Está a acontecer uma verdadeira revolução no Kickstarter que vai dar muito que falar nas próximas semanas e que vai fazer com que o anterior sucesso dos 3 milhões do jogo de Tim Schafer pareça uma brincadeira de criança.
A ideia para construir uma consola de 99 dólares (cerca de 80 euros), com um sistema operativo Android e um modelo de jogos Free-to-Play já ultrapassou os 3 milhões de dólares em pouco menos de 2 dias e não mostra sinais de abrandar, crescendo a um ritmo de 250 mil dólares a cada 5 horas. Com 28 dias de Kickstarter ainda pela frente, ninguém quer fazer estimativas sobre o valor que a ideia vai reunir, mas todos acreditam que poderá tornar-se o projecto mais bem sucedido de sempre. O pedido para tornar a OUYA uma realidade limitava-se a 950 mil dólares.
A OUYA surgiu como uma vontade de abanar o mercado. Num momento em que grande parte dos melhores criadores estão a mudar-se para produtoras de jogos mobile e free-to-play, os criadores da consola acreditam que a melhor experiência é aquela jogada com um comando na mão e um televisor. Daí surgiu o projecto de criar uma consola de baixo custo a correr o sistema operativo Android e que seja aberta tanto ao nível do hardware como do software, sem qualquer das conhecidas “taxas” milionárias necessárias para criar jogos e disponibizá-los nas consolas actuais. A empresa permite até que todos possam mexer no interior da consola e do seu software, dando acesso aos esquemas electrónicos e permitindo aceder ao interior da mesma. A correr o sistema operativo Android 4 e, em princípio, preparada para futuros upgrades do sistema operativo, a consola oferece uma plataforma de desenvolvimento para a qual é fácil criar e na qual já existe muita experiência de desenvolvimento.

O modelo free-to-play está a ser um dos maiores debates da indústria mas o que é certo é que cada vez mais nomes de peso se estão a juntar ao mesmo, incluindo a Valve, a Blizzard, a Crytek e a Insomniac.
A consola será alimentada por um Tegra3 de 4 cores semelhante ao que está no interior do novo Nexus 7 da Google e vai contar com 1 Gb de RAM (o dobro da Xbox 360) para além de 8 Gb de memória Flash interna que podem ser expandidos com qualquer disco rígido USB. A ligação HDMI promete 1080p no televisor e a consola possui Wi-Fi para se ligar à internet.
Não será isto a mesma coisa que comprar um PC muito barato e ligá-lo ao televisor para jogar? Teoricamente sim, mas na prática o que está a ser tentado é um sistema agregador para onde possam convergir os criadores e os jogadores. Isto é, uma plataforma em tudo similar ao modelo de negócio do iPad ou do iPhone mas de forma totalmente aberta, de mercado livre, sem letrinhas pequenas no contracto e sem dezenas de configurações de hardware ou versões de sistema operativo diferentes.
O comando constitui uma tentativa ao nível do design de atingir o controlador perfeito para o acto de jogar. Isto pode parecer à partida mais olhos que barriga, mas com o designer de producto Yves Behar à frente do desenho estético do hardware é bem possível que isso possa ser atingido. Behar tem estado à frente de vários projectos inovadores e é responsável pelo projecto de Nicholas Negroponte “One Laptop Per Child” que envolveu a criação de um computador portátil de 100 dólares que depois chegasse ao máximo de crianças carenciadas através de instituições e organizações de solidariedade. O comando possui ainda um touchpad em toda a sua parte central de forma a permitir correr o catálogo de jogos Android actuais ou futuros, que queiram ser compatíveis com ecrãs de smartphones ou tablets.
Inspirada nos modelos de negócio de League of Legends ou Team Fortress 2, Julie Uhrman, a fundadora da empresa que está a desenvolver a OUYA pede apenas uma coisa aos criadores de jogos para a plataforma: que os títulos tenham pelo menos alguma parte de jogo gratuita. No entanto, com um hardware quase idêntico ao Google Nexus é bem provável que possamos vir a jogar também jogos a partir de browser como acontece no Google Chrome, onde títulos como Bastion ou From Dust podem ser adquiridos e jogados sem necessidade de grandes máquinas.

Embora seja uma plataforma aberta, a OUYA vai ter uma “curadoria” de jogos centralizada num só lugar.
Quem sabe a inclusão do Chrome não será uma das novas possibilidades. É que assim que o projecto ultrapassou os 950 mil dólares pedidos em menos de 8 horas, os criadores começaram a pensar em quais deverão ser os Stretch Goals, objectivos para além daqueles que estavam inicialmente propostos. Como até as pessoas à frente do projecto estão abismadas com a resposta do público pediram a todos que os ajudem a ter ideias sobre o que deve ser definido como as novas etapas a atingir.
Haverá mercado para esta consola? Em menos de dois dias 21642 pessoas já disseram que sim. De todos os backers, o número de pessoas com a contribuição igual ou superior a 99 dólares e que dá direito a receberem a consola, já ultrapassou os 20 mil. Talvez não seja exagerado dizer que o número final de apoiantes financeiros da consola possa ultrapassar os 200 mil no primeiro mês de anúncio e ainda sem a consola estar nas lojas. Se isso não é já em si um pequeno mercado, é pelo menos um grande indicador do potencial comercial do projecto, pois estes números envergonham até o arranque de consolas como a 3DS e a PS Vita.

A equipa afirmava que pertencia aos jogadores mostrarem que querem uma consola destas. E de que maneira estão a mostrar!
Mais do que financiar uma nova máquina de jogos parece-me que estamos a financiar uma ideia e uma nova forma de ser e estar no mercado dos videojogos. Não nego que os jogos AAA são grande parte da minha diversão com este universo, senão a maior, mas é com os jogos independentes que tenho tido as maiores surpresas tanto no PC como no iPad e as sessões de jogo mais enriquecedoras, geralmente quase todas abaixo dos 10 euros por título. Se a OUYA conseguir construir uma enorme comunidade de jogadores e de criadores, onde seja fácil construir e lançar novas ideias, onde os jogos sejam grátis ou pelo menos baratos, numa máquina estandardizada, faz todo o sentido apoiar este projecto. Para quem estiver tentado, podem visitar a página Kickstarter da OUYA aqui.
Eu da minha parte já fiz o meu contributo de 99 dólares para que quando a consola seja lançada a partir de Março de 2013 chegue um exemplar às minhas mãos. Na pior das hipóteses, o mercado não liga a este projecto e fico com um cubo de 80 euros em casa. Na melhor das hipóteses, por apenas 80 euros, participo naquela que promete vir a ser uma das maiores revoluções da forma como os jogos chegam até nós.