O regresso dos Micronautas

Após saltar uma geração, muitos dos fãs da série de Miyamoto ansiavam desesperadamente por uma nova iteração de um dos jogos mais inovadores e estranhamente desafiantes que a Nintendo lançou em muito tempo. Nove anos passados desde o seu antecessor, Pikmin 2, para a Gamecube, facilmente percebemos que a falta da sua presença em formato original na Wii tem uma, e apenas uma explicação: Pikmin 3 é o jogo da série que Miyamoto planeou para ela, mas que acabou por ser atrasada para ver o seu lançamento surgir no primeiro ano da Wii U. É inegável que o seu lançamento para a actual consola doméstica só vem reforçar um catálogo ainda magro de títulos de peso, e podemos já afirmar, antes de mergulhar em pormenor neste fantástico  e miniaturizado mundo que Pikmin 3 é sem qualquer dúvida um dos 4 melhores originais exclusivos da Wii U até à data (aos quais juntamos Super Mario 3D World, Mario Kart 8 e Wondeful 101). E sabemos também, que independentemente da sua qualidade, o facto de que este se trata de um jogo de nicho impediu-o de ter um peso providencial no aumento de vendas da consola.

Se há algo que não augura nada a favor da exploração espacial são os videojogos. Se o cinema e a televisão nos habituaram às catástrofes mais desesperantes (em que o “Gravity” do Alfonso Cuáron é um expoente de retirar o fôlego) também nos habituaram a perceber que se uma nave se faz ao espaço, também rapidamente pode ( e muito provavelmente irá) despenhar-se a todo gás em direcção ao planeta de órbita mais próxima. E é mais uma vez esse o mote do início de mais um jogo da série Pikmin, mas neste caso vemos 3 exploradores espaciais a despenharem-se num planeta tão semelhante à Terra que desmenti-lo é um exercício de imaginação. Ao contrário dos dois primeiros jogos da série em que jogamos com o Capitão Olimar, um astronauta Hocotate, neste terceiro jogo conhecemos Alph, Charlie e Brittany, 3 exploradores do planeta Koppai que se “fizeram” ao espaço em busca de comida. Caírem no planeta PNF-404 foi simultaneamente uma maldição e uma benção, visto que apesar de todos os riscos que correm nesta aventura, é também aqui que encontram fruta frondosa que os vai alimentando ao logo da jornada, e que poderá ser a única escapatória da fome que assola os seus conterrâneos.

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Ai querida, estás em chamas! Mas eu apago-te já esse fogo!

 

Para além da maravilha visual e conceptual que envolve a exploração de um planeta tão natural como os jardins do nosso bairro, mas em que o nosso ponto de vista é tão diminuto que até o mais pequeno insecto nos parece um Titã e em que tudo nos parece estranhamente familiar. E é claro que de nada serviriam os melhores esforços dos 3 astronautas não fosse a ajuda das simpáticas criaturas aos quais damos o nome de Pikmin.

À semelhança dos seus antecessores, Pikmin 3 é um jogo de estratégia em tempo real que não só apresenta mecânicas relativamente simples, como simultaneamente nos entrega uma série de puzzles difíceis que requerem não só uma gestão minuciosa dos pequenos Pikmin. Estas pequenas criaturas com ar fofo são extremamente frágeis: com um pequeno descuido podemos levá-las a morrerem afogadas, esmagadas, devoradas, electrocutadas, empaladas e numa série de formas terríveis de se morrer nada merecidas por estas plantinhas inteligentes que tanto nos ajudam. Se no primeiro jogo de Pikmin tínhamos apenas Olimar a liderar dezenas de Pikmin pelos ecossistemas do planeta em que se despenhou, e em Pikmin 2 a nossa gestão/resolução de puzzles passava pela utilização do Capitão e de Louie, em Pikmin 3 a Nintendo quis elevar a fasquia um pouco mais. Visto que a micro-gestão e a rentabilização do tempo são factores primordiais em Pikmin 3, temos aqui a possibilidade de controlar os 3 astronautas em separado e usá-los, sempre que possível, como forma de unir esforços e ultrapassar os obstáculos que nos são apresentados. É claro que toda a gestão tem que ser feita contra-relógio porque apenas nos é permitida a exploração do planeta durante o dia, como ao cair da noite temos de alimentar a nossa tripulação, o que significa que as “horas” do dia têm de ser passadas simultaneamente a procurar comida e a resolver os obstáculos que o planeta contém. Sendo que muitas das vezes esses obstáculos são batalhas com bosses gigantescos que não só põem à prova a nossa capacidade de gestão dos nossos Pikmin, como o nosso apurado sentido de decisões instantâneas. Estas batalhas (quiçá graças ao nosso tamanho diminuto) são do mais cinematográfico e épico que podemos encontrar e que surpreende qualquer jogador que desconheça a série.

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Metal Gear Pikmin: é só esperarmos e atacamos por trás e à bruta!

 

Por não ter possuído uma Gamecube, Pikmin 1 e 2 acabaram por ser daqueles jogos que estavam na minha lista obrigatória para jogar mas que infelizmente nunca o foram. E tudo o que conhecia da série dava-me vontade de a experimentar, mas simultaneamente imputaram-me um receio de pegar neste Pikmin 3 sem conhecer os seus antecessores. Rapidamente o jogo conseguiu apagar-me esses medos e fazer-me sentir naturalmente “em casa” com as mecânicas dos pequenos Pikmin, desde comandá-los pelo terreno, como ir conhecendo as habilidades inatas de cada um dos 5 tipos diferentes que dispomos no modo de história. O que senti porém, é que a pressão inicial de encontrar comida me obrigou a focar-me tanto nesse objectivo que acabei por ter uma reserva considerável. E visto que a obtenção das frutas envolvia sempre resolver puzzles com tipos diferentes de Pikmin e de utilizar todos os nossos astronautas, acabei por preferir jogar o jogo com alguma calma, e tentar resolver todos os “enigmas” que os ecossistemas tinham. É que apesar do jogo possuir apenas 5 zonas distintas, tanto o contra-relógio que temos como o exímio level design permitem-nos saborear o jogo durante diversas horas até que sintamos vontade em prosseguir os objectivos do modo de história.

Numa fase em que possivelmente já experimentei todos os (grandes) jogos disponíveis para a Wii U, e ainda que Pikmin 3 tenha sido lançado no ano passado, parece-me que o fascínio visual que o jogo me traz é simplesmente de tirar o fôlego. O ínfimo detalhe que o ambiente altamente descritivo tem acaba por definir cenários tão verosímeis que enquanto jogamos nos sentimos realmente no mundo fantástico de Pikmin, a explorar um planeta inóspito e a desenterrar memórias de uma civilização perdida, como telemóveis e telefones.

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Hey Pikmanuel, vai para ali!

 

O único ponto negativo que o jogo possui é a falta de qualidade do sistema de “lock on” em que muitas vezes nos vemos a apontar os nossos Pikmin ao ponto errado. E isto vai-se percebendo que a utilização do Game Pad foi relativamente superficial, e que os seus analógicos pouco ou nada auxiliam estas mecânicas.

O melhor: o desafio, o ambiente, o visual, o mundo e as criaturas que o habitam, a genialidade de level, game e concept design.

O pior: o fraco controlo de lock on do Game Pad.

Pikmin 3 é um jogo de nicho. E termos percepção desse factor elimina-nos logo algumas questões, algumas delas que se prendem com o reconhecimento da série e do jogo para o público comum. Mas a realidade é que o jogo não só é de uma excelência de difícil alcance, como se assume como uma peculiaridade tão própria, tão inocente, tão criativa e tão reveladora de genialidade que é difícil de ficar indiferente. Pikmin 3 é uma luta caricata contra o tempo, contra o desespero, contra um ecossistema que nos quer matar, contra a fome e contra os nossos instintos, reflexos e capacidade de gestão e multitasking. E depois dos créditos o que apetece? Não apenas convidar um amigo para uma Bingo Battle ou resolver todos os challenges que esse modo apresenta. Mas também apetece rejogá-lo desde o início com a maturidade e a experiência que já trazemos de o ter terminado e testar a nossa eficácia ao máximo. Porque no final de contas sabemos que Pikmin 3 nos vai marcar para sempre.

Pikmin 3 é um exclusivo Wii U.