Já lhe chamaram muita coisa: Marx chamou-lhe a Burguesia; Orwell chamou-lhe Big Brother; hoje chamamos-lhe “os mercados”; para muitos é apenas The Man. É a este The Man que o pequeno estúdio sueco Zoink! quer Stick it, onde encaixa que nem uma luva a mitologia da batalha do pequeno com o grandes, bem presente neste colectivo de pessoas criativas que inclui game designers, programadores, mas também directores artísticos e realizadores de publicidade, que emprestam um estilo muito próprio e extremamente criativo aos jogos, animações e publicidades que têm criado.

Stick it to the Man

 

Não é por acaso que na nossa lista dos 10 melhores jogos que jogámos na Gamescom, Stick it to the Man tivesse chegado à segunda posição, só não indo ao topo porque embateu na genial reinvenção do multijogador proporcionada por Titanfall. Como é que então ao lado de gigantes da indústria, este pequeno indie para a PlayStation 3 e PS Vita chega tão longe? Pela enorme criatividade da sua jogabilidade e por fazer-nos rir e sorrir constantemente.

A demonstração que a Zoink! e a Ripstone nos fizeram na Gamescom começou num manicómio. Ray, o protagonista desta narrativa retorcida, confessou à sua namorada o inconfessável: que acordou com um enorme braço de esparguete cor-de-rosa, um género de mão pega-monstro a sair-lhe do topo da cabeça. Claro que a namorada que não conseguia ver este braço o aconselhou a consultar um psiquiatra, mas o que não previa é que este especialista fosse do género cientista louco, pelo que o nosso anti-herói foi rapidamente fechado a sete chaves na companhia dos mentalmente desafiados.

Banana!

Banana!

 

Assim que Klaus Klyngeled, o criador do jogo, deslocou Ray para a direita do ecrã eu comecei a rir-me. Noutra cela, no topo da parede uma paciente fez uma teia de aranha com lençóis e andava por ela como um aracnídeo louco. É imperativo associar a estes momentos o estilo gráfico de Stick it to the Man, um género de ilustração que mistura o estilizado, com o traço grosseiro e que confere ainda mais humor a cada personagem. Este riso manteve-se constante ao longo da apresentação, mas aquilo que não esperávamos é que este jogo não fosse apenas uma aventura gráfica. Stick it to the Man é uma deliciosa mistura entre aventura gráfica, jogo de plataformas e acção furtiva. E isto, assegura Klaus, foi apenas um vislumbre do jogo todo.

Ter um braço e uma mão cor-de-rosa na cabeça não configurar apenas desvantagens. A grande vantagem desta aberração anatómica adicional é que ela consegue colar-se à cabeça das pessoas e aceder aos seus pensamentos. Depois de descortinados os segredos mais íntimos dos outros personagens, o essencial dos seus pensamentos fica disponível sobre a forma de autocolantes que podem ser descolados e guardados no nosso inventário. Esta é a forma principal para resolver puzzles em Stick it to the Man. Por exemplo, aqui está a solução para nos vermos livres do guarda que não nos deixa fugir da nossa área. Basta descolar o pensamento de gula que a “mulher-aranha” tem por moscas, e colar este autocolante na cara do guarda. Rapidamente a ameaçadora lunática vai capturar o guarda e enrolá-lo para consumo posterior. Isto é apenas uma forma simples de nos ensinar a mecânica principal, pois daqui para a frente a complexidade aumenta.

What?

Existem imensos personagens neste jogo, cada um mais divertido e mentalmente mais instável que o próximo. Existe alguém com um pior amigo imaginário (um enorme coelho peluche mau, sujo, com correntes e voz grossa), um médico psiquiatra com dupla personalidade, um louco que está a escavar um túnel no exterior para conseguir regressar ao manicómio mas que perdeu a motivação a meio do caminho, ou até o fantasma depressivo de uma rapariga. Cada um tem no seu sub-consciente as histórias mais mirabolantes e para que não percamos o fio à meada podemos rebobinar esses pensamentos para os repetir. Principalmente, todos estes personagens estão recheados de pensamentos, o que significa que todos eles estão recheados de autocolantes que podemos aproveitar para influenciar o próximo ou para colar no próprio cenário e desencadear acções.

A mão não serve só para aceder a pensamentos mas também como projéctil de apoio para nos elevamos a plataformas mais altas ou transitarmos rapidamente entre locais. Controlada pelo analógico direito do comando e accionada com um toque no gatilho, a mão proporciona um controlo rápido da mesma quando queremos chegar ao cérebro ou a um apoio para um salto. Isto é necessário nas muitas secções do jogo em que temos que evitar zonas inteiras de guardas e enfermeiras. Para além de fugir, saltar ou escondermo-nos, podemos ainda usar os pensamentos e autocolantes em nosso auxílio. Por exemplo, se um guarda está prestes a adormecer podemos roubar-lhe os “Zzzz…” do seu pensamento e colá-los na sua cara para que finalmente visite o João Pestana. Em alternativa podemos aparecer em frente a uma enfermeira, fugir e depois aceder-lhe aos pensamentos onde vai estar o nosso rosto. Depois basta colar a nossa cara num guarda e ver a enfermeira e o coitado numa luta absurda, enquanto nós fugimos de fininho.

Behold!!!

Behold!!!

 

Stick it to the Man tem tudo para ser um dos jogos mais criativos e inteligentes da PlayStation 3 mas principalmente da PS Vita. Do papel de cenário que pode ser arrancado para revelar outros locais; aos autocolantes que descolamos dos pensamentos dos personagens, cada um mais absurdo e divertido que o próximo; da combinação de mecânicas de aventura gráfica com outros géneros de jogo, ao estilo 2.5D artístico, humorístico e de traço grosseiro; passando pelo perfeito sistema de controlo em que o analógico direito controla o estranho braço e mão cor-de-rosa que nos cresceu na cabeça, este jogo independente dos suecos Zoink! tem tudo para se tornar um dos indies mais falados dos próximos tempos. O “The Man” pode sempre marcar presença nestes eventos com as suas áreas recheadas de luzes, sons e ecrãs gigantes, mas às vezes é preciso tirar este autocolante fluorescente e ver o desenho fantástico que os grandes estavam a tapar.