Um Gomu Gomu no Chicken confessamente parcial a Tears to Tiara II: Heir of the Overlord

Confesso que sou um fã ávido de RPGs, JRPGs e SRPGs em geral. Confesso que sou um frequente consumidor de visual novels, light novels, graphic novels, manga e anime. Confesso que gosto de fantasia, ficção científica e também de história. O que é que fazemos, pergunto ao leitor, quando nos surge um jogo que combina um pouco de tudo isto e o executa com qualidade? Se respondeu “saltar de alegria” está correcto. Se respondeu “fazer chichi nas calças de felicidade” também está correcto. Se respondeu “sair para a rua a pedir a absolvição de José Sócrates” peço-lhe para ter calma – o jogo é bom, mas não tanto.

Tears to Tiara II: Heir of the Overlord é o jogo mais recente da Aquaplus, lançado pela Atlus e pela NISA no ocidente. É um híbrido, meio visual novel, meio JRPG de estratégia, passado num mundo de fantasia com uma inspiração histórica que rodeia a Europa no séc. III a.C. e as Guerras Púnicas – o personagem principal chama-se Hamilcar Barca, filho de Hasdrubal Barca, antigo líder da nação de Hispania, que no início da história permanece sob conquista do Império Divino, cuja nação fica inconspicuamente na mesma zona que Roma antiga, e cujos soldados tem armaduras que muito se assemelham à de centuriões. Os fãs de história menos puritanos deverão apreciar estas referências e divertir-se-ão a identificar as incongruências históricas.

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I can imagine my house from here!

 

Quando a história começa a Hispania está sob o controlo do Império Divino, que a havia conquistado passados sete anos quando conseguiu invadir a região e derrotar o seu líder Hasdrubal Barca, obrigando a população a renunciar aos seus deuses e impondo impostos pesados sob a região. O seu filho Hamilcar Barca (Yoshitsugu Matsuoka – Kirito, de Sword Art Online – é quem lhe dá a voz) conseguiu ser poupado à chacina da sua família fingindo ser estúpido e retardado. Assumindo que não era ameaça para o império e que tinha mais valor vivo para servir como exemplo desmoralizante de “vejam, isto é o que resta da Casa de Barca”, Hamil (diminutivo de Hamilcar) é forçado a executar trabalhos pesados numa pedreira e a levar as ocasionais chicotadas por fazer asneiras que reforçam a ideia de que ele é um simples idiota – fachada que ele se esforça por manter para não alimentar a ideia que uma revolta é possível, acreditando que assim está a poupar vidas inocentes que se poderiam perder com uma nova guerra. Hamil está consciente que existe uma facção de soldados sobreviventes da Casa de Barca que ainda lhe é cegamente leal e espera a qualquer momento pelo seu aval para começar uma revolução. Tudo muda quando surge uma rapariga que se diz chamar Tarte (cuja voz é dada por Rie Kugimiya – Aisaka Taiga, de Toradora! ou Shana, de Shakugan no Shana) que lhe diz ser a encarnação humana da deusa Astarte que desceu à Terra para voltar a restaurar a fé dos humanos. Este encontro vai despoletar uma série de eventos que vão dar ao início de uma longa campanha para voltar a obter a independência de Hispania e possivelmente algo mais.

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Uh-oh… Agora é que temos o caldo entornado!

 

“Longa” é palavra de ordem – se procurarem fazer tudo o que Tears to Tiara II tem para oferecer, o tempo de jogo pode facilmente ultrapassar as 80 horas. Avisa-se desde já que uma maior parte do jogo é mais visual novel que JRPG de estratégia, por isso muito tempo é passado a desenvolver a história e os personagens, mais do que a combater – o que é mesmo a minha praia e é a razão pela qual referi no princípio que isto é uma crítica parcial (não são todas?). Acredito que muitos poderão não gostar do quão longos são os segmentos de visual novel ou das conversas frequentes que quebram o ritmo entre batalhas para dar desenvolvimento ao enredo. A história do jogo é interessante e bem escrita, reforçada por um elenco de luxo a dar a voz aos personagens. Ela apenas peca por não podermos salvar enquanto uma sequência de conversa no formato visual novel não terminar, e elas podem ser muito longas.

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Acho que ele não gosta do extreme make-over que fizemos ao templo.

 

A mecânica de combate é fácil de aprender e relativamante complexa de dominar, sendo muito semelhante a outros JRPGs de estratégia, como Disgaea ou Fire Emblem (sem o temido permadeath, graças à deusa). As batalhas desenrolam-se por turnos, onde vamos movendo e posicionando personagens num campo de batalha quadriculado à vez com o adversário. As personagens estão alinhadas com elementos que podem ser fortes e fracos contra outros (água derrota fogo, fogo derrota vento, vento derrota terra, terra derrota água) e outras estão alinhadas com poderes divinos que funcionam da mesma forma (escuridão derrota sagrado, sagrado derrota astral, astral derrota escuridão) – para além disto há um círculo no canto inferior esquerdo do ecrã que muda todos os turnos e cujo elemento e poder que está no topo tem um bónus aos seus atributos naquele turno, obrigando-nos a planear com cuidado quando se deve agir. E mesmo se um turno ou a batalha não esteja a correr bem, existe uma opção de “Rewind” em que podemos voltar atrás um certo número de turnos e tentar algo diferente (se tentarmos fazer exactamente o mesmo, os resultados vão ser exactamente os mesmos – recuar no tempo para voltar a fazer aquele ataque na esperança dos dados rolem a nosso favor não vai acontecer) – esta é mesmo a ferramenta mais útil deste sistema de combate, algo que se torna notório nos confrontos mais difíceis da segunda metade do jogo.

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Stwike him, centuwion! Vewy woughwy!

 

É possível modificar a dificuldade do jogo, mesmo a meio do combate, se acharem que está a ser demasiado difícil – o que poderá satisfazer quem joga para ter um maior desafio ou quem joga apenas para apreciar a história. Em cada combate o jogo oferece alguns objectivos de bónus (que nos recompensam itens raros ou outros, se os conseguirmos cumprir), como derrotar esta ou aquela personagem quando o objectivo é fugir, por exemplo – tentei isso num dos primeiros combates contra uma personagem que tinha atributos vastamente superiores aos meus e, mesmo mudando para modo “fácil”, derrotou o meu personagem principal só com um ataque – é claramente só possível derrotar aquela personagem naquela altura com uma boa dose de grinding (desafio que alguns jogadores mais “hardcore” poderão apreciar). O jogo tem uma sólida curva de aprendizagem e os combates do meio para o fim da história são notoriamente mais desafiantes, mas tão mais satisfatórios quando obtemos aquela vitória com o objectivo de bónus cumprido.

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Ah, a famosa batalha de Ibiza. Eramos nós contra javalis, crustáceos e cefalópodes. Foi a vitória mais saborosa que tivemos.

O melhor: A narrativa bem escrita e o excelente character development. O voice-acting de qualidade com um elenco forte por detrás. O combate sólido e divertido. Bom artwork no segmento visual novel.

O pior: Gráficos 3D são um pouco datados. Não se poder salvar a qualquer momento no segmento visual novel não faz sentido. Alguns poderão não gostar da história particularmente longa que sempre a quebrar o ritmo de acção.

Tears to Tiara II é uma visual novel disfarçada de JRPG de estratégia e é um JRPG de estratégia disfarçado de visual novel. Os dois géneros não são tão díspares que se possa dizer que o jogo está a tentar agradar a romanos e cartagineses e, diga-se com honestidade, os dois géneros em que o jogo se insere estão bem executados. Não haver a possibilidade de salvar sempre que quisesse durante os segmentos de visual novel são, na minha perspectiva, o único ponto negativo a apontar que realmente me irritou pessoalmente. Recomendo este jogo aos amantes dos dois géneros ou a amantes de um dos géneros que tenham uma mente aberta. Se estão à procura de jogar um JRPG de estratégia puro e duro, então este jogo pode não ser o mais indicado.

Tears to Tiara II: Heir of the Overlord é um exclusivo PS3.

PS: Se estiverem a pensar, “o que é feito do primeiro jogo da série Tears to Tiara?” Bem, ele nunca saiu em inglês oficialmente, creio que principalmente devido a ter conteúdo adulto. Talvez consigam encontrar uma “fan translation” por aí, mas podem alternativemente procurar o anime que saiu em 2009 (sem conteúdo adulto) que conta a história do primeiro jogo. Não necessitam de o fazer, até porque as histórias dos dois jogos não estão directamente interligadas, mas achei por bem referir este pedaço de trivia.

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A religião de antigamente é que era. Podiamos receber abraços abençoados de Deusas voluptuosas e com pouca roupa. Já não se fazem religiões como antigamente…