A rubrica “Tudo a Molho” regressa esta semana com algumas memórias tristes das nossa vidas de jogadores. Todos tivemos jogos que nos consumiram dias, semanas, meses, e em alguns casos anos de vida, e que hoje, olhando para trás, percebemos que estivemos mais reféns do que divertidos, num Síndrome de Estocolmo que nos mascarou jogos medíocres como sendo a melhor coisa do mundo. A que se coloca esta semana é:
Quais os jogos que nos fizeram pensar: estou a desperdiçar a minha vida!
João Machado
Championship Manager 00/01. Pokémon Silver, Harvest Moon todos eles me tiraram noites e dias. CM era literalmente de pôr a nascer do sol. Mas nenhum jogo me fez pensar que estava a desperdiçar a minha vida nas horas que passava com ele.
Por outro lado, Infinite Space para a Nintendo DS (apesar de também me ter levado umas horas valentes em 2010 e 2012 na segunda volta) é que me fez pensar isso.
Foi nessa segunda ronda, numa fase menos feliz, que parte da temática do jogo me clicou, e me meteu a pensar “Há tanto para explorar lá fora, tanto para fazer, tens mesmo que estar aqui, preso? Não estás a desperdiçar tudo o que podes alcançar?”
E tomei um decisão, deixei de desperdiçar seja o que for.
Isaque Sanches
Skyrim. *drops the mic*
http://www.shamusyoung.com/twentysidedtale/?p=14422
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Leonel Ferreira
Estava escuro como o breu na cidade de Malton. Pudera! Nenhum ser vivo arriscaria ter as luzes acesas nos edifícios que ocupavam. Se as tivessem acesas significava que o edifício estaria ocupado por humanos idiotas a convidarem os mortos-vivos para um festim ou então estava ocupado por um grupo organizado que tinha o edifício devidamente barricado. A luz atraia os zombies. Os vivos mexiam-se na escuridão à procura de objectos que os ajudassem a sobreviver e cada noite obrigava a procura do próximo local para recobro acompanhado do desejo de voltar acordar vivo no dia seguinte. Haviam grupos de sobreviventes organizados que estavam a limpar a ameaça zombie e a tentar trazer de volta alguma semelhança normalidade. Entrar em edificios arruinados e voltar a matar os zombies lá dentro, atirar os cadáveres pela porta ou janela – eles voltam a levantar-se, garantidamente – e reconstruir e barricar, podendo também devolver-lhe electricidade. Era uma guerra com derrota predeterminada, onde os vivos tentam sobreviver como podem e os mortos-vivos são sempre mais numerosos.
Urban Dead é um RPG desenvolvido em HTML, text-heavy, turn-based e graficamente minimalista. O objectivo é sobreviver ou matar em Malton, caso escolhamos ser sobreviventes ou zombies. Morre e torna-te um zombie independentemente da tua escolha. Zombies não morrem e podem sempre voltar a erguer-se passado um tempo. Podem ser trazidos de volta à vida com uma seringa de revivificação da NecroTech – mas são difíceis de encontrar. Neste jogo passei quase 3 anos e tinha uma comunidade excelente de sérios roleplayers. Haviam facções extremamente organizadas a nível assustadoramente preciso e militarizado, com hierarquias internas e ordens de comando; facções de zombies que organizavam hordas para ataques em massa; facções de sobreviventes que profetizavam o fim dos tempos ou que adoravam e idolatravam os zombies, algumas dizendo que a zombificação era o próximo passo evolutivo do homem – estas não tinham problema algum em matar outros sobreviventes para acelerar o processo. Malton era o caos onde a qualquer momento podíamos encontrar um estranho que tanto nos podia querer ajudar como matar. Encontrar equipamento e mantimentos é dificil e tem de ser feito dentro de edificios, sem saber o que os pode estar a ocupar e à nossa espera. O jogo existe desde 2005 e é um antecessor espiritual a jogos como Day Z e companhia.
Perdi demasiado tempo neste jogo, mas não me arrependo da experiência. Porque perdi demasiado tempo? Este era um jogo que se podia jogar logando uma vez por dia e usando os pontos de acção todos em 5 minutos, mas a dado ponto já estava a gerir esses pontos e a logar-me várias vezes ao dia. Tornei-me admin de um dos seus fóruns. Logava-me múltiplas vezes por dia para jogar e jogava sempre organizado e em sincronia com outros jogadores do meu grupo. Planeavamos raides e recuperação de diferentes zonas da cidade de Malton. Auto-suficiente e militarmente organizado, o grupo conseguia recuperar num dia largas áreas. Os jogadores faziam roleplay dos seus personagens, do seu desespero, das suas lutas, dos seus relacionamentos amorosos. Mulheres jogavam personagens masculinos e homens jogavam personagens femininos (um dos melhores que conheci era um homem que jogava uma personagem do sexo feminino que era soberbamente classy).
Podia tê-lo jogado a solo e não era um centésimo do divertimento que jogá-lo em conjunto com outras pessoas e não ficaria a perceber grande parte do seu charme. O que me fez pensar que estava a desperdiçar a vida foi o facto de estar a ignorar e a não jogar a outros jogos para jogar a isto – um simples jogo de texto no meu browser – e ao escrever estas palavras confesso que até tenho alguma saudade.
http://www.urbandead.com/
Ricardo Correia
Sem dúvida que a maior perda de tempo que já passei num jogo foi mesmo recentemente um Idle Game chamado Clicker Heroes. Não sei como é que consegui passar semanas agarrado a um jogo do género, a encontrar combinações para optimizar os meus ataques, para ultrapassar os meus records anteriores, quando no fundo estava a jogar…um idle game. Quase que me apetece deixar aqui a discussão sobre “Idle Games: jogos ou estupidez dissimulada?”. É que tenho sérias dúvidas se Idle Games são jogos per se ou se meras fontes de tendinites, pelas elevadas dose de cliques a que nos sujeita. Algo que se joga sozinho como é que se chama? The Order: 1886 eu sei.
Menção honrosa a Conquer Online, o primeiro MMORPG que joguei, há mais de dez anos, e que aparentemente ainda lá estão alguns dos jogadores do meu “tempo”. Mais outro candidato a “jogo que me poderia ter dado uma tendinite mas que na prática não tem conteúdo nenhum”.
Bernardo Lopo
Bem, tem de ser League of Legends. O problema, nem é ter jogado. O problema é ter insistido em ter jogado. Em retroespectiva, o tempo que gastei em League of Legends (calculado a partir de wasted-on-lol.com) é suficiente para ir à lua. E voltar. Três vezes. Daria para jogar sete JRPGs (daqueles mesmo bons). Para preparar cerca de seiscentas refeições, para correr mil quilómetros, para fazer um milhão e oitocentas flexões.
Bolas. Bem-dita a hora em que disse chega. Se ainda jogam, possivelmente ainda não descobriram que estão fartos, pois desde o dia em que desinstalei esse maldito jogo não houve uma única ocasião em que me apeteceu jogá-lo.
Frederico Lira
Miguel Nogueira
Uma tarde de Agosto sentei-me na área de restauração do Centro Comercial Colombo. Em cima da mesa o Almoço – ainda me lembro que foi uma salada saudável – mas a razão que ali me trazia não era gastronómica. Preparado estava um caderno A4 no qual passaria uma tarde a fazer um plano pensado, arrojado e milimetricamente pensado. Não, não ia assaltar um banco. Ia grindar no Runescape. Estavamos no ano de 2006, eu estava com 30 anos e completamente viciado neste jogo.
No caderno planeei apanhar 1000 itens de barro, encher 1000 baldes de água, que por sua vez seria usados para preparar o barro que depois seria cosido para tentar fabricar 1000 tijelas de barro (descontando as que se partiriam). Depois foi a vez de ceifar 1000 itens de trigo que moidos e juntos à agua fariam a massa da tarte de peixe que seria feita com 1000 peixes – que depois de cozinhados – se juntariam à tarte de peixe que iria ao forno. No total, com o desperdício devo ter acabado com 400 tartes para vender, mas que me valeram subir de nível em mining, fishing, cooking, crafting entre outros.
Foram horas a fazer estas actividades, maços de cigarros inteiros, bebidas energéticas. Estava transformado no estereótipo mas com 30 anos não falava com outros jogadores pois tinha praticamente idade para ser pai deles. Entre 2004 e 2007 as horas que passei no jogo foram incontáveis. Sim, também as passei em muitos outros ao longo da vida. Das 2 directas e meia para tentar fazer 100% de GTA IV nos primeiros três dias de lançamento (um insucesso), ou das horas passadas a percorrer em grelha e a pé todo o mapa de Fallout 3. A grande diferença é que nesses jogos eu estava a divertir-me. Em Runescape eu nem sabia porque passava jornadas de 14 horas a pescar, fumar – e ouvir rádio – sem falar com mais ninguém. Uns meses depois de fazer as 400 tartes larguei o jogo e deixei para trás milhares de horas que foram literalmente tempo perdido, jogos que não joguei, filmes que não vi, livros que não li, pessoas com as quais não conversei.















Comments (6)
…não esqueço as horas que passei com a primeira edição de Halo para Xbox a ponto de me doer o corpo de tanto tempo passado na mesma posição.
E somar a isso os calos nos dedos por causa dos botões e do analógico? ;)
antes do runescape foi Ogame… damn, era tão dificil não havendo smartphones, ter de programar naves para sairem do planeta enquanto um gajo saia de casa e chegarem quando já estivessemos em casa para não nos destruirem a frota em caso de ataque ao planeta. grandes tempos
André, eu fiz isso intensamente quando o Farmville foi lançado. Calculava o tempo que eu demorava a chegar a casa do trabalho para optimizar os tempos de produção.
É, a mim émesmo o LOL recentemente. Antes foram os jogos de estratégia, SimCity, Age of Empire, Command&Conquer, Warhammer, Warcraft, Rise of Nations, Anno 1492, etc. Ah e claro, CounterStrike nas férias!!!
Eu ainda não larguei o LoL. E já lá vão quase 4 anos…