vezes afectada por imprecisões de inglês, com gralhas e traduções à Google que fazem o jogo pagar um pesado preço.

Healer’s Quest

Param que já jogou pen and paper RPGs ou MMORPGs (ou até mesmo MOBAs) sabe que o papel de suporte de um personagem healer é pouco apreciado. Contra mim falo que costumo enveredar por papéis de dano, ou “distribuição de fruta” se preferirem (mas não num sentido futebolclubedoportoesco), e sempre senti que tomamos a posição de quem mantém a party viva como garantida.

É sobre isso que fala este indie RPG de paródia chamado Healer’s Quest, desenvolvido pelo estúdio Rablo Games, que nos coloca na difícil tarefa de controlar um healer que acompanha uma série de personagens idiotas que não apreciam tudo o que fazemos por eles.

Mecanicamente é um jogo de memória muscular em que corremos o nosso arsenal de feitiços para manter a nossa equipa, tarefa essa que nos pode deixar facilmente exacerbados dado o desafio que possui. Quem diria que um jogo com um tom tão leve e risível (no sentido positivo) acabaria por tornar-se tão frustrante graças a algum desequilíbrio mecânico?

É possível que isto seja apenas uma forma de sentirmos todos na pele aquilo que os main healers sabem: manter uma equipa em pé e saudável é difícil, mas aqui a coisa chega a outro patamar, onde a velocidade com que queimamos mana e a ligeireza com que os nossos colegas perdem vida fazem da tarefa de curandeiro uma verdadeira dor-de-cabeça.

Com um visual engraçado que nos lembra os livros de ilustração infantis europeus, o tom humorístico constante de Healer’s Quest cabe que nem uma luva a quem é um habituée das lides dos RPGs de mesa, em que vai sentir que muitas das piadas e caricaturas correspondem à realidade do jogo, e é especialmente para este nicho que o jogo é recomendado.