Ovo mexido, estrelado ou aborrecido?

Não sendo uma figura de proa da Nintendo, a realidade é que a nossa memória quase de imediato compartimenta Yoshi como a (usual) montada do Mario do que pensa nele como um protagonista. Muita da culpa desse nosso reflexo condicionado se deve ao reduzido número de lançamentos que a série Yoshi’s Island teve até hoje. Desde o seu surgimento em 1990 no aclamado Super Mario World, até à sua consagração enquanto protagonista em Super Mario World 2: Yoshi’s Island, pouco foi o aproveitamento da Nintendo na utilização do personagem, exceptuando o seu surgimento enquanto coadjuvante do Super Mario ou como parte integrante dos crossovers da companhia.

Super Mario World 2: Yoshi’s Island teve o condão (como apenas os grandes têm) de marcar os videojogos, inovar e manter a sua frescura e divertimento até aos dias de hoje. É daquelas situações em que a erosão do tempo e a evolução tecnológica parecem não surtir efeito de desgaste e mantêm actuais todas as mecânicas e processos de jogabilidade que compõem o jogo. SMW 2 é, metaforicamente falando, uma daquelas pessoas por quem o tempo parece não passar, que nos sugerem uma imutabilidade trazida por uma jovialidade interior e exterior. Para além de ter atribuído o protagonismo ao simpático dinossauro verde, criou também uma série de mecânicas que tornar-se-iam marcas registadas do personagem e que souberam trazer alguns pontos de inovação aos jogos de plataformas. Mas é claro que o grande ponto de demarcação de SMW 2 e que se tornaria a tónica corrente da série foi a instalação de uma estética próxima do imaginário infantil, quase desenhada/pintada à mão, e que soube tornar-se a identidade sólida do personagem e da sua série.

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És grande mas eu não tenho medo de ti!

 

Ainda que 18 anos se tenham passado desde o início da série, este Yoshi’s New Island parece uma mera continuação do jogo original. E essa parecença é evidenciada pelas piores razões possíveis. A inspiração em SMW 2 é simultaneamente um exemplo gigantesco de desinspiração, em que tudo neste New Island parece ficar a perder em comparação com os seus antecessores. São diversas as razões que nos obrigam a vê-lo como apenas um cumprir de calendário, e uma necessidade de produzir um jogo da série (tão mal-explorada) na nova plataforma portátil da Nintendo. Grande parte do level design sugere uma reciclagem exaustiva de uma série de boas ideias dos seus antecessores, mas notoriamente inferiores em qualidade e invenção. A diversidade de inimigos e a repetição (quando comparado com a restante série) com muitas das soluções apresentadas de disposição de plataformas e/ou obstáculos/puzzles a ultrapassar trazem-nos um dejá-vu agridoce, que primeiro nos agrada pela nostalgia mas que rapidamente azeda pela repetição.

Yoshi’s New Island num modo não-completionist é extremamente curto, ou talvez, apenas o aparente ser. O desafio apresentado é tão insípido que facilmente duvidamos das nossas capacidades sobre-humanas de ultrapassar jogos de plataformas ou se aparentemente a sua facilidade quase que nos permite ultrapassar o jogo em piloto-automático. Nenhuma mecânica foi recriada ou repensada, apenas fica a sensação de que tivemos anteriormente de ultrapassar desafios bem mais difíceis do que este. O que inclui os mini-bosses (no nível 4 de cada mundo) e os bosses de final de mundo, que apresentam uma dificuldade quase marginal.

É compreensível que Yoshi’s New Island esteja indicado para um público mais infantil, quer pela aproximação narrativa, e passando pelo visual e facilidade, mas é possível que a Nintendo tenha ido excessivamente longe nesta facilitação da dificuldade. O jogo apresenta um desafio APENAS para quem o quer terminar a 100%, e poucos são os níveis que nos farão perder mais de 3 ou 4 vidas das dezenas que vamos colectar ao longo do jogo. Mesmo o posicionamento de muitas das moedas, flores e estrelas que temos de capturar são de fácil alcance e necessitam de pouco ou nenhum raciocínio.

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Flores: a riqueza nutritiva da alimentação de qualquer Yoshi

 

Yoshi continua a flutuar ligeiramente para alcançar plataformas elevadas ou para saltar precipícios um pouco mais distantes, assim como continua a engolir os seus inimigos para os digerir em forma de ovos. Ovos estes, que qual imberbe no Carnaval, utiliza para arremessar aos seus inimigos ou a incautas nuvens possuidoras de segredos. A única inovação que verificamos é a sua capacidade de engolir inimigos de grande escala e criar Mega Ovos que destroem tudo, incluindo o cenário. Para além do regresso das transformações do Yoshi em veículos, desde helicópteros a submarinos, em pequenos minijogos controlados com o giroscópio da 3DS, pouco o jogo tem para trazer para abrilhantar a demanda do pequeno Yoshi em carregar o pequeno Bebé Mario no seu resgate do Bebé Luigi das garras do Bebé Bowser. E porque não há 3 sem 4: Bebé.

A quase invulnerabilidade de Yoshi, tão típica da série, vem acentuar a facilidade do jogo: como sempre, ao sermos atingidos por um inimigo temos 10 segundos para recuperar o pequeno Mario sob risco de perder uma vida. O que em estilo de repetição nos permite efectuar uma estratégia brute-force para ultrapassar algumas sequências do jogo. Ainda que cair no vazio, ou tocar na lava ou em picos signifique a morte imediata, poucos sãos os perigos no jogo que nos fazem ter uma postura relativamente preocupada ou reflectida a saltar de plataforma em plataforma, de inimigo em inimigo.

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Será que esta maça com picos é indigesta?

 

À medida que vamos avançando no jogo vamos desbloqueando alguns minijogos para 2 jogadores que são usualmente pequenas abordagens de quem tem a melhor pontuação na tarefa x, e que pode ser jogado através de download play, requerendo por isso apenas uma unidade do jogo para ser usufruída.

Mas entre tanta crítica há que salientar um grande ponto que Yoshi’s New Island tem: a sua beleza visual. As capacidades gráficas da 3DS convivem na perfeição com a estética pintada a óleo, lápis de cera e aguarela que a série respira, e que está aqui exacerbada. A vibração cromática e a coesão visual têm nesta plataforma a sua possibilidade tecnológica de brilhar verdadeiramente e de conseguir transmitir de forma mais inequívoca o ambiente de livro de ilustração infantil que os autores sempre quiseram imprimir a Yoshi’s Island.

O melhor: a qualidade gráfica; as mecânicas que ainda que repetidas, continuam bem-executadas.

O pior: a desinspiração; a repetição; a falta de novas ideias e a sensação negativa de déja vu.

A Nintendo falhou redondamente nesta tentativa de captar novos fãs para a série de Yoshi’s Island, enquanto tentou manter os seguidores de longa data. Há constantes lembranças em cada minuto deste New Island que nos remete para os seus antecessores que nos recorda que não só já percorremos estes caminhos, como eles nos parecem qualitativamente inferiores do que os caminhos já percorridos. Não é, nem nunca será um substituto dos seus antecessores, e dentro da sua curta duração aquilo que nos dá a certeza é da aparente imortalidade de Super Mario World 2, e do facto de que ainda hoje este é mais divertido de jogar do que este New Island.

Yoshi’s New Island é um exclusivo 3DS.