O Link que afinal é Zelda
Há que admitir que muitas vezes atiramos a ideia de “não julgar um livro pela capa” pela janela fora e simplesmente agarramos um jogo porque o visual nos é apelativo. Ittle Dew foi um desses casos notórios, em que um visual muito “cartoonesco” acabou por me seduzir, e querer saber mais sobre um jogo que à primeira vista se limitava a parecer uma versão Genndy Tartakovsky do Legend of Zelda.
E é aliás na série de culto co-criada por Shigeru Miyamoto que existe toda a inspiração deste pequeno indie criado pela Ludosity. Não querendo repetir a discussão na mesma semana sobre o valor, ou não, da homenagem e da inspiração até ao ponto em que roça o plágio, a verdade é que Ittle Dew é uma verdadeira paródia à série de Legend of Zelda e aos seus personagens, em especial do protagonista, Link. Ittle Dew tornou-se daqueles casos em que as mecânicas de jogo são quase secundárias quando comparadas com a embalagem que as transporta e com as linhas narrativas que as tecem. Não sendo mais do que um jogo de aventura de puzzles de blocos, com pequenos twists de dungeon crawling à la Legend of Zelda com armas que vão permitindo resolver alguns desses mesmos puzzles, desde um ceptro de gelo e outro de teleporte e uma espada de fogo, elementos estes que tanto servem para o reduzido combate presente no jogo, assim como para a progressão na exploração dos mapas. Os puzzles em si são relativamente desafiantes, obrigando-nos a carregar uma série de vezes no botão “retry room” até conseguirmos resolver a configuração certa de blocos e obstáculos para abrir uma porta ou destrancar o acesso a um baú.
Mas a faceta em que Ittle Dew se distingue verdadeiramente é no nível brutal de humor que contém. Desde os diálogos cínicos da raposa que acompanha a personagem, aos desabafos desesperados de alguns inimigos com quem nos cruzamos, o jogo acaba por fazer-nos rir pelo simples foco que dá a alguns elementos típicos dos jogos que consideramos banais. Desde a vida monótona dos pobres monstros que povoam as dungeons, até ao bloco de pedra com asas que exclama, do alto da sua fobia, o medo aterrorizador que tem de alturas. A qualidade dos diálogos acaba por revelar uma auto-consciência de Ittle Dew de que é um videojogo, e a reflexão jocosa que faz de muitos standards dos RPGs e dos jogos de aventura. A inteligência do humor e a qualidade de muitas das piadas (algumas inclusivamente nonsensical) acabam por enfocar Ittle Dew como um objecto narrativo genial, que por acaso, e só por acaso, tem um jogo de aventura e puzzles acoplados. O que nos faz até sentir insuficiente a curta longevidade do jogo: em 4-5 horas terminamos um jogo que nos faz sorrir sempre que qualquer personagem interage connosco.
O melhor: o humor genial; o desafio de alguns puzzles; o exímio tratamento cartoon que o jogo demonstra.
O pior: a repetição que os puzzles conduzem; a curta duração do jogo.