Um Pokemon Master veterano, alguns analistas e um gamer acidental vão à Gamescom. A frase poderia servir de introdução a uma anedota do tipo “um alemão, um francês e um americano entram num bar”, no entanto, neste caso, não se está a introduzir qualquer chalaça. Esta foi a primeira expressão que me veio à cabeça quando cheguei a Colónia, cidade anfitriã daquela que é talvez a maior convenção/feira de vídeo jogos aberta ao público, realizada em solo europeu. Para que não restem dúvidas identifico-me com o gamer acidental, epíteto que creio é autoexplicativo, advindo sobretudo da consciência crescente de que face àqueles que acompanhei, apesar da paridade nas idades, cheguei a este meio tarde, por vias travessas e sobretudo que percebo tanto disto como do melhor modo de preparar codornizes para a bucha, ou algo semelhante. Eu nunca joguei nenhum FIFA (insira aqui o ano), Super Mario só nas consolas dos marroquinos que já traziam pistolas e tudo e custavam menos de três contos e quinhentos…Contudo, apesar da tardia e acidental entrada neste universo, partilho do entusiasmo que esta cultura tem a capacidade de gerar nos seus adeptos.

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Na minha primeira experiência Gamescom – no meu dia Gamescom – entrei como trade visitor. Isto aconteceu apenas porque não fui a tempo de conseguir bilhetes normais (surpreendentemente baratos, por sinal), apesar de os ter tentado adquirir relativamente cedo. De certa forma deveria estar grato, pois assim evitei as intermináveis filas à entrada. Dos apertos não me safei, mas a vida tem dessas coisas. De um ponto de vista meramente utilitarista, há alguns aspectos prácticos do certame (como fazer o público fluir e chegar do ponto A ao ponto B, sem que para isso se tranque meio corredor e afunile a multidão) que convém, na minha opinião, apurar. Afinal a Gamescom é um evento para o público, para os jogadores/consumidores que, como eu, mais ou menos cultivados no tema, queriam estar perto da acção e ver o que de novo se vai fazendo neste universo. Creio que a adesão que a feira habitualmente regista se deve em grande parte ao diálogo sinérgico entre os jogadores que produzem os jogos e os jogadores que os consomem; os que criam e contam histórias e aqueles que as descobrem e experimentam como novidade. Uma das experiências mais interessantes para mim foi num pequeno stand ter a hipótese de poder jogar algo com um dos criadores a explicar o sistema e a lógica a que este obedecia. O sentimento de proximidade é fascinante.

Poderia supor-se que aquilo que um fã de jogos de vídeo tem de mais próximo da noção de “Paraíso na Terra”, logo após um gaming PC topo de gama com dispensador de snacks e cafeína solvente em pó ou em cápsulas, seguido de perto pela capacidade de fazer a mãe compreender que não se consegue pausar jogos online (convenhamos que se ela percebesse o conceito de online, já não era mau), seria uma feira completamente dedicada a videojogos na qual há sempre a chance, ainda que remota de se cruzar com um dos nossos ídolos, sobretudo onde a esmagadora maioria dos participantes partilha de uma gramática comum, por outras palavras, fala a mesma língua: estando todos imbuídos de uma onírica predisposição à mútua empatia e às narrativas épicas dos feitos realizados em formato digital, acompanhadas por uma pint de bebida energética. Local onde todos sabem que o LoL não se pode pôr em pausa. No entanto, partindo da minha experiência, tal como em todos os eventos em que existe um espírito de multidão, o conceito consegue ser pervertidamente macabro, sobretudo porque contrafeito, vi-me forçado a admitir que de todos os estereótipos (sim, estes que tenho vindo a usar apenas para marcar a minha posição) que a todo o custo tento fazer desaparecer ou pelo menos desacreditar naqueles que no meu círculo de amigos não compreendem a minha paixão pelos jogos, não houve um único que neste evento em concreto não proliferasse ou se encontrasse elevado à décima potência. De facto, uma das minhas penas de jovem adulto é a má reputação com que os jogadores são a priori etiquetados em alguns círculos. Em muitos casos, basta que alguém refira o seu gosto pelos jogos que imediatamente chovam trejeitadas questões que não são mais que críticas, censuras e reprovação disfarçadas.

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Acredito piamente que os jogos e a comunidade de jogadores precisam de boa publicidade, sendo que as instituições organizadoras de eventos como a Gamescom têm por um lado os meios e, por outro o dever de promover uma boa imagem que não é um falso fruto de um exercício de relações públicas, sem com isto danificar a sua componente comercial. Real e verdadeira, a faceta positiva e construtiva dos jogos é, não raras vezes, eclipsada por simples e mal informada má publicidade. Uma multidão será sempre uma multidão, um animal que persegue fogos fátuos, no entanto não deixa de ser um sinal animador perceber que a par dos aglomerados de gente junto aos spots dos blockbusters juvenis, houve também um bom número de Pokémon Masters veteranos, alguns analistas e uns quantos gamers acidentais que foram espreitar os filhos dos deuses menores e saíram do evento mais rico por isso.

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Recomendo vivamente a Gamescom, quanto mais não seja pela experiência social que proporciona e, pela proximidade que nos coloca no limiar dos mundos que conhecemos quase tão bem com o tangível. Se insistem em saber como termina a laracha: o alemão perde a cabeça, o francês rende-se e o americano divide Berlim ao meio com a ajuda dos russos. Todos eles jogam World of Tanks.