Desde que instalei o novo Fairway Solitaire no meu iPad, a quantidade de jogos por analisar foi acumulando, as ideias para bons artigos de opinião foram ficando na gaveta e aquilo que parecia apenas mais um jogo nas dezenas de lançamentos mensais da Big Fish Games, tornou-se uma verdadeira obsessão para a qual regresso sempre que posso e que me deixa acordado na cama até o sol nascer.

Já passaram pelas minhas mãos centenas de jogos iOS, e não estou a falar em sentido figurado. Entre jogos pagos e jogos grátis, entre jogos do primeiro iPhone 3G até ao iPad 2, já perdi a conta aos títulos que experimentei. Só no iPad tenho neste momento instalados cerca de 120 jogos, e muitos mais foram os que por lá passaram mas que tiveram direito a muito pouco tempo de antena. Outros, tornaram-se enormes vícios, como Tiny Tower, Jetpack Joyride ou Temple Run, a consumirem-me várias horas de vida e produtividade. No entanto, nada se assemelha ao magnetismo que Fairway provoca em nós e à forma como, sem darmos por isso, largamos tudo para aproveitar qualquer minuto a virar cartas.

Tenham medo, tenham muito medo.

 

A Big Fish Games é mais conhecida por lançar para o mercado fornadas de jogos de objectos escondidos, onde reina o gratuito com compras dentro das aplicações. São uma das produtoras com mais sucesso no iOS e também uma das mais bem sucedidas com os conteúdos pagos. Com um catálogo de mais de 2500 jogos online para PC e Mac, e com cerca de 100 jogos já lançados para os dispositivos da Apple, a produtora experimenta tudo o que é ideia, muitas vezes de forma completamente surreal. E se juntarmos puzzles e vacas? E que tal uma aventura gráfica com bonecos de cera? E qual será a prole resultante de um encontro sexual entre o bejeweled e capacetes de moto? Há de tudo para todos os gostos mas que resulta, quase sempre, em algo descartável.

Porém, uma dessas ideias loucas acertou em cheio no alvo. Porque não pegar no modo golfe do Solitário, e juntar-lhe as características do golfe tradicional? Aquilo que parece apenas mais um cruzamento casual, resulta numa combinação de génio. A Big Fish percebeu certamente o que tinha em mãos e investiu muitos recursos na criação deste título que está polido a todos os níveis.

Golfe e cartas. Quem diria...

 

A fórmula de base é a da conhecida variante do Solitário, na qual temos de construir cadeias de cartas em sequência. A ideia é tentar virar e limpar todas as cartas do tabuleiro, ficando com o menor número possível por virar, idealmente zero. Mas a esta jogabilidade simples juntaram-se as características do jogo de golfe real. Para começar, cada ronda é um percurso dividido em vários buracos. Os percursos podem ser uma colina na Irlanda, um relvado em Nova Iorque, um oásis no Deserto, num conjunto que agrega entre si cerca de 350 buracos diferentes, cada um com a sua combinação de cartas. Temos percursos de 3 buracos, 6 buracos e de 9 buracos, cada qual com um par para atingir. Por exemplo, um buraco com par 3, permite acabar o mesmo com três cartas em cima da mesa. Se terminarmos o buraco com uma carta abaixo do par, conseguimos um birdie, com duas cartas abaixo do par, um eagle, e assim sucessivamente. Se deixarmos cartas acima do par, na mesa, somos penalizados com valores positivos. Quando chegamos ao final de cada percurso, temos de ter um somatório no nosso scorecard, igual ou inferior ao par, para podermos seguir para o próximo.

Algumas das características mais icónicas do golfe foram inteligentemente implementadas no jogo. Existem algumas cartas que representam folhagem cerrada, zonas de água ou até mesmo bancos de areia. No caso da areia, temos que encontrar a carta com o taco especial para conseguirmos virar todas as outras que se encontram na ingrata posição arenosa. No caso da água, necessitamos de limpar primeiro todas as cartas que estão debaixo da mesma, enquanto que as cartas que se encontram na folhagem densa precisam de duas voltas para serem limpas. Genial.

O lápis atrás da orelha é fundamental.

 

Quando nos falta uma carta imprescindível para virar as existentes, podemos sempre recorrer ao nosso saco de golfe, onde temos um ferro com cada número que necessitamos. Esses tacos, quando usados no jogo, transformam-se na carta com o mesmo valor do número do ferro, o que permite sair de uma situação de impasse. Mas esta estratégia tem um custo. Se usarmos um taco temos de esperar algumas rondas até o podermos usar novamente e mesmo quando estiver disponível temos de o comprar com os pontos ganhos no jogo. É aqui que surge a componente mais estratégica do jogo e na qual temos que ponderar muito bem, antes de fazer uma aquisição.

Existem várias formas de conseguir pontos no jogo, incluindo acabar jogos abaixo do par, completando percursos com pontuações altas, conseguindo sequências de 6 cartas ou mais, ou ainda através da obtenção de um dos 32 troféus existentes no jogo. Esses pontos podem ser gastos não só nos tacos mas também em habilidades especiais que ficam sempre disponíveis daí para a frente. Por exemplo, podemos começar todos os jogos limpando três cartas na zona de água, ou mostrando a face de metade das cartas que se encontram na mesa.

... é ter na alma, a chama imensa.

 

O humor é uma constante ao longo de todo o jogo. Para começar, temos um roedor maléfico a tentar minar o nosso sucesso. Quando este aparece, somos presenteados com uma série de mini-jogos ou desafios rápidos, na qual podemos ganhar ou perder pontos, reorientar cartas, partir tacos, entre outras recompensas ou castigos que nunca se tornam repetitivos. Mas o melhor são os três comentadores de serviço que vão relatando as nossas jogadas, sempre com uma piada apropriada à situação e centenas de diálogos diferentes. Junte-se a isto o humor presente nos troféus e nas habilidades que podemos adquirir e completamos o conjunto de razões que fazem deste um jogo muito especial.

O jogo começa por ser gratuito com a possibilidade de desbloquear a versão total por 2,39€ no iPad ou 0,79€ no iPhone. De salientar que devem escolher a versão que querem jogar, pois comprar o jogo no iPhone não significa que o estejam a comprar no iPad. No entanto, a inteligência deste jogo é a possibilidade de podermos comprar ainda habilidades e packs de pontos. Nunca me senti tão tentado com micro transações e não vos digo quanto já gastei em Fairway, mas já dava para comprar um título maior no Steam. O único defeito nestas compras é serem exclusivas de cada versão, e se quiserem ter os mesmos atributos na versão iPad e iPhone têm de comprar tudo a dobrar.

Isto é pior que o dia aderente.

 

Fairway Solitaire é uma pérola escondida nas dezenas de milhares de jogos da App Store. Aquilo que à partida seria apenas um cruzamento improvável entre um jogo de Solitário e o golfe, resulta no jogo mais viciante que já joguei no iPad ou no iPhone e, certamente, num dos jogos mais viciantes de sempre que já foi lançado para estes dispositivos. A mecânica de jogo simples mas repleta de possibilidades, os upgrades, os twists e o humor sempre presente, tornam este jogo extremamente polido em algo impossível de largar. Se só pudessem levar 5 jogos com vocês para uma ilha deserta, este teria de ser um deles. Só não digam é que não vos avisei, porque depois de o descarregarem não vão conseguir fazer mais nada na vida.

(Fairway Solitaire está disponível em duas versões, Ipad e iPhone, na App Store)