Tal como provavelmente toda a gente neste maravilhoso país à beira mar plantado, também eu tive a infelicidade de me cruzar nas redes sociais com o infame vídeo de 13 minutos e qualquer coisa de duas jovens adolescentes a espancarem e humilharem um jovem da mesma idade, enquanto outros filmam, riem, impedem que ele retalie, incentivam, etc. Não consegui ver o vídeo inteiro. Senti demasiada revolta para aguentar ver aquela bestialidade até ao fim.
Ouvi vários comentários de colegas de profissão numa tentativa de explicar o inexplicável. Muito se falou do contexto social das jovens, da suposta incapacidade do rapaz perante a tortura, da ausência dos pais na educação das miúdas, da influência da TV e violência nas gerações de hoje.
Fiquei à espera que chegasse o momento de algum qualquer Quintino Aires acusar a indústria dos videojogos como responsável pelos desvios comportamentais destas jovens em particular e das novas gerações no geral.
Fui durante a semana bombardeada com perguntas de vários amigos sobre o que eu penso sobre o caso, a análise de personalidade das “meninas”, do que poderia ter levado a isto, se de facto os media e os videojogos nos tornam mais violentos.
Em todas as conversas a que fui chamada, tentei ao máximo evitar dar uma resposta concreta. Não tenho muito jeito para rodeios ou floreamentos de discurso quando o tema é sério e, por isso mesmo, controlei a vontade de dar resposta.
Mas depois de hoje ter visto mais 2 minutos do vídeo, aqui vai o que penso:
É verdade que a exposição da nossa sociedade à violência é cada vez mais acentuada. Seja através de telejornais, documentários, filmes, séries, internet ou videojogos, o nosso cérebro, como músculo que é, tornou-se elástico perante os constantes estímulos de violência que recebe e por isso mesmo – adaptou-se. Como se adapta? Para não viver permanentemente em choque, habitua-se.
Esta é uma explicação simples do mecanismo biológico bastante complexo que nos leva a apreender o mundo à nossa volta. E se compreender explica um acto, não o desculpabiliza.
Talvez pelas protagonistas do vídeo serem do sexo feminino, ainda não muito associado à comunidade de Gamers, os videojogos tenham escapado até à data ao veredicto da responsabilidade pelo acto cometido. Ainda estou à espera de ouvir a mente brilhante do Dr. Quintino Aires, mas até ao momento, nem o GTA nem outro jogo do género ainda foi apontado, julgado e considerado culpado pelas “mentes esclarecidas” de alguns psicólogos deste país.
Francamente, pouco me importa o contexto social, as vivências, os traumas e tudo o mais por que aquelas duas criaturas tenham passado. Como disse umas linhas acima, a psicologia e a sociologia, o entendimento das razões causais para tal acto, servem para o entendermos, analisarmos, estudarmos e possivelmente podermos chegar ao ponto de detectar casos semelhantes a tempo de os evitarmos. Nunca, mas nunca – para os desculpabilizarmos! Muito menos para transformar o papel do agressor em vítima da sua vivência.
Violência, mais ou menos exposta na nossa sociedade, sempre existiu. Cresci na década de 70/80, em que os desenhos animados eram verdadeiramente violentos, física e psicologicamente. Quem já se aproxima dos 40, certamente se lembra do tempo que víamos na TV o Tom Sawyer a ser espancado pela professora, o Marco à procura da mãe que o abandonou, o Conan – o rapaz do futuro, que lutava sozinho num planeta pós-apocaliptico para proteger o avô. Crescemos com estes “estímulos” e na escola também haviam os fortes que massacravam os fracos. Batíamos e levávamos.
O que mudou desde então? Repito o que disse acima – o que vou dizer é uma opinião pessoal, fruto da pessoa que sou, resultado da minha vivência e conhecimento académico.
Assiste-se a um fenómeno inédito nas sociedades ditas modernas – a impunidade. Não me refiro ao termo legal, mas sim à impunidade que define o carácter, aquela que vem de muito atrás quando ainda gatinhamos.
É um frase comum dizer que só se aprende com os erros. Sim, o cérebro humano processa o erro, e como máquina perfeita que é, identifica-o e tenta corrigi-lo para assim aprender a não o voltar a repetir. E como é que o cérebro detecta que algo é um erro? Pela sua consequência. Se eu cometer um erro, do qual não tenho qualquer consequência, então não vou identificá-lo como um erro. Logo, não aprendo. A frase deveria então ser: Só se aprende com as consequências dos erros.
Assistimos a esta ausência de consequência para os erros todos os dias. Tudo é desculpável, passível de estudo, identificado em nome da ciência, e esquecem-se do essencial. No meio desta fome de estudar e entender, estamos a esquecer-nos de ensinar. Estamos a pôr para trás das costas valores tão fundamentais como: Respeito, Empatia, Sensibilidade, Piedade, Solidariedade e… desculpem se vos choco… disciplina. Não há consequência séria para os erros da infância, da adolescência, dos jovens adultos, e assim, o que se está a criar, são gerações que julgam que tudo é permitido pois nada lhes acontece.
O que vai acontecer àquelas jovens que humilham alguém que supostamente é colega com a frieza e ausência de empatia próprias de um psicopata? Quem lhes disse ou mostrou, ao longo da sua infância, directa ou indirectamente, que tudo é permitido pois não há consequências de facto sérias para nada? Observando aquelas criaturas, parece-me claro que se julgam acima de qualquer consequência, considerando que tudo é permitido.
Não, aqui julgo que por enquanto os videojogos não serão os culpabilizados.
As raparigas da Figueira da Foz não são certamente gamers… resta-nos esperar para ver se permanecem umas Bestas.
Comments (3)
Miguel Lourenço ….tu leste o artigo?
Fiquei irritado a meio e comentei mas depois li o resto desculpa ai xD
Fds so for a baterem punhetas é que aquelas aberrações são gamers, fds até fico ofendido de saber que alguem pensa isso.