Este é o Spoiler.

cão

Cuidado com o Spoiler. Não se aproximem muito do bicho.

Se um pitt bull com este nome não vos mete medo, continuem a ler.

Se por outro lado quiserem ler sobre Pillars of Eternity sem o Spoiler, tranquilos e despreocupados, deem antes uma olhada aqui.

 

– (Eu) Olá a todos.

– Olá.

– Boas.

– (Eu) Querem fazer parte de uma experiência? Aqui e agora?

– Depende.

– (Eu) Estou com um bloqueio de escrita, e gostava que me entrevistassem. Pillars of Eternity, alguém aqui ouviu falar?

– Nope.

– É um jogo?

– (Eu) É. RPG de ação; esteve no Kickstarter, foi lançado há pouco tempo.

– Como é a visão do jogador?

– (Eu) 2D. Camera isométrica não-rotativa (pre-rendered).

– Jogabilidade?

– (Eu) Tu jogaste os dois primeiros Dragon Age, não foi?

– Sim, o Origins e o 2; não joguei o Inquisition ainda.

– Lembras-te de como o Dragon Age 2 não tem nada a ver com o Dragon Age: Origins, em termos de combate?

– Hum-hum.

– (Eu) Então: o Origins sempre foi visto como uma espécie de sucessor espiritual do Baldur’s Gate, que também é da Bioware; mecanicamente e não só; o consenso era que a série Dragon Age ia ser o futuro desse estilo de jogo; mas não foi, cada entrada na série é diferente da anterior, o Dragon Age não tem identidade enquanto franchise; não é o Baldur’s Gate 3, seja como for.

– Pois. E até tenho medo do Inquisition.

– (Eu). É. A Bioware a fazer um Skyrim. Também ainda não joguei. Mas tenho mais medo do próximo Witcher.

Sabem o que falta aqui?

Roach.

– Estamos a perder o foco…

– (Eu) Pois estamos. Voltando ao Pillars of Eternity: o jogo é, ao contrário da série Dragon Age, o verdadeiro sucessor espiritual de Baldur’s Gate em quase tudo; tem o mesmo feel.

Não falei de Planescape: Torment por causa de Tides of Numenera.

– (Eu) O estilo de combate é muito parecido com D&D: warriors são bland, os spellcasters são vulneráveis mas overpowered, os bards fazem buffs, os priests e os rogues são inúteis em combate (e em quase tudo o resto)…

– Estamos mesmo a falar de old-school puro, então.

– (Eu) Sim.

– E a história? É Secante? Empolgante? Mantém-te agarrado ou é do género “acordei com amnésia neste sítio e tenho que fazer coisas que me mandaram…”?

– (Eu) A narrativa é um bocado aborrecida e não é assim tão cliché. É mais aborrecida que o mundo de jogo. É uma narrativa concebida com cuidado; o problema, para mim, é que é muito familiar, é muito original nos detalhes, mas em termos de estrutura geral já deves ter jogado isto milhões de vezes.

– Ok. E enquanto jogo, também é aborrecido? As sidequests são rascas e repetitivas?

– (Eu) Não, não, nada disso. Está tudo muito bom a esse nível; o meu o problema é mesmo só ser tão derivativo…

– Certo.

– (Eu) O que gostei mais foi mesmo o universo que eles criaram; o que se desenrola lá é que é à base de tropes e arquétipos.

– Ok, mas enquanto jogo-jogo? Jogabilidade?

– (Eu) Tens twists engraçados. O jogo desencoraja grinding, por exemplo, não ganhas XP pelo número de kills diretamente; o que te dá mais XP são quests e exploração…

– Interessante; e personalizar a tua personagem? A nível de aparência e de classe?

– (Eu) Novamente, é muito semelhante ao que existe no D&D. Estás a ver o Mc Donald’s? Vamos dizer que o D&D é o Mc Donald’s. Muitos RPGs deste tipo são o Burger Ranch. O Pillars é o Burger King. Também quer ser parecido, e no geral é o mesmo: em vez do BigMac tens o Double Whopper; mas não é foleiro. O character creation e o class progression são muito parecidos aos dos Baldur’s Gate (ou dos Neverwinter Nights).

– E estética?

(Fui ao Google e mostrei dois screenshots).

– (Eu) O que é que acham?

– O estilo agrada-me, gosto das cores e etc.

– Gosto bastante, dentro do género.

– É visualmente interessante.

cão

– (Eu) E spoilers? Alguém aqui está interessado em spoilers?

– Eu gosto de spoilers.

– (Eu) és um pessoa estranha.

– Pois sou.

– (Eu) Quem não estiver que tape os ouvidos.

(Ninguém tapou os ouvidos).

– (Eu) De forma resumida e sem entrar em detalhes, estão atrás do vilão, que é o tipico vilão à Umbrella Corporation: parece que está por detrás de tudo o que há de mau no mundo, because of reasons. Neste jogo os deuses têm um papel muito importante (mais ou menos), são divindades reais mas são um bocado passivas (como no D&D). E acabam por descobrir que o vilão está a fazer coisas más porque afinal está a servir o seu deus (deusa). Because of reasons.

– Ah…

– (Eu) Foi ai que comecei a suspeitar que este jogo quer ser profundo e metafísico à força.

Keep going.

– (Eu) Esse deus que o vilão está a servir é um deus mau (uma religião má).

– Mas o jogo diz-te que é mau?

– (Eu) Mais ou menos. É um deus que ninguém curte, nem os outros deuses. É mau e pronto, não há um ponto de vista neutro.

– Tipo o medo ocidental do Islão.

– (Eu) Isso mesmo. Mas até aí, nada de novo; muitos jogos de fantasia fazem isso.

– Então?

– (Eu) Neste universo a reencarnação é uma realidade; vocês estão a investigar a vossa vida passada, e de que forma está ligada ao vilão. E entretanto percebem porquê: porque nessa vida passada descobriram “a verdade”. E voltam a descobri-la…

– Ok…

– E que verdade é essa?

– (Eu) Vão adorar.

(Suspense).

– Sim…?

– (Eu) Os deuses afinal não existem.

– …?

– Como assim?

– (Eu) Vocês interagem com os deuses; são seres sobre-humanos, espirituais e omniscientes; até podem falar com uns quantos antes do último boss; e o jogo depois revela: “isso dos deuses afinal é peta”.

– Mas…? Hã?

– Teria sido um plot-twist do caraças… se metade dos mortais não andasse a interagir fisicamente com esses deuses.

– Então quem são os deuses?

– Boa pergunta; pensei “se calhar está tudo na cabeça deles”; não. A resposta: uma civilização avançada estava farta de ver tantos povos em guerras e genocídios por causa de deuses inventados. E criaram aqueles seres.

– …

– (Eu) Não faz sentido nenhum, pois não? É parolo.

– Até pode fazer…

– Como assim?

– Não sei explicar. Há coisas que só fazem sentido no contexto da religião.

– (Eu) O argumento do jogo é que não são deuses porque foram criados. E o mais ridículo é que as personagens reagem todas da mesma forma: “oh não, afinal era tudo mentira”.

– Pois, estou a perceber… É um bocado estúpido.

– (Eu) Imaginem que o deus cristão andava por aí a fazer milagres hoje em dia, e que podias falar com ele; não querendo ofender ninguém com esta premissa; estou?

– Não, não.

– Não estás a ofender.

– Nem por isso.

– (Eu) Imaginem isso. E descobria-se que afinal deus tinha sido criado por ETs. Os cristãos reagiam todos “oh não, afinal era tudo mentira! Isto muda tudo!”.

– Acho que sim…

– (Eu) A serio?

– Uns teriam mais dificuldade em aceitar que outros.

– A fé é uma coisa complexa; é sentida de diversas formas.

– (Eu) Não percebo. Se Jesus tivesse sido feito por ETs, não era todo poderoso e fazia milagres à mesma? Porque é que deixava de ser divino? Talvez o pai dele também tivesse sido criado por ETs, ou fosse um ET também. Porque é que não podia ter criado este sistema solar e a espécie humana?

– Porque tu descobrias realmente que os ETs existiam e tinhas medo.

– (Eu) Não percebo.

– Já não era uma entidade que te salvava; era uma entidade que te queria era dominar…

– É a natureza humana. Temos medo do desconhecido.

– (Eu) Continuo sem perceber, faz-me confusão. Mas agora percebo que não faz a toda a gente.

– É um tema que o Snyder quer abordar no Batman v Superman. Já viram o trailer? Se o Super-Homem existisse, não era um (uma espécie de) deus?

– Já vi; “meh”.

– (Eu) Acho que fizeram o trailer antes de terem sequer guião.

– Talvez muitos o elevassem a esse estatuto, sim.

– Até chegar o dia em que alguém se lembrava que ele talvez não estivesse lá para salvá-los…

– (Eu) Hmmm…

 

Gostaram? Foi profundo, não foi? Tal e qual Pillars of Eternity.

Desta vez decidi deixar as imagens todas para o fim do artigo. O melhor para o fim, sempre.

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