A Música é uma concepção muito antiga, o som mais remoto é. Desenvolvemos a audição durante milhares de anos por instinto básico de sobrevivência e para percepcionarmos o espaço que nos rodeia. Os sons acompanharam a necessidade de comunicarmos, e tal como qualquer linguagem complexa, a Música surgiu da necessidade de transmitirmos o nosso pensamento, a nossa filosofia, os nossos sentimentos.

A Música foi acompanhando a evolução tecnológica (e cultural, e social,…), adaptando-se às mais complexas narrativas, contribuindo para que estas alcançassem um verdadeiro clímax emocional. O facto da Música nos Videojogos estar intimamente ligada à dinâmica da jogabilidade e no contar de histórias, permitiu também um expressivo acompanhamento auditivo desde os anos 80 com os 8-bit e os instrumentos MIDI. Para quem cresceu ou atravessou a década das arcadas dos cafés e dos joysticks, sentirá uma nostalgia de um tempo que passou apressado ao recordar Super Mario Bros., Tetris e The Legend of Zelda.

zelda

A evolução tecnológica permitiu colocar a Música dos Videojogos a par com a qualidade das melhores bandas sonoras da indústria cinematográfica, não só pelo resultado dos atributos técnicos como também pela genialidade de compositores como Clint Mansell, Hans Zimmer e Danny Elfman, entre tantos outros.

O storytelling nos Videojogos foi aprimorando arestas e as narrativas começaram em muitos casos a ficar cada vez mais requintadas, procurando um nível de entretenimento como nenhum outro media e possibilitando a exploração e a não-linearidade para estimular emoções no jogador, que com um papel activo, se imerge em meios distintos. A Música veio desempenhar a sua quota-parte no despertar de emoções com as bandas sonoras dinâmicas e Música procedimental que transmuta com o fluir das acções, o que forçou os compositores a ir para lá da composição vista apenas numa linha temporal, e procurando cativar a jogadora ou o jogador com uma melodia e ritmo adaptáveis ao meio e à acção, ao mesmo tempo que transita confortavelmente entre diferentes motivos. Dá-se portanto tanta importância à Música para criar uma atmosfera e comunicar criativamente, como se dá à narrativa e à ilustração da mesma.

Se repararmos em alguns exemplos de music games ou rhythm games como são os casos do Guitar Hero, Rockband e Just Dance, a Música desempenha um papel predominante na jogabilidade, maioritariamente orientada para a interacção do jogador com canções ou peças Musicais. Os rhythm games foram mais longe com sensor de movimentos (Kinect) para movimento corporal e com o uso de imitações de instrumentos musicais, adaptados para um facilitado virtuosismo popularizado que conduziram o mais desprovido de formação Musical a sentir-se um deus do Rock. Os verdadeiros virtuosos sentiram-se algo intimidados com esta ascensão de talentos, que conseguiam executar o mesmo com botões plastificados. Outros, como Rez, Child of Eden e Disney Fantasia: Music Evolved, possuem uma dinâmica diferente e generativa em que as acções do jogador accionam sons e melodias que se moldam numa base sonora proporcionando uma experiência sinestética.

Seja diegética, das estações de rádio em Fallout ou Grand Theft Auto; seja não-diegética, com revestimento de ambientes que auxiliam o jogador a situar-se num determinado espaço, a Música desenrola um papel muito importante para conseguir a imersão desejada nesse espaço. Mas não são apenas os jogos AAA de equipas pomposas e muitos milhares de euros investidos em orquestras que merecem atenção, porque muitas das obras-primas nos jogos Indie são como uma delicada brisa que agita as folhas durante o outono. São uma flor de lotus em plena floração. Tenhamos como exemplo World of Goo se quisermos viajar da Disneyland ao Carnivale de passagens ora ecléticas, ora minimais e cromáticas.

world of goo

Podemos ter sonhos marcantes, podemos ter uma imaginação fértil, podemos ter vivências alegres ou até mesmo assustadoras que nos assombram por muitos anos. Mas nada do que é real e do nosso imaginário é acompanhado com banda sonora durante a nossa vida. Não temos uma voz-off a narrar o acordar numa segunda-feira, os hábitos do café com torrada, as trinta pessoas na carruagem do metro a olhar para o vazio em direcção ao trabalho, o pedinte das esmolas, o cheiro das castanhas assadas. Nos Videojogos envolvemo-nos com personagens fictícias, com quem criamos por vezes laços profundos, como se preenchessem um vazio ou colmatassem um pequeno trecho em falta no mundo real. E não estou a referir-me ao escapismo. A Música potencia as emoções e activa sentimentos de valores, como o humor com marchas carnavalescas ou a morbidez com técnicas dodecafónicas, e são variadíssimos os exemplos como The Last of Us; Brothers: a Tale of Two Sons ou The Walking Dead: A Telltale Games series, que usam a Música e combinam no storytelling emoções básicas e as transformam em emoções complexas.

Nietzsche afirmou que sem Música, a vida não teria sentido. Estas palavras atravessaram o séc. XX como um simples “amém”. Johann Goethe disse que o ritmo tem algo mágico; chega a fazer acreditar que o sublime nos pertence. E A Música é o vínculo que une a vida do espírito à vida dos sentidos, disse ainda Beethoven. Acreditemos que temos um espírito ou que somos uma simples conjugação de processos químicos, o nosso corpo reage de uma energia que é para muitos inexplicável, indissociável ao ser humano, uma energia que não é sentida como outras formas de expressão artística. No entanto, toda a expressão artística nos videojogos é dotada de um carácter emocional, do setting à narrativa, do design ao sentido de agência nos jogadores, que quando conjugados criam sinergia.

amon tobin

A seguir deixo-vos uma compilação de música para Videojogos que considero as melhores de sempre. Não vou mais estender-me a explicar as razões dessa escolha e deixarei a Música falar por si. Espero que o Tony Carreira e outros artistas como ele compreendam a minha nega por não integrarem a lista. Não foi uma escolha fácil porque deixa de lado várias obras magníficas e tive de me conter para não inserir 3 e 4 da mesma banda sonora. Porém, convido a completarem nos comentários o que acharem estar em falta (e claro, se estiverem preparados para uma grande viagem).

Kentucky Route Zero
Too Late to Love You – Ben Babbitt

 

Splinter Cell Chaos Theory
Ruthless – Amon Tobin

 

Bravely Default
Evil Flight – Revo

 

NEOTOKYO°
Tin Soldiers – Ed Harrison

 

American McGee’s Alice
Village Of The Doomed – Chris Vrenna

 

Max Payne 2
Main theme – Kartsy Hatakka / Kimmo Kajasto

 

Hitman 2
Requiem – Jesper Kyd com Orquestra Sinfónica de Budapeste

 

World of Warcraft
Invincible – Russel Brower / Jason Hayes

 

Dragon Age: Inquisition
Return To Skyhold – Trevor Morris

 

Mass Effect 3
An End, Once And For All – Clint Mansell

 

Ace Combat Zero
Zero – Keiki Kobayashi com Orquestra Filarmónica de Tóquio

 

The Last of Us
The Last of Us – Gustavo Santaolalla

 

Red Dead Redemption
Triggernometry – Bill Elm / Woody Jackson

 

Red Dead Redemption
Bury Me Not In The Lone Prairie – William Elliot Whitmore

 

Bioshock Infinite
God Only Knows (The Beach Boys cover) – Brian Wilson / Tony Asher

 

Shenmue
Shenhua – Ryuji Iuchi

 

Jet Grind Radio
Humming the Bassline – Hideki Naganuma

 

Super Mario Bros.
Overworld – Koji Kondo

 

Tetris
Type A (do original Korobeiniki) – Hirokazu


Grim Fandango
Casino Calavera – Peter McConnell

 

Neverhood
Klaymen’s Theme – Terry Scott Taylor

 

Far Cry 3: Blood Dragon
Blood Dragon Theme – Power Glove

 

Panzer Dragoon
Flight – Yoshitaka Azuma

 

The Binding of Isaac
The Binding of Isaac – Danny Baranowsky

 

Machinarium
The Glasshouse With Butterfly – Tomas Dvorak

 

McDonald’s Treasure Land Adventure
City – Katsuhiko Suzuki

 

Roller Coaster Tycoon 3
Summer Air – Alistair Lindsay

 

The Witcher 3: Wild Hunt
The Fields of Ard Skellig – Percival & Marcin Przybyłowicz

 

The Elder Scrolls Online
Sands of the Alik’r – Brad Derrick

 

The Elder Scrolls V: Skyrim
From Past to Present – Jeremy Soule

 

Halo 4
Never Forget (Midnight Version) – Kazuma Jinnouchi

 

We Love Katamari
Blue Orb – Tomoki Kanda / Kahimi Karie

 

Sound Shapes
Cities – Beck

 

FEZ
Progress – Disasterpeace

 

Final Fantasy X
At Zanarkand – Nobuo Uematsu

 

Journey
Apotheosis – Austin Wintory