Alguns de nós tivemos o azar de nascer em 1980, e crescer até ao bug Y2K, aí parou o crescimento geral. Foi um fenómeno estranho mas aconteceu. É científico, procurem por aí. Talvez não seja verdade, mas não obstante os 20 anos que cobriram 80/99 do seculo passado, foram uma porcaria. São anos que para a minha geração até aqueles que nasceram até… hmmm… digamos 1988, carrega no nosso botão da repulsa quando pensamos no que vivemos nessa altura. E o pessoal que nasceu antes também, não me posso esquecer dos meus irmãos e o pessoal da idade deles.
Se há coisa que os anos 80 e 90 estão cheios é de más referências especialmente no campo do cinema, animação, música, e até neste mundo que nós adoramos que é o dos videojogos. Ora é isso mesmo que o pessoal da Sierra Games fez. Várias coisas más dessas duas décadas enfiadas num jogo. Como uma cápsula do tempo digital em formato de simulador de vida. E agora é que a porca torce o literal rabo… Como é que eu vou falar de um jogo sem atacar quase todos os maus aspectos dele?
Vamos fazer assim… respirem fundo e fechem os olhos…
Ok… isto não vai funcionar assim, até porque se estão a ler isto é porque não fecharam os olhos. E no fundo eu estou-me a lixar para se o fizeram ou não…
Mantenham os olhos abertos… Imaginem um mundo onde cada passo que dão é limitado, todas as pessoas que conhecem todos os cenários, os diálogos, o enredo, é estrangulador, cada personagem já foi vista antes sempre da mesma maneira, naquele lugar, com aquele nome, sempre assim… Pensem num universo paralelo onde pequenos detalhes da vossa cultura, estão lá e estão adulterados, o vosso banco chama-se P.I.G.G.Y, a hamburgueria não é o MacDonalds mas parece, não há nada de bom dos anos 80/90 é como se tivéssemos sido enfiados como figurantes num episódio do Dawson’s Creek onde não se passa nada. E pensando bem… acontecia alguma coisa em “Dawson’s Creek”?
E agora para continuar o mau espírito dos anos 80/90 uma “música”, senhoras e senhores: Hootie and the Blowfish, I just wanna be with you:
O coração até bate mais devagar e os dedos teclam mais lentamente, sem agilidade, sem precisão…
Como eu não tenho spoilers para estragar este jogo, vou só falar da parte técnica do próprio.
O que é Jones in the Fast Lane? Eu chamo-lhe uma má versão do Punch Club. Outros podem chamar-lhe um life simulator, um jogo de tabuleiro digital, um aborrecimento, um todas as opções anteriores?
Em Jones in the Fast Lane, controlamos um personagem. Sem nenhuma particularidade, podemos escolher um rapaz, uma rapariga, um homem de meia idade ou uma mulher de meia idade. Escolhemos e depois, não se passa nada de emocionante, é como um jogo de tabuleiro sem dados.
Hoje em dia Jones in the Fast Lane é um mau jogo, é uma má memória, apesar de o ter jogado milhentas vezes no velhinho 486 que tinha, não gosto de me lembrar dele. Há coisas que a nostalgia não chega para tornar boas, e há muito mau nos anos 80/90. Jogos eram no geral uma porcaria, vamos ser sinceros, eram difíceis de manobrar, tinham péssimos gráficos e sons. Televisão? 2 canais durante anos, e o canal dois só começava depois de almoço, só lá para os 90 é que tínhamos 4. Internet não existia, cinema, música chegava cá tudo mais tarde.
Nessa altura também havia bons jogos, a Sierra que produziu este também produziu King’s Quest, Conquests of the Longbow e Phantasmagoria, agora Jones é chato. É um jogo de tabuleiro no qual controlamos um pino, nem sequer é um personagem, é um pino num jogo de monopólio sem dado, e temos um limite de tempo para jogar, nesse limite temos que ir à escola, trabalhar, arranjar a casa, comer, bem… temos que viver e para viver já me chega a vida. O jogo nem sequer tem uma particularidade para tornar essa pouca jogabilidade mais interessante. É mesmo só viver, pensem num Sims, mas mais básico, num protótipo de Sims, sim é isso. Tão mau como mas com gráficos piores. Podiamos jogar contra o “computador” que controlava o titular Jones. Ou contra amigos por turnos, o que lhe dava mais aquela ideia de jogo de tabuleiro, mas era só isso.
Vou ter que ser sincero, na sua altura o jogo era brilhante graficamente. VGA 256 cores! Gráficos foto realista. Não vou negar que visualmente era dos melhores jogos que passaram no meu computador. Mas no fundo, se olharmos bem, um wallpaper interactivo de um aquário tropical pode ser muito bonito, mas não deixa de ser um aquário, pois não?
Jones é tipicamente um daqueles jogos que mostram que os óculos mágicos da nostalgia são tal e qual como os da cerveja que fazem as pessoas mais atraentes. Quando estamos sóbrios de manhã (ou de ressaca), assim como 25 anos depois, nem tudo do passado é bom e bonito, até porque bonito, bonito… é a música do Tozé Gamito. Agora, um jogo que tem pouco de jogo e é simplesmente para viver uma vida virtual? E nem sequer uma vida louca?
Eu podia fazer uma review disto que pode ser encontrado ainda para PC e talvez emulado para mobile, mas não vou fazer. Mas parafraseando o que disse hoje ao Ricardo quando falamos de Jones in the Fast Lane: Quem gostar disto merece ser um menino novo na prisão, e que façam dele uma cabra. O problema é que se gosta deste jogo, possivelmente vai gostar de sofrer isso também.