A lição do mestre

Seria pura demagogia não considerar o Mario como o personagem mais relevante dos jogos de plataformas, e em extremo da história dos videojogos. Desde a sua capacidade de substituir à erosão do tempo e à vulnerabilidade da sua própria evolução, foi conseguindo reinventar-se ao longo destes quase 30 anos de idade e alcançando, passo a passo, marcos de verdadeira viragem nos paradigmas de criação e de mercado dos videojogos. Esta solidez criativa é perceptível se hoje, passados 28 anos do lançamento de Super Mario Bros pegarmos no jogo e o tentarmos jogar: parece fresco como que acabado de sair do forno. E essa mesma sensação podemos sentir com o jogo de plataformas ao qual dediquei mais tempo da minha vida – Super Mario Bros 3 – prenda do Natal de 1991 e que me garantiu entre 8 a 9 meses de exploração e diversão ininterruptos.

Super Mario 3D World (SM3DW) é, acima de tudo, uma enorme prova de fogo para a Nintendo. As vendas da Wii U continuam a não estar acima das 5 milhões de unidades vendidas, e é pacífico dizer que apenas desde meados deste ano é que o catálogo da consola começa a demonstrar-se apetecível à maioria dos jogadores, sempre, à base dos IPs pertencentes à própria Nintendo. O segundo risco acrescido a SM3DW, para além da tarefa hercúlea de carregar às suas costas a tentativa de tornar a Wii U mais vendável neste final de ano, é o facto de que à excepção de Super Mario Bros U este é o primeiro grande lançamento da série Super Mario para a Wii U e que tem a responsabilidade de suceder ao aclamado Super Mario Galaxy 2.

Super Mario 3D World_1

Super Mario NBA Jam

 

Há algo de aparentemente genuíno à fórmula dos jogos de Super Mario Bros mas simultaneamente inovador a começar pelo aspecto “direito ao assunto” sem rodeios nem fait-divers com que se introduz a nós e nos coloca a controlar os quatro protagonistas (iniciais). Ao contrário da grande maioria dos jogos da série não é a mui-raptável (vivam os neologismos!) Peach a ser capturada por Bowser, mas sim a uma série de fadas simpáticas chamadas Anafadas. Aliás, Peach, a eterna Princesa do Reino Cogumelo, passa desta vez de vítima a integrante da equipa de resgate, ao lado de Mario, Luigi e Toad, equipa reminiscente do Super Mario Bros 2. Cada um dos personagens jogáveis tem características específicas, mas é possível passar todo o jogo com o mesmo personagem (no meu caso foi com a própria Peach que passei 15 horas de jogo e que derrotei o famigerado Bowser).

Senti uma certa nostalgia nos primeiros minutos de contacto com Super Mario 3D World, nostalgia esta que foi crescendo até ao final do jogo. A cada nível jogado pairava sobre mim uma sensação de revisita sem nunca lá ter estado, uma espécie de déjà vu infundamentado que me fazia sentir estranhamente em casa. E não o digo por o jogo parecer repetitivo com o que já foi feito, muito pelo contrário. Percebe-se é que as décadas de afinação da série confluíram para SM3DW, tornando-o tão fresco e actual como respeitoso pelo seu passado, e mais do que tudo, com a notória percepção de ter aprendido com cada patamar percorrido pelo Super Mario até 2013. SM3DW aproxima-se de nós como um guia turístico do melhor que foi feito em plataformas, trazendo novas ideias, e pela primeira vez, um jogo do Super Mario cooperativo em 3D. Colocando as devidas aspas na palavra “cooperativo”, porque dependendo dos jogadores o jogo em multijogador tornar-se-á mais “competitivo”. Porque se as possibilidades de entreajuda existem e estão definidas pelas mecânicas, também as ferramentas para prejudicar os nossos amigos e correr para o lugar cimeiro do pódio estão disponíveis. E é claro que esta competitividade é cimentada pelo próprio jogo: o jogador com melhor pontuação no nível é galardoado com uma coroa.

Super Mario 3D World_2

Bichano! Gatinho! Anda cá gatinho!

 

Outro elemento que vem abrilhantar este SM3DW são os novos power ups. O sino que nos veste uma fatiota de gato e nos confere os poderes deste animal, permite-nos escalar paredes, atacar inimigos com as “patas” e saltar, como um felino em ambiente selvagem, acabou por tornar-se a grande marca registada deste jogo. A cereja que duplica o nosso personagem e que nos acresce a dificuldade de controlar múltiplas cópias nossas pelas plataformas, e que se torna exponencialmente caótico quantos mais jogadores estiverem presentes.

SM3DW tem a forma de apresentação de Super Mario World da SNES: cada mundo funciona em “aberto” revelando novos níveis à medida que vamos avançando no jogo. A diversidade dos níveis é aquela que esperamos de um jogo de Super Mario: desde níveis no gelo até níveis no deserto, SM3DW é uma masterclass em level design, em que cada nível contem tantos atalhos e segredos (sendo os mais apetecíveis a informação da localização das estrelas verdes) que será normal o backtracking no jogo e a revisita a alguns níveis cujas estrelas estão ainda por capturar.

O que percebemos à medida que vamos explorando o jogo é que cada obstáculo, inimigo, moeda, bloco, plataforma, etc, foram meticulosamente estudados para que cada nível tenha a dose ideal de desafio/recompensa/originalidade. Desde os níveis on rails, em que cavalgamos uma simpática Plesiosaurus, até aos níveis em que defrontamos os filhos do Bowser que envolvem quase sempre comboios a alta velocidade, o jogo está estrategicamente desenhado para que sempre que lá regressamos consigamos encontrar moedas escondidas, uma estrela que nos falta ou um cromo para a nossa caderneta. Até os níveis de bosses têm muito mais, que beberam da experiência de Super Mario 64 do que dos jogos de plataforma bidimensionais como Super Mario Bros U. Não tendo a loucura e genialidade planetárias de Super Mario Galaxy, SM3DW é genial à sua própria maneira, e traz-nos a experiência mais próxima possível do que jogar aquele em modo cooperativo.

Mais do que tudo é um jogo para se ir jogando e descobrindo, cuja jogada “apressada” é desaconselhada pela experiência e “saboreio” que o próprio nos dá, mas também porque necessitamos de somas avultadas de estrelas verdes para ir desbloqueando os castelos de final de mundo, o que nos obriga a jogar cada nível com o máximo de atenção possível, e não apenas a corrida desenfreada pelo hastear da bandeira do final do percurso.

Super Mario 3D World_3

Senhor tem um minuto para falar dos nossos 4 Apóstolos, as TMNT?

 

Um tipo de nível bastante diferente e que nos traz uma componente de 3D puzzling (tão em voga nos jogos indies) são os níveis do Captain Toad, que é incapaz de saltar. Cabe-nos a nós, através da rotação espacial do próprio nível conseguir levar o Captain a capturar todas as estrelas verdes, sem ser atingido pelos inimigos e armadilhas presentes nos níveis. O resultado foi tão eficaz que já se cogita sobre a possibilidade de um spin-off com o Captain Toad como protagonista. E com o exemplo de qualidade dos níveis presentes neste SM3DW acreditamos que seja altamente plausível.

O melhor: a mestria apresentada no level design; a beleza do mundo que brilha em HD; o modo cooperativo; os novos power ups; os níveis do Captain Toad.

O pior: é um óptimo jogo para se jogar sozinho, mas  a verdadeira exímia é feita em multijogador.

Super Mario 3D World ainda não é a sequela a Super Mario Galaxy 2 que todos esperavam mas sabe demonstrar a sua maturidade, dotando de brutal competência cada momento da jogabilidade. É uma lição de mestre a todos os jogos de plataformas e soube aproveitar a experiência de Super Mario 3D land para se catapultar para o primeiro grande lançamento para a Wii U. A genialidade do jogo, a diversão que traz e a afinada dinâmica multijogador poderá trazer os holofotes para a tímida Wii U, que vê de longe a batalha entre PS4 e Xbox One. É sem dúvida O jogo obrigatório da Wii U e um dos obrigatórios para os fãs de plataformas e claro, do Super Mario.

Miau!

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Super Mario 3D World é um exclusivo Wii U