Análise a Alien: Isolation.

Um dia andava pelas ruas de Moscavide em Lisboa, e vi uma ratazana do tamanho de um pé número 42, sem contar com o rabo. A minha perplexidade e estagnação foi tanta como quando em Alien: Isolation a primeira música tensa alterou lentamente em crescendo, cada vez mais aflitiva e tenebrosa, alertando para uma ameaça cada vez mais próxima. E quando a calma voltou à terra, BAM!, o primeiro contacto directo com o Alien (xenomorph) fez-me preferir ter aquela ratazana enorme a subir-me pelas pernas acima. As técnicas básicas de filmes de terror descortinaram-se naquele momento em grande estilo e só estava no início da exploração da estação espacial Sevastopol. Se há momentos marcantes nos videojogos, são aqueles que prevalecem na memória pelas sensações que nos causam, mesmo que seja por breves instantes, ou pelos sentimentos que reforçam, e Alien: Isolation foi capaz de causar algum impacto para que não se possa esquecer facilmente.

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Alien: Isolation faz parte da franquia Alien e desenvolve-se entre os eventos da obra-prima de Ridley Scott e Aliens de 1986. Entramos na pele de Amanda, filha de Ellen Ripley, que é transferida para Sevastopol com o intuito de encontrar a caixa negra da nave Nostromo e obter uma resposta sobre o desaparecimento da mãe passados 15 anos. Várias são as referências ao original de 1979, havendo mesmo relatos sobre os acontecimentos que tiveram lugar no primeiro filme da série, mas sempre com um toque misterioso. Antes de entrar no mundo de Alien: Isolation, fui recordar o que filmaram nos finais anos 70 para conseguir absorver melhor a sequência deste novo jogo da Sega. E alerta-se desde já que a riqueza do jogo em consonância com o filme não se encontra se tiverem pressa em acabá-lo. São os detalhes que fazem de Alien: Isolation não a mesma obra-prima de 1979, mas um cinemático jogável que vos desencadeará emoções e vos trará recordações. Ficar a olhar para o espaço durante dois ou três minutos e esquecer que um xenomorph nos persegue é a pausa que muitos acham não estar presente. Mas está lá. E é do mais belo que possam imaginar.

A ambiência da estação espacial Sevastopol à qual atracamos é suspeitosa. Os seus residentes que ainda sobrevivem e foram colocados em quarentena agem com hostilidade, juntamente com andróides sem controlo que deixaram de servir os seus superiores. Só os mais fortes e os mais cautelosos conseguiram continuar a respirar o ar que circula entre os corredores e as condutas de uma labiríntica arquitectura metalizada e tecnológica, de um futuro fictício com elementos do passado. Sevastopol era outrora uma gigantesca estação com recursos para investigação e exploração do universo, um centro de comércio espacial, entretanto descontinuado de financiamento e com projectos de ética duvidosa. Estes vão sendo desvendados à medida que progredimos e exploramos de área em área e voltando a pontos iniciais para abrir portas anteriormente inacessíveis. Há uma mistura de passagens e salas claustrofóbicas com algumas fogosas miragens de uma talentosa direcção de arte e com notáveis ambientes sonoros, garantindo a ambiência certa que se requer de um survival horror stealth, e principalmente de um Sci-Fi em concordância com a série que neste caso procura encostar-se mais para o lado da concepção de Scott.

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Há momentos de cortar a respiração e não é só quando somos perseguidos pelo impetuoso xenomorph que aparece e desaparece pelas condutas com aberturas no tecto. Um Alien com uma inteligência artificial convincente, mas não perfeita se à partida soubermos que é um organismo com todos os sentidos extremamente apurados. Um Alien que está sempre em movimento e reage de acordo com ruídos que possamos fazer, mas acabamos sempre por antecipar o seu local de aparição após morrermos por tentativa e erro. Portanto, a atmosfera e ambientes sonoros seriam suficientes para criar a tensão desejada sem a constante e previsível presença (mas nem sempre) de um ser tão maléfico quanto majestoso, e estarmos a maior parte do tempo a explorar Sevastopol com a garantia que estamos a ser caçados a todo o momento, é manter-nos preparados para eventuais situações e isso suprime a sensação de medo. Se eu alertar alguém “olha, vou assustar-te. Buh!”, é evidente que a possibilidade em conseguir alguma reacção é nula. O mais certo é que nos olhem fixamente e nos chamem idiota. No entanto, a criatura impõe um enorme respeito pela ameaça que representa quando avistada ou quando sabemos que , através de um detector de vida e pelos barulhos que transmite pelas condutas, se encontra próxima. E quando nos passa ao lado, é quando a respiração entra em standby e o olhar petrifica. E quando vira ligeiramente o pescoço e se fixa na nossa direcção, está na hora de mudar a cuequinha, mas deixemo-nos estar assim por enquanto para não sujar outra.

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O Alien (ou seremos nós o Alien?), não é o único perigo a bordo de Sevastopol. Os andróides de força sobre-humana viram-se contra a população e a forma como se aproximam lentamente com palavras apaziguadoras e simpáticas, de olhos brilhantes e sem expressão, dá algum calafrio na espinha. Se acharmos que o Alien deveria encontrar outro hobby que não só caçar, pelo contrário os andróides intervêm numa melhor sucessão juntamente com alguma população mais hostil. Ou podem ser amigáveis, apenas a tentar sobreviver? Poderemos nunca saber ao certo. Com aqueles que interagimos e estabelecemos uma relação, que nos ajudam a escapar da nave e a matar o xenomorph, nunca chegam a tecer uma conexão realmente próxima porque acabam por ser todos transitórios.

Tal como Ellen, a sua filha Amanda é também uma sobrevivente e usa esquemáticos espalhados pela estação espacial. Ao construir determinadas engenhocas vai ajudá-la a prolongar a sua vida porque só as armas de fogo e a escassa munição não são suficientes. Granadas variadas, fazedores de ruído, molotovs, entre outros, são fabricados através de variados componentes que recolhemos até um determinado número limite, o que pode exigir escolher bem que material fabricar com o tipo de componentes que se possui. Por exemplo, criar um molotov poderá precisar de partes necessárias para também criar um medikit, e é isso que devemos gerir.

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Alien: Isolation estende-se por longas horas, mas algumas partes são monótonas e sem grandes surpresas. Contudo, inclui bons detalhes através da exploração e esta monotonia poderá ser um instrumento para alongar a invariabilidade de sensações do jogador, mas sempre com alguma carga de tensão, para depois quando menos contarmos contrastar de ambiente ou salientar um acontecimento. Isso é um pouco o que o filme de Ridley Scott pretende. Mas quando achamos que estamos perto de escapar, lá acontece um problema no outro lado da estação. Quando pensamos que estamos prestes a eliminar a ameaça Alien, lá encontramos um ninho de facehuggers. E quando pensamos que na segunda ou na terceira volta é que é de vez, mais problemas ocorrem. Podemos achar que a frequência com que nos deparamos com este vai-não-vai é um pouco exagerada, mas Alien: Isolation consegue sempre manter-se com uma curva de acontecimentos e detalhes que não o deixam esmorecer com uma narrativa simples enriquecida pelos acontecimentos passados sinistros.

O melhor: Ambiência visual e sonora; o xenomorph; a constante tensão e a capacidade de amedrontar.

O pior: Momentos de tentativa e erro com elementos previsíveis. Alguns bugs.

Este é capaz de ser o jogo Alien que todos aguardavam. Mesmo apresentando algumas imperfeições, Alien: Isolation sobe para um nível muito acima de antecessores com o mesmo tema. O xenomorph teve o tratamento que não se via há algum tempo, juntamente com os sinistros andróides, para horripilar o mais céptico, mas seria mais apropriado se fosse ainda mais imprevisível. O design de som e a direcção artística é de apreciar como se fosse um aprimorado filme interactivo de Ridley Scott e quase (só quase) a roçar a sua genialidade.

Versão testada: PS4. Também disponível para PS3, Xbox 360, Xbox One e PC.