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Existem momentos na nossa vida que pensamos nas pequenas grandes coisas que nos fazem sentir sortudos e gratos pelo que temos – ainda que nos falte muito para ter o que queremos.

Esta 6ª Feira, dia 21 de Agosto, quando a minha equipa do Rubber Chicken me incumbiu de assistir ao lançamento de Until Dawn, na Taberna das Almas em Lisboa, e entrevistar Will Byles, um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento do jogo, dei por mim a sair de lá com a certeza absoluta que o dinheiro não é mesmo tudo na vida. Aqui, na casa da Galinha de Borracha, ninguém é pago pelo que faz. Tudo o que fazemos, escrevemos, tempo que dedicamos, coisas que abdicamos pelo compromisso que temos com os nossos leitores, é feito apenas por uma Paixão enorme que todos partilhamos por esta forma de arte e, acima de tudo, por quem nos lê. Ao aperceber-me que tinha tido acesso ao jogo, para fazer a respectiva análise, antes do jogo sequer ter saído, e ainda por cima numa edição de coleccionador, pensei para mim: “Alexa – são as pequenas coisas da vida que nos fazem sentir verdadeiramente afortunados!”

Quem costuma ler o que escrevo, sabe que sou uma auto-proclamada: Horror Freak. Adoro terror. Adoro sentir medo num jogo, filme, livro, seja o que for. Adoro sentir a adrenalina a escorrer no sangue e as palmas das mãos a humedecer com a força com que agarro no comando da consola, enquanto a minha personagem, o meu Eu temporário, tenta sobreviver.

Por ser uma perita, que já jogou quase tudo que a indústria de consolas tem para oferecer neste género, e que já viu um pouco de tudo o que o cinema oferece nesta categoria, ao mesmo tempo que colecciono Stephen King e Edgar Allan Poe, sou uma cliente muito difícil de satisfazer. Não me assusto com facilidade – não reajo ao que a maioria reage, não me impressiona o Gore, os assassinos psicopatas pouco me assustam, e muito menos sequer vacilo com os chamados jump scares (aquela forma barata de assustar aumentando o volume de uma música numa cena ou pondo uma imagem aleatória ao virar de uma esquina). Sou do género em que a sirene de Silent Hill aterroriza mais que todos os monstros de Resident Evil 4 juntos (e eu amei RE4) – o que não se vê, o medo psicológico, é bem mais danoso para a minha mente do que o que é visível. Um medo, uma vez descoberto, pode combater-se. E por isso, deixa de me assustar.

Com todo o meu passado de jogos e desejo de encontrar novamente um jogo à altura, entrei pela noite de 6ª Feira adentro, em Until Dawn.

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Poucas vezes vi um jogo com tão boa apresentação. Desde o genérico, às imagens, à figura de fundo em que uma caveira se transforma em ampulheta, tudo é um convite para mergulharmos naquela noite em que 8 jovens se vêm presos numa cabana, sem qualquer contacto com o exterior.

Sim – a premissa é Tudo menos original. Já perdi a conta ao número de vezes que vi um filme em que a premissa começa com: “Grupo de jovens fechado numa cabana em que um a um começa a desaparecer”. Não me importo nada com a falta de originalidade. Não temos que inventar a roda para ser geniais. Não é a fórmula que conta – é a forma como se usa a fórmula. E neste ponto, Until Dawn, conquista o jogador para a sua muitas vezes vista história. O prólogo é dramático e tenso. Sentimos imediata empatia por algumas personagens e antipatia visceral por outras.

Desde os primeiros minutos, entendemos que todo o jogo tem por base um novo motor, resultante de um conceito cientifico baseado na Teoria do Caos. É o Efeito Borboleta. Resume-se mais ou menos assim: uma borboleta bate as asas no México e, na China, um ciclone é despoletado. Parece ridículo? Esta teoria tenta contabilizar o incontabilizável. Uma pequena acção num determinado momento particular de tempo e espaço, poderá ter consequências catastróficas. Se pensarmos bem, vivemos sob este princípio todos os dias da nossa vida. Ao tomarmos uma decisão em particular, poderemos condicionar todas as outras opções que poderíamos ter tido na vida. E não só, condicionar outros também. Assustador? Não vale a pena pensar muito nisso. O melhor é fazer o que achamos correcto a cada segundo da nossa vida e esperar o melhor resultado disso.

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Com este motor inovador, que nos dá a sensação que não há volta atrás, tal como na vida, iniciamos a nossa noite. Aqui não há “Save Game” e muito menos há “Game Over”. Todos podem sobreviver. Todos podem morrer. Tudo depende das decisões que tomamos. De quem gostamos. De como interagimos com as outras personagens.

Em Until dawn não somos 1, mas sim 8 personagens em diferentes momentos de uma noite que mudará a vida de todos os intervenientes. Todos têm motivos para gostar mais ou menos dos restantes, tal como todos nós temos motivos para gostar mais ou menos das pessoas que nos rodeiam. As emoções e afectos de cada uma das personagens,oscilam consoante os estímulos que as mesmas recebem dos seus companheiros de casa. Ao longo do jogo, podemos ir monitorizando estas mudanças e vendo como a experiência, as interacções de relação que as personagens vão tendo, vão modificando cada um e, consequentemente, a forma como agem na história. Tal como nos acontece na nossa vida.

Escrito por 2 argumentistas/actores bem conhecidos do cinema de Terror, Larry Fessender e Graham Reznick, Until Dawn apresenta uma história sólida, com twists e mudanças que nos surpreendem, e não deixa, em momento algum, que a sua premissa tantas vezes vista, se torne banal ou previsível. Enquanto jogadores, somos sugados para dentro da história, e em muitos momentos, através de respostas que, mesmo sem querer, inserimos no jogo, vemos os nossos próprios medos serem incorporados, retratados e devolvidos aos nossos olhos.

A jogabilidade de Until Dawn também não é original. Sim – voltamos ao Mundo dos Quick Time Events (QTE), esta forma de jogo que se tornou tão inovadora quanto infame nos últimos tempos. The Order e Beyond Two Souls, foram, quanto a mim, um absoluto Fracasso de jogabilidade e de experiência. Um perfeito exemplo de como os QTE podem estragar algo quando não bem aproveitados. Senti-me a ver um filme em que tinha que carregar num botão de vez em quando.

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Apesar da mecânica ser a mesma, posso-vos garantir que em Until Dawn, não é isso que acontece. Em cada capítulo, temos a perfeita noção que, caso falhemos um botão ou tomemos a decisão “errada”, ditamos o destino irreversível de alguém. Esta tensão é tudo o que procuro quando entro num thriller…seja ele escrito, cinematográfico ou experienciado com um comando nas mãos. Em muitos momentos, dei por mim a hesitar até aos últimos segundos, sem saber o que fazer, com as unhas cravadas no comando para não falhar botão algum. E quando falhei – a sensação de impotência trouxe a vontade de querer fazer melhor.

Os QTE tornaram-se motivo de cepticismo na indústria, muito por culpa dos jogos que mencionei, que fazem do jogador um mero espectador que prime botões. Heavy Rain já nos tinha mostrado que, quando bem utilizados, os QTE são mestres na arte de criarem tensão e darem ao jogador a sensação mais próxima que podemos ter de tomada de decisões na vida real. Until Dawn segue a linha de Heavy Rain e felizmente ignora todos os erros e fracassos de The Order e Beyond Two Souls.

Apesar de ser um jogo muito bem conseguido, principalmente numa altura em que os Survival Horrors são uma espécie em extinção, está longe de ser um jogo perfeito. Poderiam ter feito mais com as pistas que procuramos no jogo, que afinal pouco mais fazem que contar a história. Poderiam ter inserido puzzles que teríamos que resolver baseando-nos na nossa análise de pistas, decisões tomadas depois de interpretarmos e analisarmos os objectos que encontramos – enfim, poderíamos ter que usar mais o cérebro para além dos músculos. Poderia também ser mais longo. 9 horas de jogo (mais coisa menos coisa), deixa-nos com a sensação que faltou algo. Mas o valor de rejogabilidade é tão grande, que esta falha é posta completamente em segundo plano. Poderemos refazer o jogo até obtermos tudo o que procuramos, ou poderemos repetir apenas um capítulo para salvar aquela personagem que realmente gostamos. A escolha é nossa e as opções incontáveis estão à nossa disposição. Cada vez que re-jogamos, com decisões diferentes, sentimos as asas de Borboleta a causar efeitos num outro lado. E esta é também a magia do jogo.

Pode não ser único – mas este é com Toda a certeza, um jogo que queremos jogar pela noite dentro e Até de Madrugada…

Positivo: Voltaram os bons Survival Horror com bons Quick Time Events.

Negativo: Queria tanto mas tanto solucionar puzzles e investigar…..

Until Dawn é o primeiro grande lançamento original da Supermassive Games. Não é um jogo perfeito. Não é um jogo original. Não é um jogo que nos vai fazer repensar tudo o que se passa na indústria. Mas é um jogo muito bem conseguido. Original na sua pouca originalidade. Imersivo. Lindo de se ver. Dá-nos vontade de querer mais e finalmente traz de volta um género onde há muito não tínhamos nada que nos desse vontade de repetir.

Until Dawn é um exclusivo PS4.