Quem sabe faz, quem não sabe critica” ou ensina ou qualquer coisa assim, mas para já e para efeitos desta pequena dissertação vamos dizer que “quem não sabe critica”. A arte da crítica, seja ela profissional ou não, é algo que se está a perder ao longo do tempo por várias razões mas acima de tudo, na minha opinião, pela facilidade que temos agora de chegar facilmente a milhares senão a centenas de milhar de pessoas. Essa facilidade de alcance é colocada nos dois pólos, os que vêem e lêem e os que escrevem e produzem qualquer tipo de conteúdo. Podem ser vídeos, posts num website ou comentários numa rede social, o alcance é cada vez maior e isso é algo que nos vai dando cada vez menos criticas de qualidade e mais criticas sem valor.

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As recentes críticas ao jogo Death Stranding e em especial a enorme conversa que o Rui e o Ricardo tiveram sobre tudo o que ainda envolve o lançamento do jogo foram o meu gatilho para olhar para a arte da crítica e o que se poderia chamar o “ódio” que a internet e outras novas tecnologias permitem que seja destilado. Eu não tenho grande interesse em comprar o Death Stranding, apesar de confiar na opinião tanto de um como o outro dos meus colegas de poleiro não é algo que chame por mim. Talvez um dia o jogue em PC, não comprei uma PS4 para jogar o Spider-Man não vou comprar para isto. Não obstante acho que a maneira como tanto o Ricardo como o Rui fizeram as suas criticas do jogo de uma forma profissional e com o respeito que o jogo merece. Mas também sei que muitos outros o fizeram de uma forma atabalhoada.

Eu sou o primeiro a confessar que muitas vezes despachei jogos para fazer um artigo, às vezes porque ao fim de pouco tempo percebia tudo o que o jogo tinha para me dar, outras porque além disso teria a perder tempo para outros que muitas vezes temos em backlog e merecem ser olhados sejam AAA ou Indies feitos por uma pessoa apenas. Mas também sou o primeiro a dizer que todos eles são tratados com o respeito que merece o trabalho de quem os criou.

O que aconteceu a Death Stranding foi uma corrida pela primeira opinião em que alguns conseguiram atingir essa meta sacrificando o seu tempo noutros assuntos e alguns simplesmente apanharam o metro até à meta para poderem dizer que no cartaz do jogo está uma citação sua que às vezes é tão vazia como “Palavra” ou “Wow” e não são propriamente obras da literatura portuguesa. Isto aconteceu com este jogo, muito propagado por um hype gigante e uns embargos hermeticamente fechados, mas pode acontecer com vários outros.

Neste caso, a Sony distribuiu tantas cópias de Death Stranding que só dentro do Rubber Chicken (que é em alguns aspectos um colectivo de escritores e críticos) eu contei umas cinco que incluem a que veio para nós e as que foram directamente para pessoas que são membros do galinheiro mas também escrevem para outras publicações, sendo o ponto importante aqui que toda a gente que tem um blog ou conta de Instagram e a avó deles recebeu uma cópia e portanto a corrida era mais para ver a “opinião” sair antes da dos outros, um pouco como aquele pessoal que tinha mania de dar a resposta “primeiro” num artigo. Sem conteúdo útil, só uma vã glória masturbatória de ter escrito algo antes de qualquer outra pessoa.

Fora dos Death Strandings do mundo, e indo para os outros jogos e também para outros meios de entretenimento há a questão dos ódios pessoais tanto dos críticos profissionais e dos “profissionais” como de todos aqueles a quem a internet dá uma voz. Não só aquelas pessoas que fazem review bombing a um jogo porque ele não sai para a loja digital preferida deles, ou as que fazem críticas negativas a um filme porque não concordam com o casting. Mesmo quando não o viram mas também aqueles que profissionalmente não sabem separar os seus gostos pessoais da sua avaliação profissional. Há uns anos , era mais complicado. Já foi muito complicado fazer críticas, um profissional tinha que ter uma publicação física que colocasse as suas palavras em papel. Antes disso era visto e revisto, editado e passado a pente fino. Hoje… é só ter um blog, como o nosso começou por ser. Hoje qualquer trengo faz um site e torna-se PR de marcas produtoras ou distribuidoras regurgitando press releases ligeiramente alterados para algo “original” ou tentativas falhadas de prosa e inteligência.

Um fã? Esses tinham que escrever uma carta à mão para fazer uma crítica. Na melhor das hipóteses escreviam à máquina. E se se enganassem na sua fúria? Toca a escrever de novo. Depois dobrar a carta, meter num envelope, colar um selo, levar a um marco dos correios… para isso era preciso ódio a sério, foco, empenho…

Hoje…?

Hoje em dia criticar é fácil, é só teclar com a ajuda do anonimato e distância que a internet permite. E muitos poucos o sabem fazer como deve ser. Mas já dizia o outro: Toda a gente é um crítico hoje em dia…