Antes de mais, permitam-me clarificar algo: eu posso ter ou posso não ter um problema com early accesses. Compreendo os motivos que levam uma companhia a optar por este modelo de publicação, reconheço as vantagens que o feedback dos utilizadores e que os seus fundos podem porventura trazer ao processo de desenvolvimento mas, não é, de longe, o modelo que mais aprecio.
Alexandre Dumas (pai), no romance de aventura Vinte Anos Depois, segundo livro da Saga d’Artagnan, intitulou o capítulo 43 de “In which it is proved that first Impulses are oftentimes the best.” – na altura, 1845, os autores, não tinham escrúpulos em utilizar títulos muito descritivos e aforísticos que quase previnem a leitura do que se segue. Depois de terem clicado em algo que dizia “Antevisão a Deathtrap”, compreendo que este exemplo de faits divers literário despertará certamente um sentimento de estranheza. Não temam. O nome deste artigo não foi uma cilada, guardem os memes do Almirante Ackbar para mais tarde, ou quando estiverem a cilindrar monstros com as mais insidiosas armadilhas. No entanto, este título de Dumas foi a primeira coisa que me veio à cabeça, na segunda vez em que joguei Deathtrap, novo título da Neocore (The Incredible Adventures of Van Helsing, King Arthur e The Kings’ Crusade) actualmente disponível em early access no Steam.
Deathtrap é um tower defense, em ambiente que mistura o fantástico e o steampunk, ao melhor estilo penny dreadful, com elevada concentração de elementos RPG (evolução do personagem com personalização das suas especificações, produção e itens…), herdeiro do universo e das instâncias de tower defense de The Incredible Adventures of Van Helsing que tão boa impressão nos causaram. O conceito base é simples, típico deste tipo de títulos, o herói deve prevenir que os monstros que habitam o plano Ink penetrem no plano dos humanos. Para tal, pode armadilhar os acessos aos portais com vários tipos de instalações que vão desde os habituais e sempre fiáveis espigões metálicos (recordam-me sempre do Prince of Persia original), até chamas, eletricidade, veneno, balas e mesmo outros monstros e lutar com as suas próprias habilidades. Eliminar hordas de inimigos e os seus bosses faz com que o herói receba experiência e essência. A experiência fá-lo subir de nível desbloqueando poderes, habilidades e upgrades, a essência permite que, em jogo, construa e melhore armadilhas.
Confesso que a primeira vez que experimentei Deathtrap em modo de campanha fiquei decepcionado, não pela qualidade do jogo em si, mas porque não pude deixar de compará-lo com as experiências de tower defense de Van Helsing, que tenho bem frescas na memória. Temi que, como stand alone, o formato não funcionasse. Pensando no adágio de Dumas, o meu primeiro impulso não foi positivo. O motivo desta decepção prende-se simplesmente com a única classe de herói que podíamos usar na altura, a Sorceress – “eu posso ter ou eu posso não ter um problema com early accesses”, lembram-se? Em Van Helsing, lutávamos com um herói que nós construímos desde o primeiro momento, ver-me forçado a jogar com uma classe com a qual não me identifico, simplesmente, fez com que não conseguisse apreciar este título como deveria. O problema de não ter todo o conteúdo de um jogo disponível quando o recebemos é precisamente este, podemos ficar decepcionados com o produto inacabado em que temos, muitas vezes que colocar a nossa esperança em conteúdo que “há-de vir”. Por sorte, voltei ao jogo antes de me dedicar a escrever e a classe Mercenary já estava disponível, o que tornou o jogo muito mais apelativo para mim e, creio, para todos aqueles que, como eu, não têm paciência para cooldowns. Aguardo agora pela disponibilização da classe Marksman.
A par do modo de campanha estão disponíveis o modo cooperativo e o modo pvp. No modo cooperativo podem colaborar até quatro jogadores, sendo que a dificuldade do mapa aumenta proporcionalmente ao número de jogadores. Consigo imaginar que esta opção fará sucesso entre grupo de amigos. É possível alternar entre singleplayer, cooperativo e pvp a qualquer momento, pois os personagens e a sua evolução são persistentes. No modo pvp o jogador pode escolher ser o defensor ou o atacante. A função de defensor não difere daquele do modo de campanha, em contrapartida, a função de atacante proporciona a possibilidade de controlar a horda de monstros e causar terror nos adversários.
No geral, apesar do meu, mal informado e decepcionado, primeiro impulso, creio que Deathtrap terá potencial para cativar, não só os fãs da saga The Incredible Adventures of Van Helsing, talvez o seu público primário, mas também os adeptos de tower defenses em geral, sobretudo quando à sua componente multijogador aliamos a capacidade de criar novos mapas de descarrega-los através do workshop do Steam.