Existe algo que se perde numa pessoa quando esta se torna jogador ou jogadora avançada de videojogos. Há uma ingenuidade e uma inocência que ficam esquecidas nos tempos remotos em que se agarrou num comando pela primeira vez. A experiência de uma ou de um gamer proporciona mais destreza na compreensão e utilização de mecânicas, mais conhecimento sobre séries, personagens e história de centenas de jogos, e muito maior capacidade de terminar um jogo, alcançar as pontuações de topo ou sobreviver em duelos multijogador. Mas um gamer torna-se também uma pessoa mais cínica perante os jogos, mais rezingona e, quem sabe, menos feliz.

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Na Meo XLParty 2012 que decorreu na FIL assisti a uma invasão de jogadores casuais no pavilhão 4, que lá acorreram curiosos para experimentar as muitas experiências de jogo que estavam à disposição do público comum, separado da área de LAN Party onde os mais “sérios” se dedicavam à aniquilação constante, ao consumo de power drinks para vencer a exaustão de não dormir e a uma curiosa insistência num certo palavrão que ecoava e se repetia pelo espaço. Mas separados por barreiras físicas destinadas a proteger as suas sanidades mentais, não vão eles passar para o lado do vício, estava o público maioritariamente casual: aquele que joga ocasionalmente, raramente ou até que nunca jogou. Ao observá-los e ao fotografá-los não consegui deixar de reparar os sorrisos rasgados nas faces, o quanto se riam, o brilho enorme nos seus olhos.

meoxlpary2012_006À minha frente estavam muitas gerações, desde crianças até aos seus avós, que absorviam a experiência de jogo de uma forma à qual eu não assistia desde há muito tempo. Mesmo quando o Kinect falhava em perceber onde é que as pessoas estavam, mesmo quando os controlos do Move se recusavam a apreender onde as pessoas tentavam acertar, mesmo com os problemas de iluminação do jogo X, do controlo absurdo do jogo Y, ou da história repetitiva do jogo Z, as pessoas riam, olhavam com espanto, comentavam, apontavam, interagiam. Assisti ao olhar cúmplice com um sorriso entre um casal de namorados que experimentava os controlos de toque numa Vita, uma mãe que observava com curiosidade o domínio que o seu filho de 7 anos demostrava com um arcade stick, um senhor de 70 anos fascinado com as guitarras virtuais de Guitar Hero, ou as pequenas multidões de todos os sexos e idades reunidas em redor do nosso sofá do Rubber Chicken onde as personagens da PlayStation se digladiavam entre si.

Ao olhar para estas pessoas percebi o quanto já perdeu um jogador experiente. Noutras áreas, de passagem por entre os mais experimentes, escuto as conversas sobre os novos XCom, Disnohored, Halo, CS Go, Need for Speed, Call of Duty e em todas existe sempre a frase: “Sim, mas…” Este “mas” representa aquilo que perdemos. Um “mas” sobre os controlos, um “mas” sobre a originalidade ou falta dela, um “mas” sobre o nível de multi-sampling anti-aliasing, um “mas” sobre a capacidade de aguentar 60 frames por segundo e uma combinação 2x MSAA/FXAA. Este “mas” representa a nossa inocência perdida.

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Isto não é no entanto uma crítica. É uma inevitabilidade. Um famoso jurista Americano disse um dia que “uma mente que é esticada pela experiência não pode nunca mais voltar ao seu tamanho original”. É certo que quanto mais jogamos mais exigentes nos tornamos. Deixamos de tolerar as imprecisões da câmara da Microsoft, os ports baratos de títulos famosos na Vita ou o conjunto de narrativa e mecânicas repetitivas e preguiçosas no que se tornou a série Call of Duty.

Não devemos nunca deixar de ser críticos e exigentes. Porém, peço-vos a todas e a todos um pequeno esforço. Lembrem-se da magia dos vossos primeiros momentos a jogar, lembrem-se da forma que as primeiras experiências vos maravilharam. E de cada vez que pegarem num jogo novo tentem começar por trazer à memória essas sensações. Vão continuar a existir jogos que são uma bela trampa, mas com esta abordagem talvez possam surgir muitas surpresas que vos possam devolver aquele sorriso rasgado, aquele brilho no olhar e, como no caso de Journey, a primeira lágrima de sempre com um comando na mão.

O melhor da XL Party foi a maravilhosa invasão das jogadoras e dos jogadores casuais, porque fez-me recordar a razão que aqui me trouxe em primeiro lugar: a magia de controlar um conjunto de pixéis num televisor.

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