Há quem me chame Purple Dog. Cão Roxo. Depois, há quem queira fazer-me passar por Cão Pastor.
Zombie Night Terror é um desses jogos, a fazer lembrar uns Lemmings com QI abaixo da temperatura ambiente, seguindo placidamente na direcção para a qual são apontados.
Disse placidamente? Pois, esqueçam. Estes são Zombies sedentos de sangue, morte e destruição. Mas continuam a ter um QI abaixo do número que calçam. E continuam a precisar de um Cão Pastor para lhes indicar o melhor caminho. E nem sequer basta apontar-lhes a direcção.
O jogo coloca-nos do lado mais divertido da barricada: o lado dos zombies! O objectivo é transmitir a infecção ao maior número de apetitosos humanos possível, eviscerando-os e, dessa forma, inscrevendo-os para sócios do nosso clube elitista em que a trade mark passa por um arrastar da perna e caminhar com os braços estendidos. E, claro, um apetite por cérebros.
Com um grafismo pixelizado que me deu pequenos arrepios de prazer nostálgico, uma palete muito noir onde se destacam apenas os diversos upgrades que podemos apanhar para nos auxiliar na nossa missão e os volumosos jorros de sangue das nossas vítimas, o jogo traça um mundo sombrio onde o humor aparece também a pintalgar as coisas com umas gargalhadas negras, muito negras.

De um lado, seres desprovidos de inteligência, agitando-se freneticamente ao som de música, do outro, os zombies.
À primeira vista podia ser só isso. Um jogo de zombies, estilo Puzzle Lemmings Walking Dead, mas a NoClip e a Gambitious souberam fazer as coisas, brincando consigo mesmas e adicionando ao jogo camadas sobre camadas de novas habilidades, inimigos e complexidade, o que o tornam uma deliciosa experiência de estratégia assassina e sangrenta. Ele é zombies sinaleiros, é uns que explodem, outros correm… E os inimigos também vão desde a pacata Dona Custódia que apenas agita os braços em desespero enquanto os nossos colaboradores a desfazem com vigorosas dentadas a perigosos snipers que, usando de uma arma poderosa e um alcance injusto, desbastam as nossas fileiras sem pensar duas vezes. É, portanto, um jogo muito, muito bem composto que sabe explorar bem os seus pontos fortes e que se revela surpreendentemente desafiante, forçando-nos a adaptar-nos àquilo que a situação exige e colocando-nos níveis e desafios diferentes a cada passo, saltando de uma horda de zombies sem controlo que devasta uma área enquanto cruzamos os braços a beber um Mojito para níveis onde, com apenas um número reduzido de colaboradores, temos que nos desunhar entre cliques e comandos e estratégias ultra-stealthy para atingir o objectivo, alturas em que me senti transportado de volta aos tempos em que jogava Commandos: Behind Enemy Lines.

Maldito humano e a sua arma de elevada precisão e alcance!
Dei por mim por vezes frustrado a procurar um atalho para pausar o jogo ou a estar disposto a pagar um ordenado mínimo para ter um Quick-Save, mas são apenas pormenores num jogo que vive precisamente do desafio, da planificação e da meticulosa execução para nos levar ao domínio do mundo, de cadáver em cadáver. Interessante é também a abordagem quase programática ao desafio, que coloca este jogo como um dos candidatos viáveis para experiências no âmbito da gamificação da educação. Como os zombies com uma total ausência de vontade própria, os seus passos tornam-se previsíveis, tal como um computador. Fazem estritamente aquilo que lhes mandamos fazer e é possível programar um trajecto a seguir antes de clicar no Play para dar início ao nível. Enquanto Professor, vejo-me a utilizar este jogo em aulas em que coloque jovens pela primeira vez em contacto com o básico da programação. Permite-lhes ver que um computador não é uma máquina inteligente. É burra. Burrinha. Lerda. Não decide, não avalia, não reavalia nem se adapta. Faz apenas aquilo que lhe mandarmos fazer. E se mandarmos fazer mal, continuará a fazê-lo mal até que mudemos algo. O computador onde escrevo estas linhas é uma espécie de zombie. E os zombies podem ser uns troncos, mas cabe-nos a nós ser os inteligente estrategas que lhes permitam atingir a glória carmim-sangue num mundo a preto e branco. Ou cabe-nos a nós ser a galinha que vos escreve estas linhas, depois de passar um bom bocado frente a este excelente título, capaz de proporcionar umas boas e desafiantes horas a mascar carne!