Instagram dos demónios!

Spirit Camera: The Cursed Memoir é a mais recente encarnação da série Project Zero (ou Fatal Frame como lhe chamam nos EUA, ou Zero, como é conhecida no Japão). Neste série de survival horrors, produzido pela Tecmo Koei Games, o conceito geral é que a(o) protagonista recebe uma câmara fotográfica, a Camera Obscura, com a qual pode detectar e destruir fantasmas, espíritos e demais entidades sobrenaturais. Ora pelas suas características naturais de hardware, é natural  que este jogo tenha sido desenvolvido para aproveitar as melhores características da Nintendo 3DS.

No início do jogo, nós, os protagonistas, somos presenteados com um pequeno diário, o Diary of Faces, um pequeno livro que vem no interior da embalagem do jogo e que serve como base para quase toda a Realidade Aumentada (RA) em todo a jogabilidade. Desse diário, logo no início do jogo, com o uso da Camera Obscura (a nossa 3DS)libertamos (ao bom estilo do terror nipónico) uma rapariga chamada Maya, que para além de servir como tutorial ao próprio jogo, é ela que nos vai guiar pela viagem.

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Guiados por uma rapariga sem memória. Parece boa ideia!

 

É muito difícil considerar SpiritCamera como um videojogo: trata-se sim de uma experiência alargada de RA. Em muitos aspectos remete-nos algumas aventuras gráficas dos anos 90, totalmente em vídeo (FMV), em que o jogador (ou espectador, se preferirem) se sentia sobre carris, com um narrador a levá-lo pela mão e a percorrer a história. E é exactamente isto que a jovem Maya nos faz: acompanha-nos pela história e dá-nos dicas de como prosseguir no jogo.

Nada disto significa que o jogo não seja pelo menos divertido. Pelas (curtas) e a 3 horas de Story Mode conseguimos tirar algum proveito de combater espíritos na nossa própria casa. Apesar da progressão no Story Mode se resumir a ir folheando subsequentemente o nosso livro de RA, uma ou outra vez os puzzles são resolvidos com recurso a lentes especiais para a câmara que vamos desbloqueando ao longo da história, sem qualquer justificação (apenas aparecem na nossa lista de lentes fotográficas, explicado o seu efeito pela Maya) que permitem ver “camadas” diferentes de informação nas páginas do diário.

Apesar de algo divertido, o jogo não é de todo desafiante. Faltam-lhe mais puzzles à-la aventura gráfica, como no capítulo em que brincamos às escondidas com o espírito de um rapaz (e não avanço mais para não estragar o já de si curto enredo). De resto o jogo resume-se a seguir as indicações ÓBVIAS da Maya, e em qualquer dúvida, basta folhearmos para a próxima página e de certeza que lá estará a resposta para progredirmos na história. Do ponto de vista mecânico, a forma como progredimos consiste em encontrar a página do nosso caderno de RA com o qual a câmara da nossa 3DS reage, e “sincronizá-la”. Aí a página desvenda informações escondidas eleva-nos à progressão na história. O que na prática nos leva a dois problemas mais sérios deste Spirit Camera: The Cursed Memoir: um técnico e outro narrativo.

Do ponto de vista técnico é irónico que um jogo tão negro de terror asiático necessite de ser jogado com luz. Muita luz! Muita mesmo! Mesmo de dia, com cortinas abertas, sala completamente iluminada pela luz natural e pelos candeeiros, a quantidade de vezes em que a 3DS perde o reconhecimento do caderno de RA, ora por não ter iluminação suficiente, ora por estar a reflectir demasiada luz é imensa. Isso e não esquecer que quando falamos do Diary of Faces, o caderno de RA, estamos a falar de um pequeno caderno quadrangular com 18 páginas, agrafado e que precisa de ser manuseado, enquanto seguramos na nossa 3DS.

Olha o passarinho! BLAM!

Olha o passarinho! BLAM!

 

Acreditem que numa sala com uma iluminação de fazer inveja a um bloco operatório, a mera sombra da vossa mão que segura a página correcta do caderno, a vossa sombra projectada ou a da 3DS são suficientes para o reconhecimento do caderno se perder. Por outro lado a história , um conjunto de bons clichés de terror asiático, é curta e extremamente previsível. Os diálogos são arrastados e não trazem o suspense que o jogo pede. Portanto, uma Mulher de Negro atrai pessoas para uma casa abandonada e retira-lhes os olhos e a boca, aprisionando-os para sempre no diário. Onde é que já vimos isto tudo?

A outra parte do jogo envolve o combate aos espíritos com a velha fórmula de Project Zero: fotografar os espíritos com a Camera Obscura. Durante os combates temos de andar (literalmente) pela divisão da casa onde estamos (ou rua se for o caso) a lutar contra um espírito que assombra, por exemplo, a nossa sala-de-estar. Para isso temos de “focar” a câmara para darmos dano e/ou para contra-atacarmos o espírito. Os combates são divertidos apesar de muito repetitivos. E são fáceis, assim que lhes apanhamos o jeito ao primeiro/segundo combate. Muito fáceis.

Quando terminamos o Story Mode desbloqueamos o Story Mode (extra) que sobe ligeiramente a dificuldade do jogo, adiciona novos diálogos e desbloqueia um novo fato para a Maya. E é isso. Pouco ou nada adiciona à jogabilidade do modo anterior, mascarando de inovação um modo que se esgota à primeira volta.

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“Esta é a casa do Justin Bieber” – disse a multidão enraivecida!

 

Temos mais dois modos para jogar: Haunted Visions e Cursed Pages. Em Haunted Visions podemos fotografar amigos e familiares ou locais da nossa casa e combater espíritos que os assombram (que são fantasmas de outros jogos da série), ou combater os rostos deformados das pessoas à nossa volta. Em Cursed Pages, temos 4 mini-jogos que rondam na sua maioria com a reutilização do Diary of Faces e que abordam partes do modo de estória.

O melhor: a experiência de RA; alguns (poucos) puzzles; as batalhas: a sua mecânica ajustada à 3DS e o facto de combatermos pela nossa casa.

O pior: história previsível e curta; jogo muito curto sem qualquer valor de repetição quando terminado; o reconhecimento do caderno de RA pela câmara da 3DS podia ser melhorado.

Spirit Camera cumpre o objectivo a que se propõe: o de trazer o terror para a interactividade da RA, apesar de saber a muito pouco e a assemelhar-se mais a produto promocional das capacidades da 3DS do que de um jogo propriamente dito e apenas que traz um fugaz divertimento à experiência.

 

(Spirit Camera: The Cursed Memoir é um exclusivo Nintendo 3DS)