Ataque dos Clones #21

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Permitam-me desvirtuar esta rubrica semanal tão sabiamente alimentada pelo Sérgio e pelo Matthieu intercaladas com o meu contributo. E permitam-me porque falar de Mighty no. 9 seria impossível de descolar do mesmo tom com que nos referimos a tantas cópias mal-amanhadas de jogos que trazemos a esta rubrica.

Mega Man, a série, o jogo, a franquia e o personagem são os meus favoritos de todos os tempos. Toda a gente o sabe e já diversas vezes o referi, e isso sentia-se na ansiedade com que aguardava o lançamento de Mighty no. 9, o mais recente jogo de uma das figuras incontornáveis da série, Keiji Inafune.

Sempre sofri de um certo fanboyismo irracional, injustificado e vocal para com Inafune, ainda que no fundo soubesse apenas que ao contrário de outros ídolos do meio, ele acabou por ser a figura de proa de uma série de sucesso. Existe e sempre existiu uma pequenas parte dentro de mim que me alertava para a possível vacuidade de Inafune, e na real importância que possuía numa série que me é tão influente como Mega Man.

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Analisando o seu percurso, é pacífico afirmar que poucos lugares de destaque criativos ele teve dentro da criação de tantos jogos de sucesso, mas era o seu nome (regra-geral enquanto produtor) que figuravam enquanto pseudo-selo de qualidade de produção. E dentro dessa análise era fácil cogitar que a quase totalidade do sucesso dos seus jogos se deviam às brilhantes e experientes equipas com as quais trabalhou na Capcom nas duas últimas décadas do século passado do que do seu próprio mérito. Se Soul Sacrifice foi um teste à sua verdadeira faceta criativa e de liderança de um projecto, o tão falado projecto de Mighty no. 9 era uma espécie de “prova dos 9” (trocadilho não-intencional): com o seu recém-criado estúdio tinha a incumbência de mostrar que conseguiria trazer-nos um objecto de qualidade como os Mega Man, sem as “amarras” da Capcom.

O que depois de tantos atrasos e do recém-lançamento do jogo provou que era uma total ilusão.

Todos sabíamos que esta atitude de Inafune era uma espécie de statement para com a Capcom. Que em muito se assemelhou à postura de muitos dos artistas da Marvel que saíram da gigante norte-americana para fundar a sua própria editora, acabando por criar muitos personagens que pouco mais eram do que cópias de grandes nomes como Wolverine e Cable. Com Mighty No. 9 Inafune quis fazer o mesmo: era impossível mascarar o tremendo (auto?)plágio deste jogo, que só por mero acaso de propriedade intelectual é que não se chama Mega Man.

Mas o que distancia este Mighty No. 9 do Mega Man não é apenas uma questão semântica, é acima de tudo uma questão de qualidade. Por muito que todos os pontos e mecânicas que Mighty rouba a Mega Man (como tantos outros roubaram) esta pseudo-clonagem acabou por funcionar em detrimento do novo jogo de Inafune.

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Sabemos de antemão que despindo Mega Man do enredo, dos personagens e das mecânicas, uma das razões para o seu sucesso é o tremendo trabalho de level design que o jogo possui. Façam o teste de voltar a jogar o primeiro jogo de 1987 para perceberem o brilhantismo de game e level design que se mantém desafiante e bem-construído até aos dias de hoje, e depois pousem o jogo e comecem a jogar Mighty No. 9. A mediocridade do level design é mascarado de forma óbvia com a atenção ao visual, que ainda assim não o consegue retirar do buraco de engodo onde o jogo foi criado. E o que começa como um statement curioso de ver Inafune a fazer frente à gigante Capcom, rapidamente se torna um triste jogo que empalidece em comparação com o original.

Mighty No. 9 possui uma direcção artística interessante, mas para ser honesto não seria nada que não esperássemos de Inafune, que mais do que um lead designer é um experiente artista da indústria. Mas a nível de jogabilidade e level design há pouco que separe Mighty de qualquer clone de NES de Mega Man.