Muitas vezes há uma visão excessivamente eurocêntrica do mundo, e acabamos, consciente ou inconscientemente, por achar que pelo volume de produção game dev indie na Europa que é aqui que tudo existe. E sendo verdade que muitos dos bons (e médios e maus) casos que são lançados diariamente pelo mercado independente, uma grande quantidade chega do Velho Continente, essa não passa a ser uma verdade absoluta e isolada.

Contactámos pela primeira vez com a editora AGM Playism há três anos atrás, e percebemos que algo se passava no recôndito Japão. Que para além dos JRPGs e visual novels que nos chegam pelos grandes nomes históricos que ajudaram a fazer do mercado global o que ele é hoje, que existe uma grande força jovem e criadora, que tece a malha indie asiática com propostas inteligentes e inovadoras, e acima de tudo com um suporte sócio-cultural distinto e que lhe confere uma postura refrescante sobre a experimentação criativa.

A AGM Playism tem feito um gigantesco esforço de localizar o que de melhor se tem feito na Ásia (e não só), e sinal disso foi a receptividade que alguns dos seus jogos tiveram no Ocidente, tal como D4 e One Way Heroics.

 

Depois de Cave Story, a vida do sapo em 8 bits

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Daisuke “Pixel” Amaya conquistou o mercado dos videojogos com o seu jogo gratuito Cave Story, uma brilhante e honesta homenagem a Metroid. Pixel, como é conhecido no meio artístico, volta a recriar uma memória de infância em estilo de homenagem, e desta vez aos shooter platformers como Mega Man que fizeram felizes muitos jogadores durante o seu crescimento (como é o meu caso).

Kero Blaster, o lançamento final de uma experiência que desenvolveu com o nome Gero Blaster, e que teve também uma versão de demo com o nome Pink Hour, é um regresso aos jogos de plataformas com apenas dois botões, de mecânicas e apresentação aparentemente simples, mas desafiantes como os jogos da geração Nintendo Hard sabiam ser. E acreditem que apesar do aspecto simpático de Kero Blaster morremos muitas, muitas vezes.

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Regressamos aqui a uma linguagem 8 bits, à semelhança de outras criações artísticas suas, que surpreende pelo nível de detalhe e diferenciação entre os diversos elementos que compõe o cenário. Há um número elevado de inimigos diferentes a cada progressão lateral do ecrã, e temos de estar constantemente a aprender padrões e a adaptar-nos a novas situações, sejam ataques de inimigos ou obstáculos.

Toda este ambiente retro vem ainda aprimorado por um sistema de upgrades e de armas distintas que ganhamos nas boss fights, ao bom estilo do jogo criado por Inafune. O sucesso de Kero Blaster motivou Amaya a lançar mais um jogo, e desta vez totalmente gratuito no Steam: Pink Heaven, a demonstrar a gigantesca criatividade e produtividade deste artista japonês, cuja linguagem e abordagem artística das suas criações tem uma enorme coerência visual e conceptual.

 

A princesa baunilha que queria ser o Super Mario

Criado pelo estúdio Nonlinear, Starchaser: Princess of the Night Sky sofre de um problema de muitos outros jogos indies: a ideia, seja conceptual ou mecânica, sobrepor-se qualitativamente à sua execução, muitas vezes motivadas pela incapacidade de fazer diferente.

Starchaser possui uma história cliché de muitos manga e anime, de uma princesa que é a Escolhida e que necessita de efectuar um ritual místico para apaziguar os deuses ou trazer boa sorte para a sua vila, ou para impedir o fim do mundo. (Qualquer uma das hipóteses encaixa na forma modular narrativa de alguns déja vus nipónicos). Mas ultrapassando isso, é que toda a narrativa e toda o enredo e momentos quase visual-novel são apenas o elo de ligação entre o essencial do jogo, que é uma curiosa abordagem aos puzzle action platformers tridimensionais.

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Em Starchaser controlamos Kineto, uma Princesa que descobre durante o ritual que consegue, de uma certa forma, controlar a gravidade. Sempre que estamos em contacto com piso quadrículado a gravidade não nos atinge, o que justifica podermos correr nas paredes pela vertical ou andar no tecto. Já vimos isto diversas vezes, especialmente em alguns mundos de Super Mario 64 e Super Mario Galaxy. Mas tendo Starchaser como espinha-dorsal de toda a sua constituição estas mecânicas/ideias,  parece-me que o produto final fica prejudicado pela finalização visual que teve aquando do seu lançamento.

Starchaser apresenta óptimas propostas de level design, com puzzles desafiantes que nos conseguem manter estimulados nível após nível, mas sofre de um problema que algum do mercado indie ocidental percebeu que é um argumento diferenciador perante tanta concorrência: o produto final não pode parecer excessivamente vanilla. Com um preço de lançamento de 9,99€ não existe grande apelo visual que o distinga de tantos outros jogos no Steam, de igual preço ou mais baratos. Todas as estruturas labirínticas não são mais do que cubos translúcidos a pairar no vácuo indefinido de algo que quer remeter para o vazio universal.

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O que demonstra que nem sempre uma boa ideia e boas mecânicas cheguem para chamar a atenção do mercado sobre si. O que se percebe com o número quase inexistente de artigos ocidentais a falar deste jogo.