Os tempos eram diferentes, havia uma aura de temor no ar, como que um crepitar de perigo. Todos sabiam que mais cedo ou mais tarde algo iria acender o rastilho e o não haveria volta a dar. Conflitos de interesses políticos e económicos, espíritos nacionalistas manipulados contra um suposto inimigo comum, conciliaram-se num dos momentos mais tristes da humanidade, uma altura em que jovens de idade escolar aprendiam a manejar armas nas escolas, por prevenção, e depois por necessidade.

Era suposto ser a guerra que acabaria com todas as guerras, mas não foi. Apesar de não ter sido a que contabilizou o maior número de mortes (estimadas em mais de 17 milhões entre militares e civis) é possivelmente a mais violenta e inumana de todas. Foi aquela em que o que se poderia antes chamar a “arte” de matar passou a ser feito à escala industrial. Combate de trincheiras, batalhas de desgaste, metralhadoras, lança-chamas, gás mostarda e outros venenosos ou até o tanque, tudo isso foi desenvolvido para e por esta guerra. Exactamente há 100 atrás (de 21 Fevereiro até 18 Dezembro) travou-se a Batalha de Verdun onde se perderam cerca de 305 mil vidas e mais de 500 mil ficaram feridos e traumatizados para sempre. Apesar de terem perdido mais vidas, Verdun ainda é um marco da determinação e auto-sacrifício dos Franceses.

Verdun 1

Hoje vou fugir um bocado ao meu tom leve e cheio de parvoíce habitual, porque o tema assim o obriga. Eu gosto de humor negro, não acredito que exista algo com o qual não se possa brincar, mas há coisas que simplesmente não acho piada, esta é uma delas. Até podia dizer que é por isso que não gostei de Verdun. Mas não foi. Eu não gosto do jogo porque: a) Não gosto de First-Person Shooters, como já disse aqui várias vezes; b) não gosto de Multiplayer Online Massivo; portanto quando combinam os dois num jogo obrigatoriamente eu não vou gostar, mas isso é a minha opinião pessoal. Contudo, dito isto, é um jogo mau? Não, bem pelo contrário.

Verdun 2

Obviamente o jogo tem falhas e já vou falar delas, não é perfeito, mas não posso dizer que não faça o que se propõe a um óptimo nível de qualidade.

Existem quatro modos de jogo, todos eles para jogar com desconhecidos ou amigos, desde os clássicos Free-for-All e Team Death Match, aqui chamados Rifle Deathmatch e Attrition, até ao mais original Squad Defense, o único modo de jogo em que os inimigos são controlados por Inteligência Artificial. Neste modo, criando uma esquadrilha ou entrando numa já existente, temos que defender pontos da nossa trincheira das vagas de inimigos que as atacam. Podemos escolher qualquer uma das 7 forças da Tríplice Entente (Aliados), ou 5 das Tríplice Aliança (Impérios Centrais) num esquadrão de quatro membros, cada um com habilidades e armas específicas. Seguindo o comandante de ponto a ponto na linha, tentamos o possível e impossível para impedir as ondas de ganhar terreno.

Contudo, é no seu modo principal Frontlines, que Verdun vai aos melhores pormenores, é aí que a fantasia se mistura com o que acredito tenha sido a realidade. Tão próximo do que a literatura e estudos me levaram a acreditar. O sistema de esquadrilhas é idêntico, mas desta vez é numa batalha de desgaste massiva. Com pequenos avanços e recuos, tal e qual como na vida real.

E não é só neste andar para a frente e trás, nas pequenas vitórias ao conquistar mais uns metros de trincheira que Verdun recria o ambiente da primeira Grande Guerra a um pormenor quase obsceno.

Os cenários estão reproduzidos a partir de imagens e relatos históricos, as armas igualmente, não só ao nível do aspecto mas balístico, posso confirmar que a mais de 15 metros a Gewehr ’98 tem a precisão de uma pedra da calçada lançada de uma fisga. Mas isso é que torna o jogo bom. Outro factor é o caos e o ambiente. É óbvio que os cenários ajudam, mas toda a sensação de falsa segurança que as trincheiras davam, onde estávamos seguros dos tiros inimigos até passar com a cabeça levantada demais em algum ponto, quando o fumo, a luz e o cenário não deixam perceber quem está na distância, se é aliado ou inimigo, ou perigo eminente do cair de uma carga morteiros ou gás. Quando somos obrigados a colocar a máscara, o som da respiração… é quase claustrofóbico.

Verdun 3

Assim como as batalhas em si, são confusas, complicadas, sem ordem ou sentido nenhum. Ora avançamos, ora recuamos, podemos disparar 5 vezes ao inimigo que está à nossa frente e falhar, para depois ter que o matar corpo a corpo com a coronha da arma, podemos passar por figuras sem membros, e ensanguentadas, ver os companheiros explodir ou cair num mar de chamas, no fundo, podemos ver a guerra reproduzida tão fielmente quanto possível na segurança dos nossos PCs. A guerra é pior que ali está, e felizmente nesta geração muitos de nós ainda não tiveram que passar por isso, espero que nunca tenhamos.

Nem tudo é bom em Verdun. E enquanto por um lado eu entendo que o tema e ambiente do jogo seja propício ao modo multiplayer, acredito que lhe falta um modo singular. Nem que seja para treino de novos jogadores. Muitos podem dizer que quem joga um FPS joga qualquer um, que não é mentira. Até certo ponto. O sistema de esquadrões pode custar a habituar, a incapacidade de sair de um certo raio do nosso comandante ou somos automaticamente mortos por “deserção” custa a habituar, e na desordem da batalha é muito fácil de cometer esse erro. Um modo singular semelhante a Star Wars Republic Commando seria perfeito aqui. Mas talvez seja pedir demais a um jogo que já tem quase um ano de idade. Que me leva à maior falha de Verdun, o fraco número de jogadores. Nas minhas experiências nunca tive mais que 12 jogadores ao mesmo tempo em Rifle Deathmatch ou 16 em Attrition, o que para alguém novo no ambiente é como entrar num matadouro. Existiam cerca de 200 a 300 em Frontlines que tornava o jogo interessante mas para um jogo que foca apenas em juntar vários jogadores Verdun devia ter mais em campo. Ou então dar oportunidades para jogar a solo.

Verdun 4

Verdun é um jogo em que eu não posso negar imensas qualidades, simplesmente não gosto dele porque não entra no meu estilo, contudo para quem é fã do género ou de história é uma hipótese a considerar.

Para terminar deixo-vos com uma citação de uma das maiores poetisas da língua portuguesa:

Não, eu nunca apoiaria a guerra. A guerra não é vencedora.

Sou uma máquina sim… La Makina de fiesta… Subelo!

Ana Malhoa, Turbinada

Achavam mesmo que eu ia fazer um artigo inteiro sem meter uma parvoíce? Mesmo?