Um conto humanizado.
Duas crianças, dois irmãos, um mais velho e outro mais novo, são forçados a partir numa viagem em busca de uma poção que salvará o Pai enfermo. A mãe já não se encontra entre eles, levada pelas águas até ao fundo do mar durante uma tempestade enquanto o irmão mais novo, incapaz de a salvar, guardou um certo rancor pela sua incapacidade em ajudar. Garantir que os seus corações não fiquem mais destroçados e pelo amor que os move, os dois determinados e corajosos irmãos coordenam-se pelo caminho e seguem o mapa que têm em mãos, com a ajuda de desconhecidos e criaturas que lhes indicam o caminho e os assistem nesta jornada. A estes dois irmãos já só lhes resta o Pai.
A linguagem que lhes sai pelo mexer dos lábios é desconhecida, mas ao mesmo tempo parecemos entendê-los e por gestos, por simples olhares e até pelo próprio silêncio quando sentados num banco a observar o esplendor das paisagens. É um silêncio que transmite liberdade, que transmite paz, e que nos leva a sentar em cada banco que encontramos durante a viagem, sem pressa de chegar ao destino. Neste momento não interessa que o pai esteja às portas da morte. Não há pressa.
Cada irmão reage diferente de acordo com a sua maturidade e personalidade. Cada irmão reage de maneira diferente com os objectos, pessoas ou o próprio meio que os envolve. O mais velho é mais pousado, mais educado com as pessoas, e é aquele que demonstra ter mais poder de decisão. Já o mais novo tem menos problemas em atirar o balde de água fria para acordar alguém ou cuspir para o fundo do poço, mas ao mesmo tempo é aquele que mais demonstra humildade e um grande coração. Esta jornada é alimentada de valores humanos e que, por estes dois irmãos, nos vai fazer pensar o quanto a vida é curta e o quanto o ser humano pode esquecer muitas vezes o mais básico destes valores. E o que vai acontecer no final, para além de toda a magia que a produtora Starbreeze nos faz chegar, vai transformar esta aventura numa experiência que ninguém deve perder. São poucas as horas necessárias para “lermos” este conto, mas cada minuto tem uma importância ao sentirmo-nos envolvidos de perto com estas duas magníficas crianças.
Brothers: A Tale of Two Sons tem uma Mecânica robusta e jogabilidade sólida, em algumas partes com um toque de brilhantismo pela interacção entre os dois irmãos e como resolvem alguns simples obstáculos e puzzles. Cada um é controlado por um manípulo e interagem com tudo de uma forma simples, facultando uma certa suavidade na forma de jogar. No entanto, há momentos que nos troca as voltas quando alteram de lugar pelo hábito em controlar o que está à esquerda com o manípulo esquerdo e vice-versa. Não é um impedimento, é um hábito que se deve controlar. Vemo-nos a escalar montes e paredes por plataformas com bastante agilidade, dependendo em determinadas situações da ajuda um do outro. Vemo-nos a seguir caminhos separados para interagir com o meio de acordo com a aptidão de cada um, sempre num contexto de entreajuda e demonstrando uma sintonia profunda. É como se a Mecânica do jogo se unisse à própria relação entre os dois irmãos e, nesta perspectiva, é uma obra genial.
Eles complementam-se e cada qual tem um papel essencial para conseguir permanecer no caminho traçado pelo mapa, entre dias majestosos a noites obscuras, entre as aldeias a frescos destroços de batalhas de gigantes, entre glaciares a enormes fortalezas, com simples animais da quinta e criaturas fantásticas amigáveis, outras traiçoeiras e perigosas. A jornada transforma-se a cada passo e a cada capítulo num conto de fadas que visa ensinar os grandes valores humanos e mostra que tudo, afinal, é tão frágil e incontrolável.
A arte é olhada por um todo, mas perde-se um pouco na definição dos personagens, principalmente. Poderia ganhar mais com maior tratamento nos traços que evidenciem as expressões faciais, porque de emoções é carregado até ao final. Contudo, a mensagem não se perde, nem se dilui pela simplicidade dessa mesma mensagem. Além disso, e vista esta obra como um todo, quase com técnica cinemática em várias circunstâncias e com as câmaras a não obstruírem ou ficarem obstruídas, com cenários que nos fazem parar para vislumbrar, com uma música retirada dos melhores momentos dos Irmãos Grimm (não falo do filme), é de facto, arte. Perde também por problemas técnicos, com bugs que impedem progressão, mas cedo percebemos que algo está errado pois a complexidade no terreno e nas acções não são exageradas. Antes pelo contrário. Mesmo os puzzles intrigantes podem ser facilmente solucionados, menos por uma criança, talvez, e confere uma progressão contínua sem demasiadas batalhas com a nossa capacidade mental. Provavelmente, um patch até o lançamento de Brothers: A tale of two sons ou pouco depois servirá para resolver estes bugs.
A Música provêm de influências nórdicas, escandinavas, com um típico sopro de instrumentos tradicionais e ambientes frescos, outras vezes mais pesados consoante o circundante. Vozes agudas ou sopranos são à partida facilmente acariciadas no ouvido, em casos conhecidos como Lord of the Rings ou Skyrim, transpondo uma magia pelas melodias fantasiosas. A Starbreeze também apostou nisso, e bem, entre o canto em falsete e o assobio mas que não só de mágico é transmitido. Há algo de triste e bastante emotivo naquelas melodias, que acompanham a viagem dos dois irmãos.
O melhor: A Viagem, O Epílogo, a Música, a Mensagem.
O Pior: Alguns bugs que impedem progressão, mas resolvidos por auto-loads muito precisos. Alguma falta de estilização, principalmente nas personagens principais.
Que me recordo, nunca me arrepiei tanto por um final como este pelo seu desfecho. É uma jornada que vai tocar no coração e não há como ficar indiferente ao seu desfecho e parcelas da viagem. Como estes irmãos estão em sintonia, como com a sua personalidade nos ligamos a eles, como o objectivo é sempre marcado durante uma viagem que transforma a nossa percepção daquilo que possamos esquecer: algumas coisas mais importantes da vida. Brothers: A tale of two sons demonstra estar acima daqueles que nos querem vender a palavra “emoção”, por ser uma jornada a não perder, ainda que curta, pelos valores que transmite.
Versão analisada: Xbox 360 (Live). Também para PC Steam e PS3 (PSN)