Peter Molyneux anda há mais de duas décadas a tentar criar o jogo que seja maior que a vida, isto é, um jogo que mude o mundo. Depois de Populous, de Black & White, de Fable, e de Curiosity, a visão de Molyneux atingiu finalmente o patamar da realidade com o jogo Foldit. Só que, curiosamente, este jogo não é de Molyneux.

Foldit é uma plataforma de investigação que utiliza o poder da utilização em massa. No jogo, descarregável gratuitamente, qualquer pessoa sem conhecimentos científicos pode tentar a sua sorte em estabilizar uma proteína, essas cadeias de aminoácidos que compõe as nossas células e que são responsáveis por funções vitais como transportar nutrientes, enviar sinais ao cérebro, ou separar os elementos do que comemos necessários a fornecer energia aos músculos. Sem as proteínas, já erámos.

Estas cadeias de aminoácidos podem ser entendidas na versão para totós como um “conjunto de pessoas de mãos dadas” mas que não gostam de se afastar entre si. Isto é, as pessoas das pontas não querem ficar assim tão afastadas, daí que todas se tentem aninhar umas nas outras. Quando a promiscuidade entre todas as pessoas for total, para além de estarmos perante um verdadeiro deboche, a proteína chegou à sua forma mais estável. A partir daí, era como um swing party, se voltássemos a afastar as pessoas, elas voltavam a juntar-se outra vez.

Começamos assim, com uma proteína instável.

 

Os investigadores estudam estas formas e tentam descobrir qual a forma estável de cada proteína. O resultado da investigação é conhecer quais as proteínas envolvidas em cada doença e como fabricar medicamentos que “falem” directamente com estas proteínas. Se as proteínas estão envolvidas em tantas doenças como a sida, o cancro e o Alzheimer, então também podem estar envolvidas na cura.

As proteínas têm uma tendência natural para encontrarem a sua forma estável, e essa vontade já foi replicada em algoritmos computacionais. Computadores poderosos tentam diariamente conduzir os modelos de aminoácidos à sua forma perfeita. O problema é que acabam sempre por ter de contar com a ajuda dos humanos, com uma última mãozinha para fazer os últimos ajustes. É aqui que entra Foldit. O jogo coloca-nos nas mãos proteínas reais que estão a ser estudadas e o nosso objectivo é atingir o equilíbrio máximo da proteína. Podemos ir pedindo ajuda automática da aplicação, mas será sempre uma cooperação entre mulher/homem e máquina que irá atingir o resultado mais fidedigno. A partir daqui estas proteínas seguem para investigadores científicos para comprovarem a estabilidade da forma. Ou seja, nós todos fazemos o papel de assistentes para que os cientistas possam concentrar-se no trabalho principal de verificar as proteínas que já chegaram ao seu estado estável.

O objectivo é atingir uma estabilidade como esta, e poderem adormecer mais tranquilos pois ajudaram a tornar o mundo num lugar mais feliz.

 

O jogo demora um pouco a entender e por isso existem vários tutoriais que nos ajudam a arrancar. A partir daí podemos começar a dobrar, esticar e encolher aminoácidos sabendo que podemos subir de nível, ganhar achievements e, principalmente, ajudar a mudar o mundo para melhor.

Molyneux tinha razão. É possível criar um jogo que mude o mundo. Só estava errado quando achava que ia ser dele.