Pokémon GO foi uma experiência gira… durante 2 ou 3 dias. Agradeci as calorias que queimei com o jogo, à procura daquele Pokémon que estava a uns bons metros de distância ou de refrescar o meu stock de Poké Balls. Mas ficou por aí. A coisa era engraçadinha especialmente porque trouxe para o mundo hiper-mediático as possibilidades de um jogo de AR com GPS como este. Foi divertido durante um bocadinho, fez muita gente lembrar-se dos jogos originais, mas ao final do dia era e é, insípido. Quando vejo que ainda hoje existe malta a jogá-lo olho para as minhas 3DS com os cartuchos de Pokémon lá metidos e agito a cabeça sem compreender a razão.

Imagens reais do último jogador de Pokémon GO ainda em actividade, a olhar ao longe um ginásio seu no meio do oceano.

Esta madrugada, entre os choros de um recém-nascido e a histeria dos fãs pelo anúncio da Game Freak que ia vendo no ecrã do telemóvel enquanto o mais pequeno bebia o seu leite, lá acompanhei o anúncio de Pokémon Let’s Go Pikachu! e Let’s Go Eeevee, que não é, repito, não é, o jogo da série principal a chegar à Switch. Esse só veremos em 2019.

As duas versões de Pokémon Let’s Go são notoriamente feitas para um público casual, na tentativa de os conquistar do ecrã do telemóvel para a portabilidade da Nintendo Switch. Ora, se muita gente aderiu em massa a Pokémon GO por este os lembrar dos seus tempos de criança ou adolescente e da primeira geração da famosa série, então é precisamente a ordenha dessa memória que a Game Freak e a Nintendo vão tentar, com este novo jogo que é a viagem de Pokémon GO na Switch a ser uma espécie de remake de Pokémon Yellow.

Ainda hoje acredito que a febre de GO passou ao lado nos jogadores mais “sérios” de Pokémon. E com “sérios” não digo que vivam a sua vida sob a bandeira da franquia, mas aqueles que, como eu, ainda não pararam de jogar a Pokémon desde que a primeira geração foi lançada. Seja com uma vertente competitiva ou coleccionista, há muita gente que embarcou na corrente de Pokémon GO e cedo percebeu o quão vazio era o jogo.

Mas vamos a coisas positivas que retirámos do trailer, e começamos obviamente pelo visual. Não sendo ainda o primeiro jogo principal de Pokémon a ser desenvolvido em alta definição, mas dá para antever o que é possível conseguir com um RPG lançado na Switch em oposição às gerações correntes lançadas na 3DS. Espero, porém, que o jogo da 8a geração possa encaminhar-se por uma direcção artística de cel-shading, que acredito que será perfeito não só para o que conhecemos de Pokémon, mas para as potencialidades técnicas da consola.

As mecânicas de captura de Pokémon no jogo mobile eram “engraçadinhas”, misturando o factor sorte com a destreza de acerta no timing e local certos com a Poké Ball. Vê-lo adaptado para um jogo “a sério”, um RPG light para a consola é capaz de ser uma boa-utilização para os controlos de movimento dos Joy-Con, e que se ajustam ao espírito mais “leve” deste jogo em oposição aos RPGs tradicionais. No entanto espero que esta forma de captura não contagie o próximo jogo principal, onde as mecânicas e estatísticas associadas ao arremesso e escolha de Poké Balls são mais complexas do que a casualidade de GO, e só perderiam se reduzidas a elementos gestuais.

Protagonistas e criacionistas: os 2 únicos de todo o jogo que não podem evoluir.

A possibilidade de co-op é interessante e até quero perceber se servirá como possível embrião para algo semelhante na série principal. Digo-o porque tenho pensado muito nesse factor no último mês, já que eu e o meu filho mais velho, cada um munido da sua 3DS, temos estado a passar alguns dos jogos mais recentes em conjunto. Mas não tão “em conjunto” quanto eu gostaria.

A adição de um periférico exclusivo para este jogo é algo que vejo os mais novos a adorarem, especialmente com todas as características anunciadas para o Poké Ball Plus. É claro que isto é possível dada a simplicidade mecânica deste Let’s GO, e apesar de ser um dispositivo engraçado dificilmente encaixará nas exigências de controlo de um jogo tão complexo quanto os jogos principais.

Por outro lado, Pokémon Let’s Go pode ser um bom gateway para o público que perdeu o interesse com Pokémon há muito tempo ou para as novas gerações que podem ter aqui o seu primeiro contacto mais desenvolvido com a série. Mas este caminho intermédio entre a casualidade (e vacuidade) mecânica de Pokémon GO e a complexidade tradicional de um RPG como a série principal pode ter como sacrifício a integridade qualitativa do jogo. Pode ser demasiado complexo do que o público casual está habituado e será (sem a possibilidade de combater Pokémon selvagens, breeding, estatísticas de IVs e ambições competitivas) um mero fait divers para os jogadores que seguem atentamente a franquia.

Era isto mas a queimar calorias reais se faz favor.

A outra dúvida com que fiquei é que a Nintendo quer notoriamente que o público casual que joga Pokémon GO que transite para a sua consola, mas será que existem jogadores que se mantenham a jogá-lo nos dias de hoje que não sejam “hardcore”? E desses que ainda hoje se mantêm estoicamente (sem eu conseguir perceber porquê) a jogar o jogo desenvolvido pela Niantic, quantos é que ainda não migraram para a Switch? Terá este jogo a capacidade de servir de isco para um público mais casual? Tenho sérias dúvidas, porque era a ligeireza e o nada que é na realidade o Pokémon GO, aliado ao hype e à trend que fizeram dele o sucesso que foi. Com a tendência a ter-se desvanecido, dificilmente essas pessoas que voltaram a ter contacto com a marca através do jogo mobile terão de vontade de jogar um RPG light como este que foi anunciado.

“Mas mãe, eu disse que queria uma Switch como prenda, e não meias brancas com raquetes!”.

Numa altura em que todos ansiamos a oitava geração de Pokémon (ainda que a anterior tenha saído “ontem” e ainda tenha muita diversão para dar), este Pokémon Let’s Go é uma sandes de torresmos para quem espera insaciável por um bom bife. Admito porém que para quem tem fome, até meia sandes de torresmo serve. Depois de (a título de exemplo) ter passado mais de 100 horas ao longo dos últimos 2 meses a jogar Pokémon na 3DS, mais facilmente me vejo a sentir-me preenchido por jogos antigos da 3DS do que esta refeição “leve” que a Game Freak nos irá apresentar como cash in do seu público, que, convenhamos, come qualquer coisa que lhe seja posta à frente. Eu que o diga, que mesmo com a falta de entusiasmo que tenho e a notória insipiência deste Let’s Go sei que lá vou despender muitas e longas horas. Jogar este jogo vai ser igual a comer uma lasanha do Continente: sabemos que uma lasanha “a sério” é infinitamente melhor, mas à falta de outra coisa que comer ela sempre dá para tapar o buraco no estômago.