Há algumas características minhas, chamar-lhe-ia até peculiaridades que são relativamente fáceis de explicar. Como por exemplo a reacção quase psicossomática que sinto na minha vida pessoal e profissional ao assistir a algo ou alguém que falha em atingir o seu máximo potencial. De ver uma excelente ideia ou conceito serem mediocremente executados e de ficarem aquém da sua total extensão. Como é óbvio, já devem ter percebido que este é o sentimento que tenho em relação a Homefront: The Revolution, e a razão pela qual a categoria deste artigo é Opinião e não Análise. Não terminei o jogo para – e cumprindo os nossos estatutos – poder fazer uma análise. Mas uma certeza fica: não volto à Filadélfia ocupada deste Homefront: The Revolution tão cedo, e apenas com as totais garantias de que todos os problemas que circundam o jogo estão resolvidos é que lá regressarei.
O enredo de Homefront: The Revolution promete imenso desde o primeiro segundo. Um pedaço interessante de História Alternativa, em que a Coreia do Norte se tornou um colosso tecnológico mundial desde os anos 1970, graças a uma companhia chamada APEX, que podemos identificar como um paralelismo com a real Apple. O poderio económico e a influência da Coreia do Norte é tão grande que acaba por anexar a sua vizinha Coreia do Sul, tornando-se uma das maiores superpotências mundiais. Depois da APEX dominar o mercado das tecnologias, em que virtualmente todas as casas do mundo ocidental possuem os seus dispositivos electrónicos, decidem dar o passo seguinte e começar a criar armamento. Os dispositivos da APEX estavam todos programados com programas de backdoor que possibilitaram o controlo globalizado por parte da Coreia, o que adicionado ao facto dos EUA terem uma dívida gigantesca para com a Coreia, acaba por levar o governo de Pyongyang a invadir o território norte-americano. E é neste cenário bem-estruturado ficcionalmente que entramos em Homefront: The Revolution, como um revolucionário que tenta libertar Filadélfia do jugo do exército coreano.
O ritmo narrativo, o setting e o ambiente dos primeiros minutos do jogo deixavam antever um dos melhores jogos em mundo-aberto com um forte pendor político. O problema é que passados esses minutos iniciais em que já nos ambientámos ao cenário de guerra e ocupação de Filadélfia é que todo o maravilhamento de Homefront começa a ruir por terra, destruído em pedaços por todos os problemas que circundam o seu desenvolvimento e o seu lançamento.
Para a excelente premissa de história alternativa que possui, o desenvolvimento e o ritmo narrativos de The Revolution é no mínimo sofrível. Havia tanta densidade geopolítica que o jogo poderia ter mas acaba por cair no enfado de criar um argumento que se limita a ser um mero compagnon de route de todo o jogo, quando deveria ser um elemento diferenciador. A história possui os twists e traições expectáveis, que pouco ou nada contribui a bidimensionalidade do nosso protagonista silencioso, Ethan Brody, capturado pelo KPA (Korean People’s Army) nos primeiros minutos de jogo, mas conseguindo miraculosamente escapar para junto dos colegas-revolucionários.
O cenário da Filadélfia ocupada pelo KPA é interessante na primeira hora, mas cedo começamos a ser vítimas de alguma monotonia de ambiente que aqui existe. É claro que este tédio é também aumentada pelo ritmo compassado com que a história insípida vai decorrendo, e o quanto as missões principais e secundárias soam vazias quando vemos o coopto geral política que é a premissa do jogo.
Mas onde o jogo comete seppuku criativo e mecânico é no combate. Homefront: The Revolution sofre de grandes problemas de framerate que tornam as sequências de tiroteio quase impossíveis (e eu que pensava que era um problema exclusivo do PC, mas até a versão de PS4 possui estes bugs, o que até já levou os developers a anunciarem um patch para os corrigir). Mas para first person shooter todas as componentes de shooting é péssimo, confuso, com a nossa capacidade de apontar a arma seriamente comprometida com toda a lentidão que pauta as sequências de combate, e que as tornam frágeis, pouco divertidas e em todos os aspectos mal-executados.
Adicionemos a todos os problemas terríveis que o jogo possui com um problema simples de interface: a barra de vida é altamente depurada, mas a um nível de depuração que torna pouco evidente quando levamos dano e quando estamos às portas da morte. A sequência por vezes é instantânea e muitas vezes morremos sem percebermos que estávamos assim tão fragilizados.
Mas a cereja no topo do bolo é a IA dos inimigos. É estranho que os soldados do KPA sejam um misto de Stormtroopers, do Sean Penn em I am Sam, e possuidores de consciência cósmica. Enquanto estamos em campo aberto, os soldados oscilam entre falhar tiros quase à queima-roupa, comportarem-se como se estivessem embriagados, ou conseguirem acertar tiros certeiros a uma distância imensa apenas com tiros de pistola. O que é ainda mais estranho quando os inimigos variam entre serem quase cegos e terem omnisciência que destrói todo e qualquer tipo de furtividade. A IA é excessivamente inconsistente e acaba por quebrar com o tom geral do jogo.
No outro ponto oposto, mecanicamente o melhor de Homefront: The Revolution é a customização das armas. Há aqui ideias e mecânicas tremendas de como alterar armas on-the-fly que podem e devem ser inspiração para outros jogos do género no futuro, salvando de alguma forma o total desastre que acabou por se tornar este lançamento.
Existia um tremendo potencial em Homefront: The Revolution, tanto ao nível do setting como da proposta de FPS em mundo aberto menos Rambo-mode do que muitos outros congéneres de sucesso. A ambição é salutar, e agrada-me ver estúdios a tentarem superar as suas próprias limitações e alcançarem um patamar que consideravam inalcançável. Mas a fasquia colocada pelo estúdio Dambuster Studios pareceu alta demais para as suas capacidades, e o jogo é muito inferior a nível de argumento e a nível técnico. Sempre a um passo de ser um jogo muito bom em vários momentos, The Revolution tropeça várias vezes em si mesmo e cai redondo no chão, medíocre, abaixo do seu potencial de realização máximo. E pouco há que seja uma maior desilusão do que isto.