Trulon: The Shadow Engine (Trulon para os amigos)
Talvez seja uma coisa minha mas as opções de jogo são o meu primeiro destino após estar no menu inicial, como tal não podia deixar de começar por aí.
Para um jogo índie, Trulon não tem nenhuma faceta em termos de opções que se sobressaia em relação a outros, o que tem é dar ao jogador a opção de activar ou desactivar praticamente todas as opções de Post processing que utiliza, o que é estranho mas sempre bem vindo, isto visto que Trulon é um jogo com gráficos característicos de um índie e praticamente qualquer máquina corre estável com tudo activado.
Trulon está disponível em várias línguas, não em português no entanto.
Trulon arranca a sua jornada de forma minimalista, tal como desenrola toda a sua história. Gladia (It’s Girltime) acorda em casa do seu pai desprovida de qualquer equipamento apesar de ser uma ”Monster Hunter”, o seu pai diz-lhe que deve falar com o presidente da cidade mais próxima para realizar uns trabalhos. Nesses trabalhos ela descobre umas máquinas que causam “doença”, e pede ajuda à rainha, que basicamente manda-a passear, e a jornada começa em busca de quem está por detrás da “doença”. Agora maravilhem-se com esta jornada epopeica de profundidade subjectiva tão rica que vos vai proporcionar 6h de batalha e 25min de história.
A sério, é só isto, eu não me esqueci do resto
A banda sonora de Trulon é exactamente o que se esperaria de um RPG japonês mas não tão japonês assim, tem uns toques que não deixam que se diga que é japonês mas está lá mesmo quase. É uma sonoridade tão comum que eu desinteressei-me logo no início do jogo e categorizei como um ponto negativo. Mas sem me aperceber dei por mim a cantarolar o tema de batalha enquanto pensava no que fazer. Eu acabei o jogo a dizer que a banda sonora era boa (eu não sou bipolar, acho). É adequada, é empolgante e atinge o seu propósito, embalar-me enquanto eu escolho como aniquilar macacos mutantes e máquinas imunes a tudo. Fica a dica
O grafismo escolhido para Trulon, não podia ser melhor. É simples, é agradável, é colorido, é um conto infantil, onde os bons estão sempre a sorrir e os maus sempre… com cara de mau, e não estou a metaforizar, estão sempre com a mesma cara literalmente. A zona industrial é poluída onde as pessoas vivem agonizadas, e o campo é bonito e verde onde todos são felizes…todos sem excepção. Ao se jogar tem-se a sensação de que é um jogo para crianças e eu perguntei-me “mas isto afinal é um RPG tático ou um jogo da Dora a Exploradora?” e a resposta é óbvia quando falamos de gameplay.
Esta é a área onde Trulon brilha, a jogabilidade mete de lado quaisquer lanternas deixadas pela Dora enquanto pintava o cenário com lápis de cera e faz-nos esquecer a história que nunca sequer nos lembramos. Em Trulon o jogador utiliza “tácticas”, (maravilhoso, um tactical rpg onde os ataques são táticas… “mnham” suculento), que são basicamente cartas com poderes que são utilizadas em combate e cada personagem tem 3 slots de equipamento que tem diferentes buffs. E se não me engano, é tudo. Ahh, também podem clicar em cima de baús.
Se não entenderam o porquê de isto ser a melhor parte do jogo deixem-me explicar.
Existem cerca de 60 tácticas que se dividem em 4 tipos: ataques, feitiços, manobras e “enganos”. Os ataques são isso mesmo, ataques, baseados na stat de ataque mas cada um deles tem diferentes efeitos, desde ganhar mais uma táctica, a atacar todos os oponentes de uma vez, a paralisar o inimigo. Os feitiços funcionam como os ataques mas com efeitos diferentes e baseados na stat de magia. As manobras são auxiliares de batalha mais baseados na defesa mas não só, têm efeito no combate ou no seu caster, são exemplo jogar 2 tácticas de uma vez ou aumentar 100% a defesa por 2 turnos. Os “enganos” são tácticas utilizadas apenas por uma personagem, e eu apenas apanhei duas delas, não sei se haverá mais alguma, basicamente podiam bem ser manobras mas acho que quiseram restringir o uso destas tácticas a uma só personagem visto que há tácticas únicas para cada personagem se bem que a maioria dá para qualquer uma delas.
As personagens podem ser equipadas com 3 peças que têm também diferentes efeitos, a maioria referente a “tácticas de investida”. No início da batalha são escolhidas aleatoriamente que tácticas vão ser “tácticas de investida”, estas vão ter as propriedades conferidas pelo equipamento para além dos efeitos descritos na táctica. Estas propriedades podem ser por exemplo, jogar mais uma vez no turno, atacar todos os oponentes de uma vez ou curar pontos de vida. O equipamento é totalmente intercambiável entre personagens.
É esta liberdade que torna este jogo tão atractivo, qualquer personagem pode de um momento para o outro passar de besta de ataque maciço para rei dos buffs. As minhas horas gastas a mais em relação ao suposto neste jogo foram passadas a ponderar se haveria de atacar todos os oponentes neste turno ou se guardava a táctica e esperava pelo buff, se seria melhor ter um tanque de ataque ou de status cause,se o meu mage seria mais útil a atacar ou simplesmente a impedir oponentes de me atacar a mim. É um método de jogo que nada traz de novo mas que está executado com uma simplicidade complexa que só nos deixa aperceber de que ainda não sabíamos nada sobre a batalha até sabermos, é intuitivo e acontece sem dar-mos conta, porque não há tutoriais sobre basicamente nada, as estratégias são o resultado da nossa melhor forma de ganhar, e a estratégia que eu uso pode bem ser diferente da de qualquer outro. Pessoalmente baseei-me em ter a personagem principal com o ataque mais alto possível a atingir o máximo de inimigos possível enquanto o tanque fazia taunts repetidos e aumentava a defesa e os mágicos dividiam-se entre cura e buffs; ataques e debuffs. É à vontade do freguês! Podia bem ter a personagem principal a fazer os taunts e a paralisar inimigos enquanto um dos mages fazia o papel de heavy damage dealer. Pode ser pessoal mas eu achei bastante interessante escolher quem fazia o quê e perder o meu tempo a ponderar qual seria a melhor utilização de cada personagem e o que é que lhes vestia que a moda neste jogo é tão relevante como as tácticas. Porque com a apenas com a alteração de equipamento podemos modificar a função de uma personagem sem ter necessariamente de alterar os ataques.
Trulon é comparável aos primeiros Final Fantasy, mas em mini escala, Trulon tem um mapa mundo que se explora em 2 minutos, cidades com 5 NPCs (ok, uma delas tem uns 12), e uma história curta para não dizer menos. Mas fá-lo de de uma forma tão consistente que é quase irrepreensível. Trulon respeita os clichés mas não deixa que eles atrapalhem o que tem de bom. Há até um arco de personagem como manda a regra (ou devia), a menina inocente que sai de casa do pai para investigar máquinas Maelonianas não é a mesma que volta no fim, ela não é mais uma passiva espectadora do mal que há no mundo mas sim uma guerreira activa contra esse mal. Isto tudo passa-se num único balão de diálogo com 2 ou 3 linhas e é isto que deixa outros jogos da mesma dimensão para trás. Este jogo foi pensado à dimensão real das possibilidades do criador e o intuito não foi fazer muito mas sim fazer bem, o foco está onde precisa de estar, na jogabilidade, e o resto foi recheado de pequenos toques que deixam a atmosfera do jogo mais sólida e agradável mas nunca dando muita importância ao assunto. É só mais uma prova de que um bom jogo não são gráficos surreais, ou narrativas pseudo-artísticas como muitos tendem a crer mas sim a importância que tem a jogabilidade de um jogo.
Se querem saber se Trulon: The Shadow Engine merece a vossa tarde de sábado? Completamente.