É possível que as gerações mais novas imaginem que Dark Souls é o pináculo, ou a demarcação de uma nova tendência: a dificuldade extrema enquanto espinha dorsal de um jogo. Mas quem afirma isto está parcialmente certo (ou parcialmente errado) e esquece-se que a mui-simpática, e mui family friendly Nintendo definiu no final dos anos 1980 e início dos 1990 algo que ficou até hoje chamado de Nintendo Hard. Eu, enquanto criança que viveu a afirmação da sua paixão pelos videojogos nessa fase, fui uma das vítimas dessa dificuldade extrema, e ainda hoje possuo cartuchos de jogos que nunca consegui terminar. Morrer, tentar, morrer, recomeçar o jogo, tentar, morrer, tentar, num círculo quase infinito que preenchia as minhas horas vagas e as minhas férias escolares.
Castle in the Darkness é mais um excelente jogo a beber desta influência dos jogos que nos matam vezes incontáveis e que parecem ter uma sanguinária psicopatia na sua programação. Este e muitos jogos que eu apelido carinhosamente de neo-Nintendo Hard (adoro criar neologismos) são filhos de jogadores que como eu aprenderam a conviver coma frustração de morrer tantas vezes que o próprio acto de jogar se assemelha a masoquismo, e que investem nas suas criações o desafio quasi-masoquista de outros tempos. Da época em que a dificuldade era a justificação para o entretenimento para jogos, que por razões financeiras tinham de durar meses nas nossas mãos.
Vindo da mente de Matt Kap, que trabalhou noutros dois marcos de jogos retro-dificílimos lançados pela Nicalis: 1001 Spikes e Binding of Isaac: Rebirth, Castle in the Darkness é um metroidvania que nos assusta pelo contador de número de mortes que possui. E assuta-nos porque pela primeira vez em que o vemos percebemos que esse contador tem seis dígitos. O que amedronta qualquer jogador, e muito. E como bom metroidvania que é, com notória inspiração em Castlevania II: Simon’s Quest vamos perder-nos quase tantas vezes quantas as vezes em que vamos morrer.
Exagero meu, vamos morrer muitas, mas muitas mais vezes.
Um jogo desafiante (contando com as com um simpático preço, e que nos traz a estética a ambiência visual e sonora, e acima de tudo a dificuldade dos jogos que jogávamos no auge do brilhantismo dos 8 bits, no tempo em que parecíamos super-humanos que conseguiam derrotar (quase) todos os jogos que tivessem a audácia de se cruzar connosco. Castle in the Darkness consegue evidenciar-se num mercado cheio de neo-metroidvanias retro com laivos de Nintendo Hard, em que a tentativa-erro é uma variável tão plausível que parecia quase esquecida no fundo da nossa memória. E é um jogo tão bem conseguido por Matt Kap, que ao tentar ultrapassar este jogo senti-me, com todos os meus tiques nervosos de criança, de regresso à casa onde cresci a jogar os meus jogos de NES favoritos na velhinha TV a preto e branco da Philips que me acompanhou até à idade adulta.
Castle in the Darkness é um exclusivo PC.