A Ópera está de Regresso
Quatro anos, sete meses e dez dias. Este foi o tempo que Master Chief esteve adormecido numa enorme Forward Unto Dawn à deriva, sem comunicações com o exterior e cortada ao meio pelo salto espacial semi-falhado com que terminou Halo 3. “Acorda-me, quando precisares de mim” disse Chief quando entrou para a sua cápsula de sono criogênico, deixando Cortana num silencioso emaranhado de destroços a flutuarem no espaço. A trilogia terminava assim com um aperto na garganta e em ironia dramática, com a temível ameaça Flood finalmente eliminada mas num isolamento forçado e triste. Quatro anos, sete meses e dez dias depois, Cortana precisou do Chief.
Halo pertence ao reduzido número de jogos que reinventou um género. O primeiro jogo foi responsável por introduzir mecânicas que influenciaram todos os shooters e que se tornaram standard até aos dias de hoje. A possibilidade de transportar apenas duas armas, atirar granadas sem ter de baixar a arma, escudos regenerativos ou a capacidade de atacar corpo a corpo com a arma que temos nas mãos foram algumas das novidades com as quais a produtora Bungie revolucionou, continuando por mais 10 anos a implementar algumas das maiores inovações enquanto redefinia também a experiência multiplayer. Quando a produtora abandonou a série após Halo: Reach muitos foram os receios de que outra produtora não conseguisse manter o grau de inovação na série. A herança que a 343 Industries recebeu nas mãos era tão pesada quanto delicada.
A estratégia da 343, a produtora da Microsoft criada para desenvolver o futuro da série, foi a mais acertada. Em vez de inovar, resolveu solidificar. Em vez de reinventar, decidiu polir. Halo 4 é o resultado de um trabalho de consolidar tudo o que já foi criado até hoje e de afinar todos os pormenores que vinham de trás. Como arranque de uma nova trilogia nas mãos de novas pessoas, esta abordagem permite manter a confiança dos fãs no caminho da série deixando futuras inovações para os próximos títulos. Significa isto que Halo 4 é mais do mesmo? Sim, mas mais do mesmo muito melhor. Halo 4 é o melhor Halo até hoje criado, de um ponto de vista evolutivo da série, e o ponto mais alto a que o franchise consegue chegar na geração actual. A série precisava no entanto de algo que justificasse mais 3 episódios e essa justificação não podia ser apenas uma narrativa diferente. A resposta foi encontrada num novo inimigo.
Os Promethean são uma lufada de ar fresco na série, uma nova raça de inimigos que introduz novidade num campo de batalha já demasiado habituado aos Covenant. Os inimigos tradicionais estão de regresso com os seus Grunts, Jackals e Elites mas desta vez o cenário dos primeiros minutos é uma preparação para a apresentação dos nossos novos adversários. Numa área rochosa do planeta artificial Requiem, com lava a querer brotar de fendas no chão e uma iluminação em tons de violeta e azul reflectidos nas pedras, o ambiente é de um lugar verdadeiramente alienígena e inóspito. Todo o palco é preparado para a chegada de quem nos irá defrontar nos próximos anos da série. Quando aparecem os primeiros inimigos a descer as paredes rochosas enfrentamos algo a que já não estávamos habituados em Halo: o desconhecido.
Nesta secção do planeta Requiem, um enorme planeta articial Forerunner, somos apresentados ao total de cinco configurações diferentes de Prometheans, uma mistura entre inteligência artificial, metal e tecido orgânico. Os dois tipos de Crawlers são construções que se assemelham a hienas e lobos mas que no lugar da cabeça têm uma arma de fogo. Mimetizando animais de quatro patas atacam em grupo, e com a possibilidade de saltarem ou andarem nas paredes são propensos a emboscadas rápidas atacando pelos flancos ou por detrás. Os Crawlers são a linha da frente que protege os Knights, um dos inimigos mais inteligentes de toda a série Halo. Estes cavaleiros têm a capacidade de se teletransportarem entre áreas do cenário e não só usam esta habilidade para evitar os nossos ataques como para chegar rapidamente ao nosso encontro, frequentemente quando estamos a recarregar a nossa arma. Digamos que os Knights são um género de Elites com esteroides. A acompanhar os Knights estão habitualmente os Watchers, bicópteros voadores que podem criar escudos de protecção aos Cavaleiros, regenerá-los quando os abatemos ou apanhar as nossas granadas num campo de força para serem devolvidas à proveniência, para além de transportarem também eles um sistema de fogo próprio. A junção de todas estas classes no mesmo campo de batalha resulta em inimigos inteligentes que nos atacam de todos os lados e aos quais começamos muito cedo a emprestar personalidades próprias e a tomar como o alvo dos nossos insultos, um sinal de que o sistema de Inteligência Artificial do jogo funciona em pleno. Se acharem estes inimigos fáceis, então está na altura de subir o grau de dificuldade. É a partir do modo heroico que os Promethean mostram as suas verdadeiras cores.
As armas dos Promethean são as mais rápidas de todas e juntam-se às já existentes para criar três grandes grupos: humanas, covenant e promethean, cada uma com as suas equivalentes. No total, somando as três raças contamos com quase vinte armas diferentes para escolher e a primeira vez que vemos uma arma Promethean a montar-se nas nossas mãos, ou a desmontar-se e montar-se para ser recarregada sentimos que nada nos pode parar. As caçadeiras Scattershot, as carabinas Lightrifle ou as Sniper Binary Rifle fazem-nos sentir poderosos e imparáveis. Isto é, até aparecer o primeiro Hunter. O difícil é por vezes escolher mas a certeza é que nunca nos falta essa escolha uma vez que os cenários estão recheados de arsenal à disposição. Esta abundância serve para enfrentar as hordas progressivamente maiores de inimigos que substituem as Boss Fights afastadas de Halo 4. Se os inimigos mais fortes continuam a ser os Hunters, os momentos mais difíceis de Halo são no entanto aqueles em que todos nos tomam como o inimigo e em que Promethean e Covenant se juntam para nos atacar em vagas sucessivas.
Num momento em que muitos jogos apostam em jogabilidade montanha russa e em eventos em tempo real, Halo 4 devolve aos shooters a exploração do ambiente ao ritmo do jogador. E que ambiente! Halo 4 devolve-nos a sensação de estar a descobrir mundos verdadeiramente alienígenas com cenários incríveis tanto ao nível dos exteriores como dos interiores e com uma imensa variedade. Um cemitério forçado de naves caídas em chamas, uma selva densa ou um enorme deserto rochoso são apenas alguns dos cenários imponentes de Requiem, onde podemos caminhar a pé ou a bordo de um dos muitos veículos, com todos os habituais de regresso desde os Pelicanos aos Scorpions mas desta vez com a condução mais afinada (o Warthog nunca esteve tão divertido) incluindo o Mantis, um Mech que nos faz sentir invencíveis. Mas é nas gigantescas estruturas interiores que Halo 4 provoca o espanto. Estruturas imponentes alteram-se e modificam-se à nossa frente e enormes espaços possuem intricadas construções repletas de luz que os tornam enormes espaços de exploração perfeitos para o combate. A fascinante direcção artística de Halo 4 é responsável por algumas das mais belas construções de locais e estruturas Alien presentes num jogo, acompanhadas por uma iluminação fantástica, onde a volumetria da luz e as partículas no ar emprestam um ambiente que provoca a surpresa tanto a céu aberto como dentro de portas. Sinceramente, não acreditamos que a Xbox 360 tenha mais para dar do que isto tanto ao nível gráfico dos cenários como de todos os restantes elementos, dos veículos aos inimigos, dos hologramas às armas. Já nem acreditávamos que isto fosse sequer possível.
A relação de Master Chief com Cortana acompanha-nos ao longo de todos os ambientes e é nessa “intimidade” que se constrói o pilar emocional de Halo 4. Cortana está em remissão, isto é, está a morrer por estar a atingir o seu limite de idade funcional. Esta deterioração progressiva faz com que Cortana se torne imprevisível e que tenha falhas constantes que se assemelham a uma demência gradual. A falsa humanidade de Cortana, sobre a qual ela própria se interroga num dos melhores momentos de Halo 4, vai ser uma companhia constante de Chief, constituindo o habitual guia para o próximo passo mas pela primeira vez constituindo também um perigo. A restante história de Halo 4 é no entanto extremamente confusa e ou será clarificada nos próximos jogos ou está simplesmente mal contada. Todas estas histórias e momentos são pontuados por uma banda sonora épica que é um dos maiores feitos musicais que esta indústria conseguiu, principalmente nas músicas mais calmas.
http://soundcloud.com/ilya-v-boykov/halo-4-ost-requiem-sample
Muitos jogadores vão adquirir Halo 4 não pela campanha mas pelo multiplayer. A 343 Industries fez mudanças significativas às capacidades online de Halo e o propósito foi tornar o jogo mais competitivo e, principalmente, mais justo. Acabaram-se os campers ou as estratégias únicas que permitiam aniquilar os mais amadores com uma enorme facilidade, como a combinação Jetpac e Headshot, ou a utilização de escudos de energia em Halo: Reach. O Jetpac e outros atributos continuam presentes tanto no multiplayer como na campanha mas deixaram de constituir uma vantagem acentuada. A camuflagem permite ver bem os outros, o Jetpac é mais lento e não consegue grandes alturas e o escudo de energia só protege à frente. Os mapas foram desenhados de forma a serem um pesadelo para os “campistas”, sem esconderijos nos mapas constituídos de estruturas mais pequenas e interiores, ou nos grandes mapas com a presença de veículos. As armas deixaram de aparecer sempre nos mesmos locais e passam a mudar aleatoriamente de local para evitar estratégias de espera e guarda nos locais das Sniper Rifle ou Spartan Laser.
Alguns puristas vão criticar o facto de termos que ir avançando de nível antes de conseguirmos desbloquear loadouts, armas e atributos, mas aqui Halo 4 teve de seguir as estratégias dos grandes títulos multiplayer do mercado. O retorno do investimento nos FPS está a ser cada vez mais baseado em sistemas de subscrição e na sua utilização em e-sports e campeonatos e aí a tendência é a de uma progressão por níveis. A partir do nível 50, Halo permite ainda escolher uma de 8 especializações que aumentam as nossas capacidades, o que conduz a um desafio constante desde os níveis mais baixos aos níveis mais altos. Com um matchmaking bem afinado estão disponíveis nove modos para todos os gostos (Infinity Slayer 4×4, Big Team Infinity Slayer 8×8, Dominion 6×6, Regicide, Flood 10, Capture the Flag 5×5, Oddball 5×5, King of the Hill 5×5 e Team Slayer Pro 4×4). A grande novidade é o modo Pro em que tudo é muito mais rápido, desde a deslocação dos jogadores à mudança e recarga de armas.
A grande lacuna é a não inclusão de um modo de todos contra todos ou de um modo de horda, já imprescindível em modos online. As Spartan Ops, missões cooperativas com história até 4 jogadores substituem de alguma forma o modo de horda, mas têm um final de missão em detrimento do sistema resistir até cair, tão divertido com os amigos. O positivo nas Spartan Ops será o lançamento de novas missões todas as semanas para os assinantes do Xbox Live. O jogo conta ainda com os já habituais desafios semanais e com um sistema de medalhas que premeia a utilização de armas, veículos ou a aniquiliação de inimigos e que nos premeia com mais pontos de experiência.
O melhor: A relação entre Master Chief e Cortana; A impressionante direcção artística, especialmente das enormes estruturas interiores; A enorme selecção de armas; A banda sonora épica; Os Promethean; A melhor iluminação conseguida numa Xbox; A possibilidade dada ao jogador de explorar o cenário ao seu ritmo; O equilíbrio do multiplayer.
O pior: A história demasiado confusa; A não inclusão de um modo horda e de um todos contra todos.
É muito difícil apontar defeitos a um Halo 4 que constitui o afinar de todas as excelentes mecânicas de combate de uma das melhores séries de shooters de sempre. Num tempo de jogos demasiado lineares, Halo 4 devolve o sentido de exploração aos FPS possibilitando a gestão de progressão ao ritmo do jogador que lhe permite apreciar os impressionantes locais alienígenas criados por uma das mais belas e impressionantes direcções artísticas de um jogo Xbox 360. Tudo está de regresso, nada reinventado mas tudo melhorado. A inclusão de novos inimigos com os excelentes Promethean vem trazer a frescura no único ponto em que série começava a aborrecer. Podem descansar. Halo 4 é a prova de que a série está muito bem entregue.
(Halo 4 é um exclusivo Xbox 360)
Comments (2)
Eu não possuo uma x-Box 360, sou um utilizador da prima dona da sony ps3 mas tenho de admitir que jogos como gears of war e halo seriam uma boa desculpa para “alugar” uma x-Box 360 durante uns meses…
Bela análise, devo dizer que estou a jogar Halo 4 e a evolução gráfica foi espantosa, para além de manter e aperfeiçoar o que já era mérito como jogabilidade, trilha sonora e enredo.