Gomu Gomu no Chicken a Tokyo Twilight Ghost Hunters
Os fantasmas gozaram de uma época de ouro nos anos 1980, tanto pela via mais afável, trazidas pelos geniais filmes (e séries de animação) de Ghostbusters, como pela via do terror com o Poltergeist de Tobe Hopper. Após algumas décadas de maior reclusão fantasmagórica, lá tivemos desde a década passada um regresso dos espíritos malignos à linha da frente da cultura pop, em especial na TV com as séries de grande sucesso Ghost Whisperer e Medium. Tokyo Twilight Ghost Hunters, a visual novel/RPG trazida para a Europa pela mão da NIS America traz-nos uma série de humanos que conseguem ver os que estão para-além da vida com a naturalidade de quem vê a vizinha do lado a estender a roupa no estendal da roupa. E esta é gente com capacidades mediúnicas que dispensa a aura pueril do Haley Joel Osment, o ar meio tresloucado da Patricia Arquette ou o busto volumoso da Jennifer Love Hewitt, mas que ainda assim consegue conversar e exorcizar fantasmas munidos de um bastão metálico.
Tokyo Twilight Ghost Hunters deixou-me um sabor extremamente agridoce nos lábios. É certo que as visual novels têm alguma dificuldade em sair do mercado nipónico porque muitos jogadores ocidentais o encaram como meros livros glorificados, mas temos tantos exemplos de bons jogos do género que conseguem aliar de forma exímia uma boa história com mecânicas de interacção interessantes. Infelizmente TTGH não é um desses casos.
O primeiro impacto que temos com este jogo desenvolvido pela Toybox Inc. é extremamente positivo. O estilo artístico é do mais apurado que vi em jogos do género, com ilustrações bem executadas e que utilizam formas inteligentes de animação. Neste caso os cabelos esvoaçantes, o pestanejar dos personagens, os gestos subtis de mãos são animações simples das magníficas ilustrações que o compõem, e que cumprem na perfeição a tarefa de lutar contra o estaticismo típico do género.
A história e o enredo mantêm o mesmo nível da arte: conseguem criar uma coesão narrativa (sem explicar alguns fundamentos e conceitos do mundo) e apresentando personagens memoráveis, bem-escritos e com dimensão (ainda que bidimensionais). Tokyo Twilight Ghost Hunters tem todos ingredientes para ser uma boa série de manga e uma boa série de anime.
E onde é que TTGH falha, apesar da sua arte e enredo estarem extremamente bem executados? Em todas as mecânicas de interacção que fazem de si um videojogo. Ao contrário de outros jogos com opções simples, em que temos múltipla-escolha de diálogo, aqui temos um interface icónico com quatro emoções distintas que conduzem a uma escolha entre os cinco sentidos. Ou seja, ao invés de escolhermos uma resposta textual a algo que nos perguntam (tal como “como estás?”), temos de optar, por exemplo, em carregar em tristeza e posteriormente em paladar. O que nos conduzirá a reacções tais como “importas-te de não me lamber?”. E com esta opção de interacção/resposta tão criativa a Toybox demonstrou-nos que a máxima de “menos é mais” é a forma de apelar a um público que não está habituado ao género. Basta vermos a simplicidade de Ace Attorney e os resultados que obteve em todo o mundo…
A segunda componente que é um total falhanço é a componente RPG/estratégia de TTGH. Visto o jogo estar dividido por episódios, toda a componente de visual novel é uma espécie de aquecimento para o combate (exorcismo) no final do episódio. Nessa fase temos acesso a uma quadrícula com ícones que representam os fantasmas e nossos personagens (os membros da instituição Gate Keeper, que tenta exorcizar os fantasmas do nosso mundo) e que em cada turno temos de definir para onde se movimenta cada um. Ao contrário de outros jogos do género que bebem das mecânicas do xadrez, tal como Fire Emblem, aqui temos de prever para onde o fantasma ir-se-á deslocar de seguida. Para isso tentamos encurralá-lo e definimos onde os nossos personagens finalizarão o turno no quadrado assignado e que realizarão um ataque. Na resolução do turno, se adivinharmos o quadrado onde o fantasma vai parar podemos atacá-lo, ou se falharmos nessa previsão teremos perdido o turno para nada. Ainda que esta mecânica de “adivinhação” seja curiosa enquanto mecânica, é mais um exemplo do quanto os exemplos mais simples e clássicos de RPG táctico por turnos podem funcionar perante a exasperação que a jogabilidade de Tokyo Twilight Ghost Hunters pode trazer.
É uma pena que Tokyo Twilight Ghost Hunters tivesse conseguido acertar onde a maioria dos jogos falha, apresentando uma arte e um enredo exímios mas que são assassinados pelas “criativas” mecânicas aplicadas aos segmentos de visual novel e aos segmentos de RPG. É daquelas situações que para mim, enquanto jogador e pretenso crítico de videojogos me irrita profundamente: frustra-me infinitamente mais um jogo que tinha todas as capacidades para ser um jogo excelente e que não passa da mediocridade, como é o caso deste, do que jogos notoriamente maus e que não apresentam qualquer margem possível de melhoria.
Tokyo Twilight Ghost Hunters está disponível para PS3 e PS Vita.