30 anos de modas estranhas.

Era muito jovem quando consumia Wrestlemania, penso que durante a “New Generation” a torcer por determinadas estrelas, heróis deste desporto de entretenimento. Às vezes via muitos a correr por corredores até ouvir um arrastar de cadeiras, e juntavam-se grupos de amigos e colegas em filas para assistir à luta de Lex Lugor contra Yokozuna; gritava-se por Hulk Hogan para reverter o resultado quando já parecia ter perdido o combate. Era tudo ensaiado, e começou a perder alguma mágica no momento que se percebeu que aqueles golpes eram restituídos como em rodagens de filmes, e que a execução da caída ou das expressões dos lutadores eram exageradas. Mas Wrestlemania teve engenho ao juntar combate com personagens que dariam também para vender bonecos em separado; e criaram desde 1985 um culto com superstars, que se foram reciclando durante gerações, num grande espectáculo pirotécnico e muito ao estilo de trend americano.

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Papa. Século XXII

 

Vários confrontos marcaram a história, como Hulk Hogan versus Andre the Giant ou Razor Ramon versus Shawn Michael (que ninguém gostava muito, talvez pela cabeleira). Em WWE 2k14 percorrem-se 30 anos de Wrestlemania para reviver estes momentos, com recriações das arenas, dos fatos dos wrestlers, às marcantes entradas que demonstravam que estes lutadores eram e são também uma marca. Nestes combates temos objectivos secundários que vão ao encontro desse revivalismo com recompensas que vai desde filmagens, avatares ou outros wrestlers jogáveis.

Entre estes combates, são relembrados a partir de transmissões televisivas os acontecimentos de pré-combate, com toda a teatral ameaça de um lutador e o olhar de terror de outro perante as câmaras. Basta relembrar o episódio entre Hulk Hogan e The Giant para percebermos o quanto programadas estavam as relações, a narrativa, e os duelos. E mesmo que vejamos ser representado e ensaiado, podia haver alguma forma de confiar um pouco mais nestas representações se houvesse uma melhor apresentação dos personagens, mas estes são muito toscos e a própria abertura de entrada até ao ringue é sempre a mesma. Repetitiva e tosca, também, sem um acesso directo para iniciar o combate.

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– Onde compraste as ceroulas?
– Na Walmart, estavam em saldos.

 

Era muito jovem quando identificava-me com estas superstars, havendo momentos em pleno combate que “torcia” pelo favorito ao mesmo tempo que este estava no chão a levar uma série de sopapos ou pronto para um knockout. O favorito dificilmente saía a perder para agradar a pequenos fãs como eu, e WWE 2K14 molda-se nesse sentido. Criam-se grandes momentos como aquele em que Tatanka levantou Yokozuna no ar.

Mas pela jogabilidade, mesmo que a mobilidade dos personagens é fluida e realista, com movimentos vulgares e golpes especiais, requer acções rápidas ao clicar em determinados botões. Estas acções, ou esta mecânica de jogo, só agrada um leque de jogadores habituados a isso. Acontece durante o combate para reverter um ataque, sendo necessário conhecer à lupa cada movimento para conseguir naquele milésimo de segundo carregar a tempo. Com personagens de nível avançado, acaba por ser frustrante a passagem de acções que não se conseguem executar, e por consequência “levamos” a maior tareia de sempre. Nunca sabemos bem o que esperar, e não no bom sentido. Por outro lado, é recompensador quando conseguido e sermos nós a controlar o combate, mas esta recompensa pode não estar bem balanceada com o que não se consegue executar.

Os tipos de jogos/combates são variados, do típico um contra um ou dois contra dois, ao 6-man (6 na arena) e às especialidades: a gaiola, ringue em fogo, apanhar o cinto do título ou a mala de dinheiro. Nestes mesmos ringues podem utilizar-se uma panóplia de objectos que vão desde a cadeira às escadas de ferro, ou dos caixotes de lixo escondidos debaixo do palco às mesas com dobradiças. Tudo o que der para auferir mais dor ou garantir um KO, é bem-vindo. Ou para garantir um melhor espectáculo, porque é também disso que se trata, com relatos magníficos e várias vezes dirigido a cada personagem em específico. Personagens que parecem mais bonecos que lutadores reais, na verdade, e os que mais se safam são os que possuem uma máscara.

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Dói menos que parece.

 

No momento que estão mais de 2 lutadores no ringue não é permitido dar golpes num terceiro lutador e os sopapos são recebidos pelo vazio do ar. Excepto por golpes específicos em que são necessários dois para, por exemplo, levantar um no ar pelos dois braços lado a lado. Os braços não partem porque isto é só um faz-de-conta, claro. É como estar um lutador a dar uns sopapos na ponta do queixo a outro lutador e este virar a cabeça a quase 180 graus. Já toda a gente se perguntou porque não se vê uma gota de sangue em WWE? Ou porque fazem exageradas caretas?

Contudo, e como dito anteriormente, a movimentação dos personagens é fluida e de acordo com as regras de Wrestlemania. A sensação de desencadear dor é enorme e os golpes variam de lutador para lutador. Desde a época passada à actual temos uma vasta escolha (o roster) que permite dar longevidade ao jogo pelas diferentes técnicas de luta. E podemos criar a nossa própria personagem, escolher os golpes normais e especiais dessa personagem, o estilo de entrada, as arenas, até a história que nos levará por um campeonato.

A criação de personagem (ou superstar) confere imensas escolhas de fatos que vão do mais absurdo ao mais carismático, e as feições ao corpo são extremamente personalizadas. Com lutadoras e lutadores, temos mil e uma escolhas que podemos partilhar online ou fazer download de outros. Em relação à criação de campeonatos, é confuso e requer um grande entendimento em como organizar um campeonato. Muitas horas perdidas à volta disto não será suficiente para qualquer jogador conseguir organizar, e deixa de ser intuitivo no momento que apenas fãs de Wrestling conseguirão esquematizar um campeonato.

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– O gajo atrás de mim também tem cabeleira, não tem?
– Sim, sinto muito.

 

Após compreendermos como funciona este universo, aventurámo-nos em modo online. Neste modo, obtemos o nosso “perfil” que sobe por ranks à medida que competimos, sejamos vencedores ou não. Se em modo offline é difícil ajustarmo-nos pela mecânica de acções rápidas, em modo online é quase impossível competir em random match. Para isso temos um “Fair Fight” que procura oponentes à nossa altura. Divertido? Só quando o rank estiver bastante avançado.

E por falar em diversão, WWE 2K14 consegue ser assim em modo cooperativo (além da campanha 30 years of wrestlemania que confere 46 memoráveis e históricos combates). Num One-on-one ou Two-on-two acaba por ser quase um random de sorte, pela questão das acções rápidas para reverter um ataque do oponente. Mas como muitos outros jogos, e estando em comunicação, o modo cooperativo ganha relevância por haver os dois lados da moeda: cooperar e competir num mesmo jogo.

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E não me avisaste dos saldos?

 

O melhor: Modos cooperativo; relatos dos combates; personalização de superstar; modo “30 years of wrestlemania”.

O pior: Os bonecos; repetição de entradas no ringue; mecânica “temporizada”ao milésimo de segundo e incerta.

Fãs, antigos fãs vão querer reviver os acontecimentos memoráveis de 30 anos de wrestlemania, mas desta vez mais próximo a controlar as estrelas pelas próprias mãos. Não que sejam marionetas, são bonecos com expressões que não convencem e com animações imperfeitas, mas o combate está funcional e bem de acordo com este artifício americano. É um desporto de entretenimento, tal como o jogo deve ser considerado, mas poderá deixar de entreter e divertir no momento que os comandos pela mecânica de jogo se tornem inatingíveis.

 

Análise da versão Xbox 360. Também para PS3.