“Viajar é uma experiência humilhante. Vês em primeira mão o pequeno espaço que ocupas no mundo. Coisa engraçada é que, quanto mais longe vais, mais difícil se torna voltar. Mas quando o fazes… Se o fazes… Começas a ver o local de onde vieste com outros olhos.” – Lyris Titanborn, após confronto com Molag Bal.

Há uma discussão sensivelmente recente que tem alastrado nas redes: estarão os jogos a ficar muito grandes? Quanto estão dispostos ou têm o tempo para dedicar a jogos com um vasto mapa e centenas de missões? A resposta à primeira questão é muito simples: o mercado dos Videojogos pode e deve estar receptível a todos os gostos e feitios. A segunda questão também pode ser respondida com facilidade: vivemos no planeta terra mas não quer dizer que visitemos todos os países. No entanto, quem visita e contacta com outras sociedades e culturas terá muitas mais histórias para contar.

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Tamriel é um pouco como o nosso planeta. Um colosso. Um mundo gigantesco para explorar que parece nunca mais terminar, e porque o mais certo é nunca haver oportunidade para o terminar. É demasiado investimento até para o mais “hardcore”, como quem viaja e tenha as posses para isso não lhe chegue uma vida para ir da grande muralha da China ao Everest e passando pela cidade do templo dos ratos até à aldeia de Tesos (pun intended) em Avis. Dando o exemplo de outros jogos RPG de fantasia como The Witcher 3 ou Dragon Age: Inquisition, estes foram além fronteiras e alimentaram o debate sobre o tamanho exagerado dos jogos (e provavelmente o fará Fallout 4 numa componente pós-apocalíptica). Elder Scrolls Online chega ao extremo.

Mas não é apenas pela área que se contempla, é também pela quantidade de elementos que a compõe. É pela variedade de elementos que esta nova geração permite ter em campo, somando os elementos audio que já não se limitam à área que nos circunda. Tal como Todd Howard disse há pouco tempo atrás, com estas novas ferramentas poderemos aproximar-nos de uma taberna e ouvir o que se passa no interior, e os loadings serão tão rápidos como um clicar de dedos. Todd Howard não estava a exagerar.

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E finalmente já conseguimos distinguir os NPCs dos jogadores

 

The Elder Scrolls Online, subtitulado “Tamriel Unlimited” após eliminarem a ineficaz subscrição mensal, é produzido pela Zenimax Online, mas teve algumas mãos criativas e funcionais da Bethesda. Está coeso com a série, desde o lore à visão artística, trazendo consigo detalhes para quem segue o êxito da Bethesda desde o início. Foi um jogo que repudiei no seu anúncio principalmente por achar que iria destronar a experiência a solo, que rejeitei no seu lançamento para PC/Mac por achá-lo muito inferior às produções da Bethesda, e após um ano acompanhado do lançamento nas consolas deparei-me com um jogo muito mais afinado. E fez-me engolir algumas palavras.

Iniciamos naturalmente como presidiário, num reino de Oblivion, e a nossa alma é extorquida por Molag Bal. A nossa quest principal é reaver a nossa alma e salvar Mundus de ser fundido com Coldharbour, um dos planos de Oblivion. Esta campanha a solo mistura-se com a componente multijogador, e é aí que The Elder Scrolls Online fez a grande aposta: na facilidade com que os jogadores se encontram e unem esforços para “limpar” dungeons e afins. São muitos os amigos momentâneos que fazemos nesta quase interminável aventura, por vezes durante alguns minutos, por vezes durante horas. Até que chega o ‘adeus’, e continuamos até encontrar um novo ou mais companheiros de viagem.

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Pessoal, é só mais uma, sorriam!

 

Há vários ingredientes que fazem deste novo Elder Scrolls um narcótico que actua no cérebro e que pede para ser constantemente nutrido. Mexe com as emoções, sentimentos que variam da calma ao êxtase pelo combate frenético, o encontro, a perca, o reencontro, a recompensa, num loop diferenciado pelas várias paisagens trabalhadas ao pormenor e quests que nos levam a explorar o mapa ponto a ponto. É uma receita deliciosa, bem conhecida e explorada, perigosa para a vida social.

Contudo, peca essencialmente por duas questões quase imperdoáveis: a resolução de puzzles que um miúdo de 8 anos consegue resolver com uma perna às costas e as fetch quests. Estas existem com o objectivo de nos direccionar para determinados pontos de interesse no mapa ou accionar novas missões, mas a quantidade de “vai ali buscar-me 3 ingredientes e volta para eu fazer um cozinhado” e receber 75 moedas como recompensa é como andar pela cidade de Lisboa a entregar folhetos para depois só aparecerem 10 pessoas na festa. E já estou pelas narinas de “entregar folhetos”.

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There, fetch!

 

A mecânica de combate fast-paced foi largamente explorada em relação à série da Bethesda, também em primeira e terceira pessoa, com árvore de skills mais abrangente e com cada raça a possuir a sua especialidade. A combinação de poderes que se masterizam da nossa personagem ou com a dos outros jogadores é bastante satisfatória, permitindo um combate não só visualmente agradável como também permitindo uma maior sensação de poder e domínio na batalha, com bosses que chegam a ser pornograficamente difíceis (Mode Hardcore Inquisition Style).

O PvP consiste numa batalha entre as três alianças no centro de Tamriel, em Cyrodiil, todos ao molho, às dezenas em vários pontos do mapa para conseguir capturar fortes, recursos, Elder Scrolls, até conseguir o reputado lugar de imperador. E é aqui que os mega servidores da Zenimax são postos à prova, com centenas de jogadores em batalha táctica, contudo é tão enganador como o “HD” da TV por cabo. Cyrodiil foi despida de vegetação e de tudo o que conhecemos de Oblivion para deixar lugar a um campo gigantesco, e mesmo com esta desnuda paisagem, é comprovado que não há servidores que aguentem com 100 jogadores a debitar feitiços ao mesmo tempo numa área de 20 metros quadrados.

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aaaattaaaaaccckkk sooooo muuuuchhh laaaaaagggg *crash*

 

E voltamos ao inicio: estarão os jogos a ficar muito grandes? Depende do quanto estão dispostos ou têm o tempo para dedicar-se a jogos como este MMORPG/Dungeon crawler com um vasto mapa e centenas de missões. Somando mais o farming, as fetch quests, o ambicioso crafting, a formação de guilds, a venda e compra de itens, o olhar para as paisagens com uma magnífica banda sonora, dungeons para multijogador, o procurar do tesouro, o gerir do loot, socializar com uma panóplia de acções e gestos sociais, mais a componente PvP. Mas esse é outro campeonato.

O confronto com Molag Bal é apenas o início desta larga aventura. É o aperitivo num dia de casamento em que somos os noivos e o centro das atenções. E quanto mais longe vamos, mais difícil se torna voltar, não só às zonas onde é iniciada a aventura como à própria vida real. É que já reparei em alguns jogadores através de chat (podemos falar facilmente com quem quisermos) a ficarem presos no outro lado do espelho, lá pelos cantos de Oblivion…