Para sondar o inferno ou elevar-se angélico, tome só uma pitada de psicadélico.
Este é um verso que o Autor do livro “Admirável mundo novo” enviou uma vez a Humphry Osmond, o suposto inventor do termo “psicadelismo”. Huxley era um escritor inglês que ao lado de Hofmann, Picasso e Lewis Caroll era (mais e menos) entusiasta do uso de LSD, e todos estes apresentavam algo em comum que mudaria a percepção de uma grande parte da humanidade sobre o mundo e, particularmente, sobre a relação do ser humano com o mundo. Mas não que o uso do LSD fosse estritamente profissional e apenas para benefício do processo criativo, porque cá para mim eles gostavam de apanhar umas grandes mocas.
Huxley referiu o “angélico” como Ang Lee o descreveu no seu filme Taking Woodstock durante a cena dos hippies na carrinha. A imagem central da paz e do amor é retratada naquela carrinha onde o estado emocional e sensorial sobressaem com as cores radiantes, com as preocupações e complexos a desaparecerem, com a aproximação de pessoas desconhecidas a unificarem o seu estado de espírito. E porquê este paralelismo de psicadelismo e LSD com Gardenarium? Não basta termos o Quintino Aires a comparar jogos com drogas? Mas explico, é que jogar Gardenarium coloca-nos nas nuvens, literalmente. É como naquela carrinha, ponto minúsculo no perpetuado Woodstock de 69, onde as cores radiam e os elementos entram num ritmo de dança ligeira e balançada. É entrar num mundo utópico, dominado pelo psicadelismo hipnótico e estranhas personagens com conversas ainda mais estranhas de pequenas histórias vagamente sincrónicas.
Nesta curta aventura e de agradável envolvência exploramos este “jardim” que floresce à medida que recolhemos latas de refrigerantes enquanto se procura um misterioso depósito. No caminho percorrido os campos de plantas vivazes espalham-se e movimentam-se acompanhadas com a Música calma de YlangYlang, de ambientes texturados com um toque de shoegaze num revestimento psicadélico, e como não podia faltar para acompanhar este visual invulgar pintado à mão.
Posso apontar imperfeições a Gardenarium, das que são facilmente corrigíveis e que são provavelmente fruto de alguma inexperiência na concepção desta que é uma experiência interactiva com componente jogável. Mas como apontar imperfeições a um jogo que no final de um dia em que apetece partir um prato ou outro (ou atirar o peluche da Hello Kitty pela janela fora ou lavar o chão de casa pela terceira vez) consegue deixar-nos num estado zen após 15 minutos?
Gardenarium é como o LSD, porque segundo Huxley, uma pitada (alerta à responsabilidade para não começar a ver monstros) de psicadélico é elevar-se angélico. Se preferirem sondar o Inferno, aconselho outras aventuras com Dante.
Uma experiência por menos de €5 disponível para PC, Mac e Linux. Pagam mais por uma sessão de Yoga e os resultados são quase os mesmos.