Knights Of The Old Republic

Era uma vez há muito tempo atrás e numa galáxia muito distante…

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“Salvador, conquistador, herói, vilão… és tudo, e ao mesmo tempo, és nada. E no fim, enquanto a escuridão me leva, eu sou nada também.” – Darth Malak

Estas foram as palavras escolhidas pelo antagonista de Star Wars: Knights of The Old Republic (KOTOR) para descrever a personagem principal, ditas como último suspiro antes do corpo sucumbir às lesões feitas por um sabre de luz e cair no sono eterno. Existe sempre uma certa magia quando jogamos um bom RPG. Ficamos tão absortos e envolvidos na história que não damos pelas horas passar. Quando olhamos para o relógio já são cinco da manhã e mesmo assim queremos continuar, queremos saber mais sobre as personagens, sobre os sítios por onde viajamos, sobre as missões que temos pela frente. De repente, as que parecem infidáveis horas de jogo já passaram e estamos no final da nossa aventura, ansiosos por ver o fim, mas nostálgicos por sabermos que vai terminar. KOTOR não fica aquém desta sensação, muito pelo contrário.

Desenvolvido pela Bioware e lançado no ano de 2003 é, possivelmente, um dos melhores jogos feitos pela empresa. Anda lado a lado e de mãos dadas com Mass Effect, embora tenha sido lançado quatro anos antes deste, e curiosamente, foram ambos escritos pelo mesmo autor, Drew Karpyshyn. A recepção ao jogo não podia ter sido melhor tendo logo arrecadado vários prémios como Jogo do Ano, Melhor Jogo para XBOX, Melhor RPG, entre outros. Tanto a resposta da crítica como da comunidade gamer foi gratificante em todos os sentidos. Ainda hoje é considerado um dos melhores jogos de Star Wars, senão mesmo o melhor.

A cidade está em ruinas e o meu maxilar também...

A cidade está em ruinas e o meu maxilar também…

 

Cerca de 4000 anos antes da formação do Império que vimos nos filmes, a Antiga República encontra-se num estado de guerra contra uma nova vaga de praticantes do lado negro da Força (Sith). Estes Sith são liderados por Darth Malak, antes praticante do lado iluminado da força (Jedi). A história começa no meio de um confronto entre republicanos e Sith com um personagem que tanto pode ser masculino como feminino (para os propósitos deste conto vamos chamar-lhe R). A primeira missão é simples: fazer o possível e impossível para encontrar a arma secreta da República, uma aprendiz Jedi chamada Bastila Shan. Durante o reencontro, Bastila revela ao nosso herói que tem a habilidade de sentir a Força e que um dia poderá ser um Jedi (claro que foi aqui que os meus olhinhos brilharam e quase perfuraram o ecrã do pc). É nesta altura que R se desloca na sua nave (bastante semelhante à mítica Millenium Falcon de Han Solo que vemos nos episódios IV, V e VI da primeira trilogia) para uma reunião com o Conselho dos Mestres Jedi. Relutantemente, estes Mestres aceitam treinar R a utilizar a força para o bem.

Durante o treino atravessamos planetas a fim de descobrirmos pistas para encontrar os Sith e fazemos colecção de companheiros para nos ajudarem a travar a ameaça do lado negro da força. Ao caminharmos com R na superfície dos vários planetas conseguimos sentir cada passo dado através das cores, sabores e da extraordinária música a que Star Wars tanto nos habituou. Estamos dentro do jogo e não existem dúvidas disso. A areia áspera de Tatooine raspa-nos a pele enquanto que o calor infernal dos seus dois sóis a queima, salpicos de água transbordam em Manaan juntamente com um cheiro a peixe transmitido pelos seus habitantes, perdemo-nos nas florestas intermináveis de Kashyyyk e sentimos arrepios na espinha quando entramos nos tumulos dos antigos Lordes dos Sith em Korriban. A nossa viagem termina num confronto épico entre R e o vilão, Darth Malak.

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Já tenho areia na boca…

 

KOTOR é um típico RPG, no qual as escolhas que fazemos determinam se vamos ser praticantes do lado negro ou iluminado da Força, e assenta no princípio de turn based combat: ora lutas tu, ora luto eu. Como é habitual com a Bioware, as conversas que vamos tendo no decorrer desta aventura são de extrema importância, em especial porque apontam para o destino que queremos traçar para R. Antes de iniciar o jogo tem que existir uma preparação mental e física para várias horas de afirmações, exclamações e interrogações. No entanto, é, de facto, um deleite ouvir e participar nestes diálogos não só pelo conteúdo que oferecem como, em especial, pelo voice acting que está por trás.

Com Star Wars já é dado adquirido existirem personagens de todas as raças, espécies e feitios. KOTOR não é diferente, entregando a R um conjunto diverso de companheiros que pode ir até nove. Desde um velho rabugento, que encontramos escondido nunca casa pitoresca no meio de uma floresta (fazendo aqui até um certo paralelismo com Yoda no episódio V da primeira trilogia), a um bicho alto e peludo (da mesma espécie que o fiel camarada de Han Solo, Chewbacca, da primeira trilogia também), graciosamente referido por R como “carpete ambulante”. Estas personagens oferecem não só ajuda em situações de combate (em cada “missão” podemos jogar com R e um máximo de dois companheiros) como também proporcionam, à medida que vamos dialogando com as mesmas, informações úteis sobre o seu passado. Se as cartas forem bem jogadas, teremos a oportunidade de criar um clima romântico com um/a de três deste leque de companheiros. Uma curiosidade nestes relacionamentos é o aparecimento da primeira personagem homossexual no Universo criado por George Lucas, a Jedi Juhanni, que aparece como opção para romance se R for uma menina. Uma decisão tomada pela Bioware que tanto foi aplaudida como criticada. Mas não se entusiasmem rapazes porque o máximo que poderão fazer é andar de roupa interior pelos planetas fora.

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Desavergonhada!

 

Ao longo do jogo vamos adquirindo uma panóplia imensa de objectos não só para usar como também para modificar as nossas armaduras ou armas. Existe um inventário espaçoso, claramente para agradar a hoarders, já que nunca consegui encontrar-lhe fim. Sendo a possibilidade de guardar objectos tão extensa, algumas dúvidas surgem sobre o que é bom para usar ou não, portanto tem que existir uma especial atenção às características daquilo que apanhamos. R, inicialmente, pode pertencer a uma de três classes: scout, que é como quem diz escuteiro, pronto para sobreviver no meio do mato; scoundrel, um verdadeiro matador ou Don Juan com charme para dar e vender; e soldier, também conhecido por Rambo. Qualquer uma destas classes tem as suas características próprias, se R tem mais força ou mais destreza, se é inteligente ou carismático, se tem queda para computadores ou para reparações, entre outras. Isto tudo vai ajudar posteriormente o processo de que tipo de Jedi seremos . A escolha é entre Consular, sendo a força o seu maior aliado; Guardian, confiando nas técnicas de combate com um sabre de luz; e Sentinel, uma espécie de mistura das anteriores com aptidão especial para as tecnologias.

Como é de esperar, encontramos as três dificuldades convencionais em KOTOR: easy, normal e hard. No entanto, as diferenças entre estas não são fáceis de sentir. À medida que avançamos de nível, sendo o máximo 20, vamos gradualmente aumentando o nosso poder e sentimos cada vez menos problemas em derrotar os diversos inimigos. A cada nível podemos escolher entre várias técnicas de combate e também uma panóplia de poderes através da força. Existindo um tão grande poder de escolha é talvez uma desilusão podermos chegar apenas ao nível 20. Isto faz com que existam uma quantidade de outros poderes e técnicas que ficam por explorar, o que torna R incompleto. E ali estamos nós a terminar o jogo, na batalha final, com um gajo que nem um mind-trick, por exemplo, sabe fazer.

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Han Solo? Não… mas temos um wookie.

 

Após ter explorado este RPG de uma ponta à outra afirmo, com certeza, que o seu verdadeiro trunfo está na história. Sendo este um jogo baseado no Universo de Star Wars, isto não vem como surpresa. Até mesmo nos filmes, não são só as batalhas no espaço e com sabres de luz que os tornam épicos, é também todo o argumento e narrativa que está por trás. A história que nos faz identificar com os seus personagens, que nos faz vibrar com as falas e consequências das mesmas, que nos faz pertencer gradualmente àquele conto. KOTOR é exactamente isso. Tudo o que acontece a R e aos companheiros que o rodeiam é suficiente para entrar naquela galáxia e de lá não querer sair. Nós somos um Jedi ou um Sith, nós fazemos as nossas próprias escolhas, nós construímos amizades e relacionamentos, nós derrotamos Darth Malak e forjamos um novo futuro para a Galáxia. Para quem gosta dos filmes, este jogo oferece a possibilidade de conhecer o que está para trás. Conhecemos a Antiga República e alguns dos heróis que a fizeram prosperar e vilões que a deixaram em ruínas, descobrimos os antigos Mestres Jedi e as ideologias seguidas, notando de imediato as diferenças na forma como lidam com o mundo. E mesmo depois de tanto já feito e escrito sobre este Universo é incrível observar a quantidade de histórias que ainda existem para contar. KOTOR deixa em nós uma enorme vontade de procurar e aprender tudo o que há para contar sobre R, para além do que nos é apresentado. E não será isso também que faz um grande jogo?

“Só eu é que fui tanto Jedi como Sith, conseguindo assim encontrar clareza na força.” – Revan